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Por 18:46 Sem categoria

Pacto adversativo versus Pacto progressista

A ‘Folha’ quer ser o bastião de um conservadorismo mais que nunca determinado a implodir a agenda progressista que ordena o país desde 2003.

A exemplo dos pavões do PSDB, porém, o veículo dos Frias também se pretende ‘moderno’ .Uma referência de desprendimento republicano, ‘a serviço do Brasil’.

Incompatibilidades entre uma coisa e outra são escamoteadas frequentemente abusando-se de um recurso ardiloso: o fraseado adversativo.

Basta um ‘mas’ depois das vírgulas. Pronto.

A relação de forças, os conflitos de interesses que estruturam os impasses macroeconômicos atuais, as dinâmicas condicionadas pela desordem neoliberal, o saldo dos avanços e, sobretudo, os riscos de uma ruptura tudo se dissipa e se dissolve.

O pontificado do arrasa-terra lubrifica-se nesse genial truque de um ‘mas’ depois da vírgula.

Evidências incontornáveis reduzem-se a partículas de Higgs. Por exemplo, o fato de o dispositivo midiático ser um dos escudos implacáveis do rentismo neoliberal que engessou e corroeu – e ainda corrói – as turbinas do investimento produtivo nacional.

Nada disso importa ao pasteurizador narrativo da Folha.

O truque consiste em nivelar um avanço inquestionável da década petista a um ponto não contemplado da agenda conservadora.

Passo seguinte: conclui-se que nada de relevante aconteceu no país; nada mudou desde 2003; não houve um miserável centímetro de avanço histórico.

Escavado o buraco negro desobriga-se o foco de contemplar as conquistas –desobriga-se também quem de direito a defende-las. No limite podemos chegar ao suicídio assistido pelos princípios inquebrantáveis que levaram alguns a preferir a vitória de Serra contra Haddad em SP — ‘para punir a degeneração petista’.

O país –o governo construído desde 2003, com suas falhas clamorosas e avanços reais– vira uma terra de ninguém. Uma Geni de fim de ano. Pau nela.

Em torno do marco zero pontifica-se livremente sobre o futuro: tudo está por fazer.

O negacionismo adversativo é uma espécie de doença infantil do conservadorismo.

Como outras doenças infantis, trata-se de abduzir a realidade e a relação de forças no complacente espaço do idealismo.

É esse o motor do editorial da Folha desta 4ª feira, sugestivamente intitulado ‘Reforma Geral’. Ou vassourão de fim de ano.

Ou ainda, ‘chamada geral ao pacto adversativo contra o governo Dilma’.

A meta é exposta com todas as letras no texto: desqualificado o presente, o futuro passa por ‘mudar desde as condições de produção até as próprias prioridades nacionais”, convoca o confiável diário dos Frias.

Só isso.

Quais prioridades nacionais?

O editorial não tem a audácia (ainda) de propor a supressão dos avanços sociais implantados no governo Lula.

Tampouco de clamar por alguma forma velada de arrocho salarial –a começar pelo salário mínimo, quem sabe.

Mas é disso que se trata.

A restauração do projeto derrotado nas últimas três eleições presidenciais implica negar a qualquer avanço do ciclo petista o condão de uma nova alavanca de desenvolvimento.

O editorial é uma carta proposta nesse rumo. Virão outras, por certo, sempre escudadas no ‘interesse nacional’.

A cobrança por avanços sintetiza um roteiro de regressão.

Reduzir o ciclo petista a uma montanha desordenada de corrupção, fracassos e intervencionismo-estatal-populista é o que autorizaria a volta dos geniais e impolutos tucanos ao leme.

Essa é a marcha dos acontecimentos.

Trechos ilustrativos desse ensaio de campanha para 2013/2014, pinçados do editorial adversativo da Folha desta 4ª feira, 26-12:

“… é verdade, o governo Dilma decidiu baixar o custo da energia, ainda que de forma desastrada”

” Impostos foram reduzidos de modo relevante, mas arbitrário”.

“o conservadorismo do governo, que não vem de agora. A última novidade relevante foi o aumento do mercado interno, a partir de meados do período Lula”.

“Decerto a redução dos juros terá efeito positivo, mas ela se deveu em parte a uma conjuntura econômica mundial excepcional”.

