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A questão do inimigo principal

A direita costuma divulgar com prazer as eternas divergências e divisões na esquerda, embora ela própria esteja sempre envolvida em disputas e divisões ferozes. Mas há diferenças na natureza das divisões que ocorrem na direita e na esquerda.

A direita, como representante política da burguesia, disputa por interesses econômicos, por nichos de mercado, pela hegemonia sobre o conjunto da burguesia, pelo deslocamento e aniquilamento de concorrentes. Seus setores mais reacionários brigam com os demais contra qualquer tipo de concessão aos trabalhadores e às camadas populares. E, em geral, se voltam contra as vacilações de alguns setores que acham necessário levar a sério o liberalismo democrático. Embora quase sempre consigam se unir na defesa dos interesses pétreos da burguesia, a propriedade privada e o direito ao lucro, no mais, suas disputas muitas vezes chegam às raias da selvageria.

A esquerda se divide porque os próprios trabalhadores e as camadas populares não conseguem se furtar de competir entre si no mercado de trabalho. Alguns setores buscam conquistar concessões ou benefícios particulares, mesmo que isso prejudique a classe como um todo, como é o caso dos que aceitam salários menores. Também há muitas divergências sobre as formas de luta que se devem utilizar para enfrentar a burguesia. E, em geral, os trabalhadores e demais camadas populares não têm claros seus objetivos de libertação. Uma parte considerável deles supõe até que essa libertação pode ocorrer através do acesso à propriedade privada e ao lucro. O que, de cara, faz com que se criem diferentes correntes de representação ideológica e política, com objetivos gerais nem sempre idênticos, criando dificuldades a qualquer processo de unificação e cooperação, e resultando em disputas nem sempre civilizadas.

Nesse sentido, a burguesia tem uma enorme vantagem. Seu único objetivo consiste em manter a propriedade privada e seus lucros. A disputa dentro dela gira em torno desse objetivo, mesmo que isso tenha em vista ampliar o capital à custa de outros setores da própria burguesia. Além disso, cada setor da burguesia tem recursos para empregar enormes grupos de ideólogos de todos os tipos, relacionados com a economia, sociologia e outras ciências sociais, cuja tarefa consiste em municiar cada grupo burguês, e seus representantes políticos e partidários, de argumentos justificadores daquele objetivo geral e, em complemento, dos objetivos particulares do grupo.

No caso da esquerda, há muito ela se debate entre vários objetivos, mesmo quando fala em socialismo. Além disso, sem entender o capitalismo, nem a burguesia, ela tem tido dificuldades para descobrir, em cada momento histórico, quais as ideologias e representações políticas burguesas que, conjunturalmente, devem ser tomadas como inimigas principais, dividindo-se perigosamente em torno disso e, não raramente, tomando a outra parte da divisão como a verdadeira inimiga.

Um dos exemplos históricos mais trágicos dessa situação ocorreu no período da primeira guerra mundial, entre 1914 e 1918, quando os trabalhadores das potências capitalistas, ao invés de se unirem para evitar a guerra ou transformá-la em revolução, como propusera a Internacional Socialista, apoiaram as burguesias de seus próprios países e se mataram mutuamente nos campos de batalha. Algo da mesma natureza ocorreu logo após a revolução russa de 1917, quando os socialistas revolucionários, por divergências com os comunistas sobre o caminho a seguir, tentaram matar Lênin, deixando-o com sequelas que o levaram à morte prematuramente. Outro exemplo histórico de consequências nefastas pode ser encontrado na disputa entre os socialdemocratas e os comunistas na Alemanha dos anos 1930, que permitiu a ascensão do nazismo.

Em todos os casos, a questão central, que levou as divergências a terem resultados devastadores para a esquerda como um todo foi a divergência em torno do inimigo principal. Na guerra de 1914-18, os trabalhadores e os partidos socialdemocratas tomaram as nações como inimigos principais, ao invés de suas próprias burguesias, esquecendo-se de que iriam lutar, na suposta nação inimiga, contra trabalhadores e outros partidos socialdemocratas e de esquerda. No caso do atentado a Lenin, os socialistas revolucionários fizeram o trabalho que os agentes do tzarismo pretendiam fazer, e não haviam conseguido. Na Alemanha dos anos 1930, os comunistas consideravam os socialdemocratas seus principais inimigos, e estes achavam o mesmo dos comunistas, quando o verdadeiro inimigo a ser combatido naquele momento era o nazismo.

Há inúmeros outros exemplos idênticos na experiência histórica da esquerda, em todos os países, inclusive no Brasil. Aqui, por exemplo, antes do golpe militar de 1964, embora houvesse evidências de que ele estava sendo armado pela direita, várias correntes de esquerda consideravam o governo Jango o inimigo principal. Mesmo durante a ditadura militar, foram comuns as divisões internas nos grupos de esquerda, muitas vezes considerando-se como inimigos, ao invés de unificar-se na luta contra a ditadura.

