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Desafios da renovação qualitativa do Congresso

No caso dos setores populares, é fundamental que haja uma articulação em nível estadual e nacional, de tal modo que unam esforços para ampliar sua representação no Congresso, sob pena de ampliação dos retrocessos, com a eleição de um Congresso mais conservador que o atual.

Antônio Augusto de Queiroz*

O senso comum imagina que a desqualificação da política e o desgaste dos congressistas, que votaram matérias impopulares e salvaram o presidente da República de 2 denúncias de corrupção, levará necessariamente a uma grande renovação do Congresso em 2018. Mas isto pode não se confirmar por uma série de motivos.

Antes de tratar desses motivos, lembremos que a média histórica de renovação, considerando as 7 últimas eleições para a Câmara dos Deputados foi de 49%. Parte importante dessa renovação decorre da desistência da tentativa de reeleição. Em média, pelo menos 100 dos 513 deputados não tentam renovar seus mandatos, seja por abandono da vida pública, seja para concorrer a outros cargos na disputa eleitoral, conforme tabela a seguir.

Ano da eleição Composição da Câmara no ano da eleição Nº de candidatos à reeleição Índice de recandidatura Nº de reeleitos Índice de reeleição¹ Nº de novos Índice de renovação²
1990 495* 368 74,34% 189 51,35% 306 61,82%
1994 503** 397 78,92% 230 57,93% 273 54,28%
1998 513 443 86,35% 288  65,01% 225 43,86%
2002 513 416 81,09% 283  68,02% 230 44,83%
2006 513 442 86,16% 267  60,41% 246 47,95%
2010 513 407 79,33% 286  70,76% 227 44,25%
2014 513 387 75,43% 273 70,54% 240 47%
*A transformação dos territórios do Amapá e Roraima em estados aumentou em oito deputados a composição da Câmara que, na Legislatura de 1991-1995 passou de 495 para 503 deputados.

** Na Legislatura 1995-1999 passou de 503 para 513 deputados, em razão de lei complementar que regulamentou o aumento da bancada de São Paulo de 60 para 70 deputados previstos na Constituição de 1988.

¹O índice de reeleição da Câmara considera apenas os deputados no exercício do mandato que são candidatos à reeleição.

²O índice de renovação é calculado na composição total da Câmara.

Em geral, o índice de renovação para as cadeiras em disputa para a Câmara dos Deputados está sempre associado ao ambiente político. Quando o ambiente é de crise, com escândalos, a renovação aumenta. Quando o ambiente é de relativa estabilidade, o desejo de mudança diminui. O índice de renovação também está associada ao número de candidatos à reeleição. Quanto mais parlamentares disputam a reeleição, menor o índice de renovação, pelas notórias vantagens que têm aqueles que disputam no exercício do mandato.

E por que em 2018 poderá ser diferente, com uma renovação menor que a média história? Basicamente pelas razões que seguem.

Em 1º lugar, neste pleito o número de candidatos à reeleição tende a ser maior que a média histórica, especialmente pela necessidade de fórum privilegiado para fugir de eventuais punições pela prática do crime de caixa 2 e outros crimes nas campanhas anteriores.

Em 2º lugar, porque a janela para mudança de partidos nos 6 meses que antecedem à eleição dá ao detentor de mandato e candidato à reeleição enorme vantagem para negociar tratamento privilegiado em seu partido, exigindo a garantia de espaço diferenciado no horário de rádio e TV, além de mais recursos do fundo eleitoral, sob pena de mudar para outro partido que lhe ofereça tais vantagens.

Em 3º porque houve redução de 90 para 45 dias do tempo de campanha eleitoral, facilitando a vida dos candidatos à reeleição, que tem nome conhecido e serviços prestados, em detrimento dos novos postulantes.

E, em 4º, porque o detentor de mandato dispõe de uma série de outras vantagens comparativas em relação a quem aspirar ocupar seu lugar, conforme segue:

1) disputa o mandato no exercício do mandato;

2) tem bases eleitorais consolidadas;

3) tem cabos eleitorais fidelizados;

4) dispõe de recursos e meios para angariar apoio, como:

4.1) as emendas individuais, cujo valor anual supera R$ 14,7 milhões (valores para 2018);

4.2) a quota ou verba de gabinete entre R$ 30 e R$ 38 mil por mês para despesas diversas do mandato, como passagens áreas, telefonia e material de expediente, consultoria, hospedagem, impressão de material, combustível, locação de veículos e aluguéis de escritórios políticos, etc;

4.3) verba de R$ 78 mil mensais para a contratação de pessoal no gabinete e no Estado de origem; e

4.4) poder, prestígio e acesso aos veículos de comunicação, muitas vezes por interesse dos próprios veículos em manter boa relação com os detentores de mandatos.

O desgaste dos atuais detentores de mandato certamente irá diminuir o número de votos, mas não terá o condão de evitar a reeleição. É que os pequenos partidos que surgem com perspectiva de renovação, se não fizerem coligações, dificilmente conseguirão atingir a cláusula de barreira.

E também haverá aumento dos votos brancos e nulos, reduzindo o número de votos necessários para ocupar uma vaga, desde que o partido ou coligação atinja o quociente eleitoral.

