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Política do BC definirá desdobramentos da crise no Brasil

Na segunda entrevista da série que a Carta Maior realiza sobre os impactos da crise no setor mobiliário dos EUA, o economista Edgard Pereira, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), defende que uma possível alta do dólar no Brasil não justifica uma interrupção da queda dos juros.

PORTO ALEGRE – A crise causada pelo estouro da bolha imobiliária nos Estados Unidos não é localizada, entre outras razões, porque teve seu epicentro no coração do sistema capitalista global. Poucos economistas se arriscam a apontar a extensão do estrago que pode causar na economia mundial. Mas a maioria deles concorda em afirmar que a gravidade dessa nova crise não deve ser desprezada. “Essa crise aponta para o coração do movimento especulativo recente: a extraordinária liquidez que a economia internacional apresentou nos últimos anos. Como havia uma liquidez muito grande, a própria aversão ao risco diminuiu. Com a alta liquidez e taxas de juros relativamente baixas (em escala internacional), cresceu a busca por rentabilidade e os ativos de maior risco acabaram tendo uma maior procura”, diz à Carta Maior o economista Edgard Pereira, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).

A farra financeira cobra agora seu preço: restrição de liquidez, crescimento da aversão ao risco e uma intervenção pesada de bancos centrais para evitar o risco de uma paralisia dos fluxos bancários. Neste cenário, Edgard Pereira aponta dois prováveis desdobramentos do estouro da bolha imobiliária. Em primeiro lugar, a redução das taxas médias de crescimento econômico mundial. O consumo nos EUA deverá ser afetado por conta da restrição de crédito. Com o consumo desacelerado na maior potência econômica do planeta, toda a economia mundial será afetada. Esse desdobramento pode atingir o Brasil também, adverte o economista, seja pela diminuição de demanda, seja pela queda no preço das commodities (títulos correspondentes a negociações com produtos agropecuários, metais, minérios e outros produtos primários nas bolsas de mercadorias).

Uma encruzilhada para os EUA

O segundo desdobramento, acrescenta o economista, coloca o Federal Reserve (o Banco Central dos EUA) em uma encruzilhada. Pereira explica: “A resposta clássica seria baixar a taxa de juros, tornando mais atrativos outros ativos e irrigando o circuito de crédito. Mas, ao mesmo tempo em que há essa demanda, há tensões inflacionárias expressivas em alguns países, como é o caso da China (variando entre 5% e 6%). Isso pode levar a uma pressão por mudanças de preços nas exportações da China para os EUA. As conseqüências e possíveis desequilíbrios resultantes dessas mudanças colocam o Federal Reserve em uma encruzilhada, o que fará com que, provavelmente, não adote movimentos bruscos em termos de mudanças nas taxas de juros”. Quanto aos desdobramentos no plano interno, sobre a economia brasileira, o economista diz que o comportamento do Banco Central será decisivo.

“Se o Banco Central ficar receoso e conservador, temendo impactos da crise, em especial um aumento da pressão inflacionária, e interrompendo a queda dos juros, a sinalização será ruim para os investidores no Brasil”, sustenta Edgard Pereira. Para ele, uma possível desvalorização cambial provocada pela crise no mercado imobiliário norte-americano, não justificaria uma freada na queda da taxa Selic. “Hoje”, diz ainda o economista, “a taxa de crescimento da economia brasileira está transitando da casa dos 3% para a dos 5% e sendo acompanhada por um crescimento de investimentos”. “Em certa medida, é um quadro semelhante ao que vivemos em 2004, quando o crescimento da economia também se aproximava dos 5% e o Banco Central puxou a taxa de juros para cima. Se o BC mantiver a redução dos juros, poderemos seguir na trajetória de crescimento, mais centrada no consumo interno”.

Na avaliação do economista do Iedi, um eventual impacto sobre a taxa de câmbio, com a desvalorização do real, não implica um aumento da pressão inflacionária. “A nossa taxa de câmbio estava supervalorizada. Se o real desvalorizar estará corrigindo essa supervalorização, sem grande impacto nos preços”, observa. O aquecimento da demanda interna, acrescenta, não justifica a interrupção da queda ou o aumento da taxa Selic em função de uma eventual subida do dólar. As indústrias, diz Pereira, estão vendendo a maior parte de sua produção aqui dentro do país, o que diminui a pressão do câmbio na formação dos preços. Além disso, a relação entre crescimento e inflação vem mudando em função da integração dos mercados internacionais e da maior incorporação de bens importados. Ou seja, conclui, a economia pode crescer sem risco de restrição de oferta e de um conseqüente aumento de preços.

Brasil está melhor preparado, mas não blindado

Pereira admite que a nova crise deve ter como conseqüência um aperto de crédito, mas acredita que esse enxugamento atingirá principalmente as operações especulativas. “Para bons projetos de investimentos creio que não haverá dificuldade de financiamento. As nossas empresas estão capitalizadas e sua taxa de endividamento é baixa. A continuidade da queda dos juros induziria os bancos a financiar projetos de investimentos destas empresas. Tudo vai depender do que o Banco Central fizer em relação aos juros. Se eles seguirem caindo, poderemos ter um ciclo virtuoso na economia brasileira. Caso contrário, teremos problemas”, prevê. Segundo as estimativas da maioria dos analistas econômicos, o Brasil deve crescer em torno de 4,6% em 2007. Se os juros voltarem a subir, o nível de consumo interno cairá, reduzindo também essa previsão de crescimento.

Dizendo de outro modo, o Brasil está melhor preparado para enfrentar essa crise, mas não está imune a ela. “A posição de nossas reservas é muito melhor hoje, o que confirma que a formação de reservas era essencial para a estabilidade da moeda brasileira. Esse é um dos grandes aprendizados que devemos tirar, ou seja, fazer reservas é essencial para o Brasil crescer de modo estável. Menos juros, mais reservas: eu diria que esse é o caminho”, conclui o economista. Na direção contrária, estão aqueles que acreditam que a elevação do valor do dólar pode provocar alta na inflação porque várias mercadorias utilizam matérias-primas importadas, cujo preço depende da cotação do dólar. Se essa visão prevalecer no Banco Central, a redução da taxa Selic (que vem desde setembro de 2005) pode ser interrompida ou mesmo revertida, retomando um processo de alta. Ou seja, o BC definirá os desdobramentos dessa crise no país.

Por Marco Aurélio Weissheimer – Carta Maior.

NOTÍCIA COLHIDA NO SÍTIO www.cartamaior.com.br.

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