Na atualidade, ainda persistem tendências desse tipo em alguns setores da esquerda. Para alguns, o governo Lula e, agora, o governo Dilma são os inimigos principais, esquecendo-se não só que a direita burguesa, representante dos setores financeiros e monopolistas, está concentrada no PSDB e no DEM, mas também que são esses partidos que expressam a política de retomada do neoliberalismo no Brasil.

É evidente que outros agrupamentos de esquerda, que apoiaram o governo Lula e apoiam o governo Dilma, em sentido contrário, enxergam no PSDB e DEM possíveis aliados e tomam outros setores de esquerda como inimigos principais. Todos dão uma demonstração clara de que não aprenderam com a experiência histórica. O pior de tudo é que as teorias e o estudo dessas experiências históricas a respeito parecem pouco valer para mudar essa situação.

Foi a dura derrota contra o regime ditatorial militar, e a ascensão das lutas operárias, que levaram grande parte das esquerdas revolucionárias – não todas – a se unificarem no Partido dos Trabalhadores, nos anos 1980. De lá para cá, as mudanças nas forças políticas e nos inimigos têm levado a novas divisões na esquerda, sempre tendo como centro o inimigo principal. Nessas condições, talvez seja necessário que as correntes de esquerda tenham que passar novamente pela prática de quebrar a cabeça para definir contra quem realmente devemos lutar.

Por Wladimir Pomar, que é escritor e analista político.

Artigo colhido no sítio http://www.correiocidadania.com.br

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A derrota das oposições

A derrota, nestas eleições de 2012, fica com as oposições. Em primeiro lugar, há uma derrota moral. Sem alternativas a propor, desossada do ponto de vista programático, em sua retórica nacional, capitaneada pela mídia conservadora e pelo candidato pessedebista à prefeitura de S. Paulo, tudo o que as oposições apresentaram foi a consigna de “remember Mensalão”.

Flávio Aguiar – De Reykjavik

Ainda não se sabe qual será o resultado do segundo turno. Vamos aguardar. Mas uma coisa já se sabe: a derrota, nestas eleições de 2012, fica com as oposições.

Em primeiro lugar, há uma derrota moral. Sem alternativas a propor, desossada do ponto de vista programático, em sua retórica nacional, capitaneada pela mídia conservadora e pelo candidato pessedebista à prefeitura de S. Paulo, tudo o que as oposições apresentaram foi a consigna de “remember Mensalão”.

Requentaram o prato inventado, nunca provado. Inventaram seu “herói alternativo”, o ministro Joaquim Barbosa, também de origem humilde, como Lula, o arqui-inimigo daquela direita. Ele, de bom, de mau ou de nenhum grado, acabou entrando no papel. Sobretudo, ao enfrentar de modo irado seu rival – o dr. Silvana para a mídia esclerosada – o ministro Lewandovski, que, sendo revisor, teimava em revisar.

Enquanto isso, em S. Paulo, o candidato excelso (pelo menos para ele) do conservadorismo promovia o pastor Silas Malafaia e seu obscurantismo a cabo eleitoral. Para o opositor, o candidato petista, meu colega de FFLCH/USP e amigo Fernando Haddad, a resultante não podia ser melhor. Contra ele pesava, por exemplo, o apoio do ex-menino dos olhos da direita brasileira, Paulo Maluf. Pois Serra veio lembrar que quem tem Malafaia no próprio telhado não joga Maluf no dos outros.

Em segundo lugar, há uma derrota temporal e espacial. Mais uma vez a direita brasileira demonstra seu anacronismo irreversível. No momento, a pensar nas pesquisas (vamos ver, ainda assim, o que sai das urnas no domingo), a sua melhor cartada é o renascimento de um carlismo defasado em Salvador. E, como em S. Paulo, estribado na diferença de classes. Bom, pelo menos isso está mais claro: rico reacionário vota na direita, e quem com isso se identifica também. Pobre, remediado, povo, povão, vota na esquerda. A direita rifou o povão. Este só entra em suas preocupações se for abençoado pelo pastor Malafaia.

Finalmente, em terceiro lugar, há uma derrota política insofismável e intragável para as nossas direitas. Talvez até para alguns setores da esquerda também. Porque a presidenta Dilma sai reforçada da eleição. E o ex-presidente Lula deu um show de bola. Lula sacou, avaliou, compreendeu que o PT, sobretudo em seu setor paulista, precisava de uma renovação. E apostou nisso. E deu certo. Aliás, a renovação deu certo até onde ela não foi planejada, como em Osasco.

Mesmo que não ganhem, Pochmann e Haddad entrarão para a história do partido, de S. Paulo e do Brasil. Dilma já entrou. Agora é a vez deles. Aliás, de Edmilson, em Belém do Pará, PSOL, agora apoiado por Lula e Dilma também. Aos golpes por vezes no fígado de algumas lideranças do PSOL, Lula e Dilma respondem com a generosidade da visão política avançada.

A direita não agüenta. Talvez um dia ela se reerga das próprias cinzas. Então deixará de fazer campanha para derrotar Lula em 2002.

Ou Vargas em 1950 e 1954, ainda quem sabe.

Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior em Berlim.

Artigo colhido no sítio http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=5829

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