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Vem pra LUTA!

Trabalhadores organizados são fundamentais à democracia

Afirmação foi feita pelo cientista político André Singer, durante palestra na Escola Dieese que abordou as manifestações de junho

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São Paulo – Em palestra na Escola Dieese de Ciências do Trabalho, o cientista político e professor da USP André Singer levantou questões e convidou os presentes a trocar impressões sobre as manifestações que começaram no Brasil em junho passado. “Vou falar um pouco, mas sugiro que depois isso vire uma conversa, até porque acho que são vocês que podem responder a algumas questões”, propôs antes de começar a abordar o tema Manifestações Populares e Participação política: Desafios para a Democracia, para uma plateia formada principalmente por dirigentes sindicais, estudantes e técnicos do Dieese.

Singer fez um balanço do cenário que começou a se desenhar no país a partir do governo Lula e que, segundo ele, é fundamental para entender o contexto em que se deram as manifestações de junho. Mas antes mesmo de avaliar o que se passou no Brasil a partir de 2003, afirmou: “Hoje, no debate intelectual, tem muita gente dizendo que o momento em que a classe trabalhadora tinha peso na conjuntura passou. Eu não acho que passou. Aquilo que chamo de fração organizada da classe trabalhadora ainda é elemento fundamental na definição das conjunturas políticas”.

10 anos de PT – Autor do livro Os Sentidos do Lulismo e porta-voz da Presidência entre 2003 e 2007, Singer destacou que a recuperação da economia mundial em 2003 foi, de certa forma, um fenômeno de sorte para o governo Lula. “Lula foi agraciado com o fato de que seu mandato começou quando a economia retomou a expansão mundial em 2003. E isso veio com uma característica que não se testemunhava havia 20 anos: a valorização das commodities. E como o Brasil é um dos maiores ou o maior do mundo em commodities, teve sua exportação multiplicada sem ter de fazer nada. A virtude do governo Lula foi aproveitar isso para reduzir a pobreza sem nenhum tipo de conflito político”, disse.

Segundo o professor, isso não estava nos programas nem da esquerda, nem da direita. “O PT sempre pensou que para reduzir a pobreza era preciso enfrentar o capital. Era um partido radical e não havia nada de absurdo nessa leitura. Mas essa ruptura não foi feita, porque surgiu o lulismo que conseguiu reduzir a pobreza sem enfrentar o capital.”

A direita, de acordo com Singer, apostava que ou o PT trairia seus objetivos ou tentaria cumprir seu programa e seria derrubado como foi João Goulart, em 1964. “Mas ao invés disso houve uma política de redução da pobreza inédita no país. O PT multiplicou por mais de 10 vezes os programas de renda mínima iniciados pelo PSDB. E, nesse caso, a quantidade se transformou em qualidade, porque uma coisa é atingir alguns milhões, outra bem diferente é chegar a 50 milhões de pessoas atendidas pelo Bolsa Família. Essas pessoas começaram a mudar suas vidas a partir do programa. Em parte, portanto, o lulismo é o resgate dos compromissos da esquerda desde sempre.”

Singer citou ainda como contribuições para esse quadro o crescimento do crédito consignado, o aumento expressivo do salário mínimo (valorização que hoje chega a 70%) e a criação de empregos – o desemprego, antes em 12%, chegou a 5% –, como outros elementos fundamentais para uma política que, além de social, foi econômica.

Sem rompimentos – E acrescentou que, no entanto, a gestão Lula não rompeu com pontos essenciais da política econômica anterior. “O governo conviveu com a manutenção de linhas neoliberais, como o superávit, metas de inflação com alta dos juros, câmbio flutuante. O que prejudica uma possibilidade de projeto nacional com crescimento e soberania.” Ao fazer isso, segundo Singer, o governo Lula mais uma vez evitou o conflito com o capital.

O cientista político também destacou que com a reeleição do presidente petista em 2006, consolidou-se o realinhamento eleitoral formado pelo subproletariado brasileiro. “O projeto do governo Lula atende os interesses dessa classe, pois muda o Brasil, no sentido da inclusão social e da redução da pobreza, mas faz isso dentro da ordem, sem ruptura.”

Governo Dilma – André Singer lembrou que a crise mundial de 2008, sentida mais fortemente no Brasil em 2012, fecha a “janela aberta” que Lula encontrou em 2003.