” (o país) precisa de um programa de aceleração do crescimento, (mas ) não este da marca de fantasia do governo, mas de uma reforma que altere as condições em que se produz, a maneira de governar e as prioridades nacionais”.

Vai por aí a coisa.

A investida conservadora contra a política econômica deve preocupar não só o governo.

Ela fala diretamente aos que pleiteiam avanços efetivos, e mais rápidos, na estratégia de crescimento com maior justiça social –e, portanto, com mais democracia participativa, único antídoto ao golpismo das togas.

A presidenta Dilma tem feito um pedaço do que cabe ao governo (faltam outros; a regulação da mídia, por exemplo).

Seguidos apelos aos empresários para que retomem o investimento na expansão da base industrial e logística ocorreram neste final de 2013. Será a batalha de 2014.

Um número resume todos os demais: 40 milhões de brasileiros saltaram da pobreza para o mercado de consumo no ciclo Lula.

O país foi pensado por uma elite que achava de bom tamanho governar para 30% da sociedade.

A ascensão progressista mudou a escala da economia e impôs a reordenação do desenvolvimento, da democracia e da comunicação.

A luta política atual é para adequar uma coisa a outra. Ou, do ponto de vista conservador, para retroagir uma coisa a outra.

O salto do investimento, a chamada formação bruta de capital fixo, é necessária para que o Brasil possa avançar na rota traçada desde 2003. Sem gargalos de infraestrutura e de oferta que terminem por gerar escassez e custos descontrolados.Em resumo: inflação, regressão na renda e alarmismo conservador (ensaios disso salpicaram recentemente na Economist,que pediu a cabeça de Mantega; e no blog do Financial Times, desta 4ª feira, que excreta a carniça neoliberal em tratamento desrespeitoso a Dilma e ao Brasil).

As empresas brasileiras estão líquidas. Há dinheiro em caixa para investir. O mesmo acontece no sistema financeiro. Há dinheiro grosso ocioso.

Desde 2008, no segundo governo Lula, medidas tem sido tomadas para induzir a transição a uma nova matriz macroeconômica.

Bancos públicos e decisões de Estado forçaram a queda dos juros (a Selic caiu 5,5 pontos em 12 meses). O câmbio –embora ainda insuficiente às exportações e deleteriamente propício às importações que asfixiam a industria local– já está cerca de 14% mais competitivo. Desonerações tributárias em valor equivalente a 1% do PIB foram autorizadas para impulsionar a competitividade manufatureira.

Mais importante de tudo: o efeito-riqueza propiciado pela ciranda rentista evaporou-se. Não dá mais para dobrar o pecúlio em dois ou três anos de farra do capital a juros.Muitas carteiras tornaram-se negativas.

Por que, então, as coisas ainda patinam a ponto de favorecer o chamamento da Folha ao pacto adversativo –a ‘reforma geral’ que incluiria “desde as condições de produção até a revisão das próprias prioridades nacionais”?

Um dos impasses consiste no fato de que o capital acostumado à liquidez rentista, associada a altas taxas de juros, recusa-se a migrar para projetos produtivos e de infraestrutura que não ofereçam vantagens líquidas equivalentes, na verdade maiores que as originais.

No fundo, o que se rejeita, de fato, é o comando do Estado sobre o próximo ciclo de investimentos.

No geral,as taxas de retorno dos projetos propostos pelo governo superam folgadamente o patamar obtido no mercado financeiro pós- crise de 2008. Sem esquecer que uma parte do capital é financiada a juros subsidiados pelo BNDES.

Mas eles querem mais.

Para investir em portos, ferrovias etc cobra-se em troca um retorno superior ao do mercado financeiro atual, ademais de um plus que compense a liquidez inferior, inerente a obras de longo prazo e difícil revenda.

Estamos no olho do furacão dessa queda de braço histórica.

Os dois lados enfrentam uma contagem regressiva excludente.

Os ponteiros do governo são ordenados pelo timming político.

A transição macroeconômica precisa ser validada por uma nova safra de investimentos. Ou Dilma chegará vulnerável à corrida para a reeleição.

O capital estocado nas tesourarias de bancos e empresas,por sua vez, queima como batata quente.

