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Com proposta defendida pelo governo, ‘Brasil caminha para manicômio tributário’

Auditores fiscais de renda e especialistas na área tributária discutem as reformas possíveis para o setor, em Congresso Estadual do Fisco Paulista, e veem aberrações em andamento.
São Paulo – “O Brasil está caminhando para o manicômio tributário. Não em questão de carga, ao contrário do que está no inconsciente coletivo, mas de como os impostos são cobrados”, afirmou o vice-presidente do Sindicato e Associação dos Auditores-Fiscais Tributários do Município de São Paulo (Sindaf), Rafael Rodrigues. O auditor participou na tarde deera terça-feira (19) do painel “A Reforma Tributária possível no Brasil”, parte do Congresso Estadual do Fisco Paulista (Conefip), realizado pelo Sindicato dos Agentes Fiscais de Renda do Estado de São Paulo (Sinafresp).
Fonte: Rede Brasil Atual 
DIVULGAÇÃO/CONEFIP
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Debatedores criticaram o fato de que no Brasil, pobre paga mais

 

proposta de Reforma Tributária que tramita no Congresso, de autoria do deputado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), foi um dos temas. Para o agente fiscal de renda do estado de São Paulo Clóvis Panzarini, que está na carreira desde 1982, a proposta do tucano contém problemas sérios que podem deixar o cenário fiscal do Brasil ainda mais complicado. “Estão propondo a criação de uma enorme CPMF, com uma boca tão grande, capaz de abocanhar tudo o que o sistema previdenciário precisa, algo em torno de R$ 400 bilhões”, disse.

Panzarini explicou que a atual proposta é um híbrido de outras que já foram discutidas nos anos 1990. “Havia três correntes na época. Uma, criava uma gigante CPMF que ia abocanhar, nas transações bancárias, tanto quanto o necessário para arrecadar a carga tributária do país, algo em torno de R$ 2 trilhões. A segunda proposta era de substituir todos os tributos do país por seis impostos seletivos: energia elétrica, comunicações, combustíveis, automóveis, bebidas e fumo. Seis impostos que se alimentariam apenas dos setores mais nobres do ponto de vista de arrecadação. A terceira é a criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA).”

A criação do IVA é um dos principais pontos da proposta de Hauly. A ideia inicial, era a de criar um imposto único, que se dividiria entre bens e serviços, “proposta simples e isonômica, que distribuiria o arrecadado entre os níveis de governo”, afirma Panzarini. Entretanto, a presente proposta foge dos padrões citados, para formar algo novo, que contempla as três propostas exibidas.

“Me surpreende como a proposta que está ganhando cada vez mais força, com um destaque imenso na mídia, é a proposta supostamente defendida pelo governo federal. Ela pega partes das três. Estão propondo que se crie seis ou sete impostos seletivos sobre a parte mais nobre da cadeia, bases que compõem o ICMS atual (de competência estadual)”, como o primeiro modelo. “Propõe, também, a criação de uma nova CPMF. E finalmente, o IVA estadual, que seria o resto, a parte mais baixa da floresta tributária, o que restou.”

O ICMS representa a maior parte da arrecadação dos estados, um imposto que incide sobre a circulação de mercadorias e serviços. Ao retirar boa parte dessa arrecadação, a presente proposta deixa alguns serviços finais, que seriam, de acordo com Panzarini, insuficientes para cobrir o rombo. “Sobrarão serviços de saúde, educação, cultura e transporte público. Esses setores têm cargas tributárias muito baixas e são eles que seriam transferidos para os estados como compensação para a perda de sua base mais nobre”, disse.

“É muito fácil dizer para subir a alíquota para que os estados cheguem à conta necessária. Que se coloque 80% de imposto sobre a saúde. Vamos trocar contribuintes como Eletropaulo, Petrobras e Vivo por Hospital Samaritano e Teatro Maria de la Costa. A conta não vai fechar”, completou.