Nesse novo contexto, destacou o protocolo de intenções assinado em maio de 2011 por CUT, Força Sindical e Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) pela retomada do crescimento com industrialização e distribuição de renda. “Esse documento defendia a redução dos juros e o investimento produtivo. Os metalúrgicos foram às ruas junto com a Fiesp, pedindo intervenção do câmbio para desvalorizar o real e assim proteger a indústria brasileira.”

E a partir de agosto de 2011, de acordo com Singer, a presidenta fez exatamente o que estava no pacto: “O Banco Central pela primeira vez começou a baixar os juros, quando o mercado jamais imaginava que isso iria acontecer. Essa atuação foi tão importante que os juros reais caíram a uma taxa de 2%. O governo brasileiro enfrentou o capital de uma forma aberta. Pela primeira vez os bancos foram obrigados a reduzir o spread. E isso para atender o protocolo das centrais com a indústria, já que para o investimento produtivo é necessário dinheiro acessível.”

Singer lembrou ainda que no primeiro semestre de 2012, o governo “teve a coragem” de alterar as regras da poupança para que os juros continuassem caindo. “Além disso, mexeu no câmbio e começou a taxar o capital especulativo. Situação em que o governo, de arbitragem, adotou um lado: o lado da coalisão produtivista.”

“Mas aconteceu que o crescimento não veio: foi de 2,7% em 2011, quando em 2010 foi de 7,5%. E em 2012, ao invés de voltar para 4 ou 4,5%, como se esperava, ficou em 1%. Ou seja, o Brasil parou. E porque que o Brasil parou quando o governo tomou corajosamente todas as medidas do pacote produtivista?”, questionou.

Coalisão rentista – Do outro lado do pacto produtivista, de acordo com Singer, estava a coalisão rentista que “quer ganho financeiro alto e real valorizado, ainda que isso implique em um país que cresça pouco, que não seja industrializado e que continue exportando matéria prima”.

Ao rentismo, segundo o professor, aliou-se a classe média tradicional. “Essa classe média que prefere juros altos e real valorizado para comprar produtos fora do Brasil, tomou partido do capital. E essa fração, embora 15% da população, dá uma base de massa para o capital financeiro. Essa fração de classe foi para as ruas em junho”, afirmou.

Insatisfação – Para o cientista político, os reflexos do não crescimento estão nas cidades, e acabariam por se refletir nas eleições de 2012, quando a oposição ganhou na maioria das grandes metrópoles, “uma consequência da grande insatisfação urbana”.

Ele citou como exemplo da situação precária nas grandes cidades, os 40 mil homicídios em 2012. “Isso é número de país em guerra.” Citou também os grandes problemas de locomoção nas metrópoles, nas quais os trabalhadores chegam a perder quatro horas por dia no trânsito. “O problema da mobilidade urbana é gravíssimo.”

Para Singer, não é surpresa que as manifestações tenham acontecido. “Houve uma mudança de estado de espírito que tem a ver com o fato de que a economia está patinando.” A surpresa, segundo ele, está no momento em que aconteceram e na forma como se deram, o que ninguém poderia prever.

Manifestações – “Num primeiro momento as manifestações foram por mais gastos públicos principalmente em transporte, causa que ganhou a adesão da classe média. No entanto, após a grande repressão do dia 13 de junho (pela Polícia Militar, em São Paulo), os setores menos de esquerda perceberam que ali havia uma janela de oportunidade para levar às ruas outras reivindicações, como o combate à corrupção.”

Singer salientou que a bandeira pelo fim da corrupção não é conservadora, mas é sempre forte para quem está na oposição, já que os governos quase sempre são os alvos das denúncias. “E surpreendentemente, no dia 20 de junho, a esquerda foi expulsa da passeata na Avenida Paulista.” Uma manifestação da qual participaram juntos, de acordo com ele, a extrema direita e a extrema esquerda.

Trabalhadores e democracia – O professor encerrou sua fala alertando contra essas ameaças à democracia. “Não há caminho de transformação a não ser a democrática, então é fundamental para a classe trabalhadora preservar a democracia.”

Ele afirmou ainda que a democracia é resultado das lutas trabalhistas. “É da dialética do confronto que a classe trabalhadora faz em nome de seus próprios interesses que se mantém a democracia. E essa capacidade de organização é a única capaz de enfrentar o modelo não democrático de sociedade”, finalizou.

Andréa Ponte Souza – 9/8/2013

Notícia colhida no sítio http://www.spbancarios.com.br/Noticias.aspx?id=5363

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