Não pode dar-se ao luxo de insistir em opções de baixa rentabilidade financeira desprezando retornos – de teto superiores – colocados na pauta do desenvolvimento.

A teimosia tem impactos em balanços,ações e dividendos. Acionistas podem fugir. Cabeças podem rolar. A resistência à eutanásia do rentista pode redundar em fuzilamento profissional de gestores atucanados.

Nessa guerra de nervos,a mídia cumpre o papel de dar aos apetites particulares uma crosta de suposto interesse geral.

Até quando a sabotagem conservadora poderá resistir?

Até onde o governo Dilma pode ir para tornar os atrativos à produção inapeláveis?

Não se trata de uma gincana entre puros e entreguistas.

Trata-se de esticar o fio das possibilidades de futuro dentro da relação de forças do presente, também para modificá-la para melhor.

Esses são os fatos que urgem e rugem por trás do editorial da Folha e de similares que devem inundar a mídia em 2013.

Não é um problema do PT ou da Dilma.

Tem a ver com a próxima década do país.

Com a próxima geração.

Pode ou não confirmar as possibilidades e esperanças depositadas no pré-sal.

Pode ou não viabilizar a transformação de 40 milhões de novos consumidores em novo sujeito histórico.

O governo, o PT e as forças progressistas que pavimentaram a caminhada de 2003 até o ponto atual precisam – urgentemente – repactuar as bases de sua aliança para impulsionar o passo seguinte da história.

Do contrário, a lógica conservadora terá o campo livre para agir e se materializar num poderoso pacto adversativo.

É preciso conversar o mais rápido possível. Antes que as diferenças se transformem em distanciamento e o estranhamento em fragmentação progressista.

Cabe ao governo Dilma a iniciativa do jogo. Ou vamos esperar os editoriais de primeira página?

(*) Revisado e atualizado em 27/12/2012, às 16h35

Postado por Saul Leblon às 16:13

Artigo colhido no sítio http://cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=6&post_id=1162

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RENTISTAS UIVAM LÁ, A MATILHA LATE AQUI As aplicações do’ Sloane Robinson’, um dos dez maiores fundos hedge do mundo e dos mais antigos de Londres, vão fechar o ano com saldo de US$ 2,5 bilhões. Em 2008, o fundo especulativo acumulava ativos de US$ 15 bilhões. O ‘Sloane’ esfarela. Sua rentabilidade despencou 17% no ano passado; afundará mais 2%  em 2012.

Não é um caso isolado. Rentistas de todo o mundo sofrem os reveses  da implosão  neoliberal agravada pelo fim da farra nos países emergentes– Brasil entre eles.

Sua passagem pelo país incluía ganhos triplos: na arbitragem dos juros (maiores aqui, remunerando captações a um custo menor lá fora); na diferença cambial entre a data de ingresso e a da saída, uma vez que o próprio tsunami especulativo forçava a valorização do Real, garantindo conversões vantajosas para o dólar na despedida; e, finamente, na jogatina ‘rapidinha’ nas bolsas, sem nem dispor de ações próprias, alugando carteiras junto a bancos.

A obstrução da pista principal do circuito, a dos juros, derrubados a fórceps pelo governo Dilma, melou o resto do passeio, prejudicado ainda pela queda nos mercados acionários.

O rendimento médio dos fundos hedges este ano, segundo a Reuters, será 50% inferior à variação dos índices de ações dos mercados emergentes, que deve crescer apenas 5% frente a 2011, contra 450% entre 2003/2007.

É quase o fim de uma era.

É desse pano de fundo que soam os vagidos em inglês contra o governo Dilma, ecoados de gargantas midiáticas profundamente comprometidas com as finanças desreguladas.

Caso da The Economist, que pediu a cabeça do ministro Mantega, na semana passada–caninamente saudada pelo seu back vocal em português; e a do Financial Times, desta semana, cujo blog faz referencias deselegantes ao país e a  sua Presidente (leia reportagem de Marcelo Justo, de Londres; nesta pág).

Como acontece quando as matrizes entram  no cio numa matilha, os uivos locais elevaram seus decibéis na última 4ª-feira.

Coube  à ‘Folha’ cravar o latido mais alto da praça, em editorial em que pede ‘reforma geral nas prioridades nacionais’.

(Carta Maior; 6ª feira, 28/12/2012)
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