Imposto dobrado

Panzarini expôs um problema que considera ainda mais sério para o bom andamento da economia nacional. “Criam-se dois impostos enormes sobre o consumo que não se comunicam entre si e incidem sobre uma base produtiva que se comunica. Então, chegamos a um mar de cumulatividades”, disse. A questão é que setores podem ser tributados mais de uma vez neste sistema. “Vamos tributar o aço pelo IVA estadual e o automóvel pelo imposto federal? Vai ser um coice e uma mordida, isso é cumulatividade. É uma coisa maluca. Quando a resina sai da Braskem, não sabemos se ela vai ser usada em uma seringa no hospital ou em uma lanterna de um BMW. Hoje, temos no ICMS uma base de cumulatividade na ordem de R$ 1 trilhão. Com esse sistema, teremos quase R$ 2 trilhões em bases cumulativas.”

Tributos sobre consumo e renda

Para Rafael Rodrigues, a criação dos impostos seletivos e do IVA não chegam na raiz do problema. “Estamos falando de mais tributação sobre o consumo, que é extremamente regressiva, como sabemos. É a velha história de que no Brasil, pobre paga mais. Quem ganha até dois salários mínimos tem comprometido de sua renda em torno de 55% com tributação”, disse.

“A progressividade do Imposto de Renda coloca no teto o cara que ganha acima de R$ 4.600, com alíquota de 27,5%. Então, o cara que ganha R$ 50 mil está na mesma alíquota de quem ganha R$ 4.600. E o cara que ganha R$ 200 mil? Esse, normalmente tem uma empresa de lucro presumido, e tira ainda mais da base produtiva. Ele vai pagar em torno de 11% a 15% de imposto de renda. Então, a mulher, negra e miserável é a que mais paga imposto”, completou.

O auditor concordou com Panzarini na crítica ao modelo apresentado pelo deputado tucano, e disse que “se a reforma não levar em conta a complexidade, a sonegação e a renúncia fiscal, ela vai ser inócua. A reforma que queremos é a que traga elementos discutidos, uma simplificação do sistema com transparência para o contribuinte entender a carga e a cadeia, com segurança jurídica para atrair investidores”.

Para o coordenador do Núcleo de Estudos Fiscais da FGV, Eurico Marcos Diniz de Santi, a reforma proposta possui pontos positivos e outros a serem melhorados, mas caminha na simplificação da cobrança de tributos, o que pode influenciar positivamente o ambiente de negócios do país. “Há uma dimensão importante que é a igualdade, equidade e isonomia, que só alcançamos com o imposto sobre a renda. Um IVA ideal não tem incentivos fiscais e nenhum setor beneficiado. Toda a modulação tem que ser feita através do imposto de renda e das contribuições previdenciárias”, disse.

“Temos um sistema extremamente regressivo e isso tem que ser tratado, mas o fato é que não conseguimos reduzir o nível de tributação sobre o consumo hoje. O Imposto de Renda não conseguiria cobrir a arrecadação do IVA, então, precisamos resolver a questão e mostrar a necessidade de redução de impostos sobre o consumo e aumento sobre a renda”, disse.

Perspectivas

Para o juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo e diretor jurídico da Fiesp, Fábio Barreira, existe a necessidade de uma reforma tributária, mas pode estar ainda distante do espectro político nacional. “A pergunta que me faço é se essa proposta é pior do que o que existe hoje. O que temos está chegando no nível do insuportável. Uma reforma perfeita, tenho dúvidas se vamos alcançar, porque isso depende de quem olha. O Fisco vai te um olhar e o empresário outro”, disse.

“Pelo atual momento político que o Brasil vive, entendo que será difícil que uma reforma tributária seja aprovada rapidamente, porque o governo federal tem algumas outras preocupações, que nós sabemos quais são, que tira um pouco o foco da reforma tributária. Acredito que a reforma da Previdência esteja na frente como prioridade à necessidade que o governo federal entende para fins de aprovação de projeto”, completou.

Já a conselheira de finanças da Espanha no Brasil, Antoniette Musilek, discursou a partir do que existe em seu país de origem. “Cada comunidade autônoma, como os estados do Brasil, tem certas competências para estabelecer suas alíquotas, podendo reduzir em alguns casos. Existe a distribuição do IVA de forma comunitária, seguindo o princípio da neutralidade, o IVA é um imposto comunitário da União Europeia. Isso significa que a legislação está harmonizada.”

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