O que tende a acontecer – e mesmo assim em menor escala – não será uma renovação real, mas a mera circulação no poder, com a substituição de representantes de uma oligarquia local por outra. Ou seja, quem não conseguir se reeleger terá sua vaga ocupada, majoritariamente, por ex-prefeitos, ex-governadores, ex-deputados estaduais, ex-secretários, ex-ministros, etc.

No caso dos setores populares, é fundamental que haja uma articulação em nível estadual e nacional, de tal modo que unam esforços para ampliar sua representação no Congresso, sob pena de ampliação dos retrocessos, com a eleição de um Congresso mais conservador que o atual.

Para tanto, é indispensável que os movimentos sociais, os trabalhadores do setor privado e os servidores públicos priorizem candidaturas e concentrem votos nelas, além de os partidos do campo popular só fazerem coligação na eleição proporcional onde houver identidade programática, sob pena de acontecer o que ocorreu em 2014, quando a esquerda ajudou a eleger dezenas de deputados de partidos contrários ao seu ideário.

Como haverá grande escassez de recursos, é preciso que haja criatividade e emprego da solidariedade de classe, potencializando o financiamento eleitoral coletivo, principalmente mediante a vaquinha online (crowgunding) por meio da internet e também a comercialização de bens e serviços e a promoção de eventos de arrecadação, conforme autoriza a legislação eleitoral.

Portanto, se não houver unidade do campo popular e democrático os riscos de retrocesso são enorme, inclusive com a ameaça de redução das atuais bancadas dos partidos de campo da esquerda. Por isso a importância de não fazer coligação, nas eleições proporcionais, com partidos sem unidade programática, para evitar transferir votos da esquerda para as forças liberais e de centro-direita; não pulverizar os votos e apoiar os candidatos comprometidos com os interesse dos trabalhadores; e denunciar todos aqueles que votaram contra os interesses dos assalariados, bem como chamar a atenção para o tipo de projeto que os candidatos liberais defendem, como forma de evitar a ampliação da presença do capital no Congresso.

(*) Jornalista, consultor, analista político e diretor de Documentação do Diap

Artigo colhido no sítio http://www.diap.org.br/index.php/noticias/agencia-diap/27805-desafios-da-renovacao-qualitativa-do-congresso

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Raymundo Costa: Governo novo, Congresso velho

Como haverá uma janela para troca de partido em março, os atuais deputados têm exigido de suas siglas que canalizem para eles os recursos financeiros do partido e o tempo de rádio e televisão. O velho Congresso larga na pole position.

Raymundo Costa*

Seja um nome novo ou mais experiente, o presidente a ser eleito em outubro terá de conviver com um Congresso não muito diferente do atual. De acordo com as previsões mais atualizadas do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), a renovação da Câmara deve ser de 45% dos deputados ou menos, abaixo da média histórica de 49%. O número de partidos representados no Congresso deve cair de 28 para algo em torno de 18, o que ainda é muito para uma relação política saudável e eficiente entre o Legislativo e o Planalto.

O Congresso provou e gostou de compartilhar o governo. O governo Temer pediu muito do Legislativo e levou bastante, sendo sempre com reciprocidade. Não é à toa que se fala nos corredores do Congresso que é difícil distinguir se Temer tem uma base de apoio ou se é a base que tem um presidente. É nesse contexto, por exemplo, que a candidatura do deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), floresce entre partidos aliados do Planalto. O pai, Cesar, é contra, acha que o filho tem ainda muita estrada pela frente, mas os simpatizantes de Rodrigo falam que não vão entregar os êxitos das reformas para o ministro Henrique Meirelles (Fazenda). Rodrigo seria uma espécie de “candidato da geração” capaz de conduzir com profissionalismo as relações do Executivo com o Legislativo.

Outro “profissional” do ramo é Geraldo Alckmin, governador de São Paulo e presidente do PSDB, que deve ser o escoadouro natural dos partidos da coalizão governista, se reagir nas pesquisas eleitorais. Por enquanto, Alckmin estacionou na faixa dos 8% das intenções de voto. O apresentador de TV Luciano Huck e o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa estão na conta dos “amadores”. Até mesmo Jair Bolsonaro, com sete mandatos no costado, é visto como um candidato que terá dificuldade de manter a parceria governo-Congresso. Michel Temer, o presidente que levou essa convivência ao limite, perdeu a condição de se candidatar à reeleição em 17 de maio de 2016.

É improvável que a emenda instituindo o semipresidencialismo para 2019 seja aprovada no Congresso. Na prática já é o modelo exercitado por Temer e a coalizão governista, com as virtudes e defeitos impostos por uma conjuntura adversa. O problema para o futuro presidente talvez não seja propriamente a parceria com o Congresso Nacional, mas o fato de conviver com senadores e deputados viciados no toma lá, dá cá que marcou a relação nos últimos anos, visto que a maioria dos atuais parlamentares deve voltar na eleição de 2018.

O diretor do DIAP Antonio Augusto Queiroz reconhece que a relação Executivo-Legislativo mudou de patamar e deve se manter no novo governo. Depois de defenestrar dois presidentes da República, Fernando Collor e Dilma Rousseff, e capturar o governo de Michel Temer, o Legislativo não admite voltar à condição coadjuvante anterior ou de mero carimbador das medidas gestadas no Planalto. Mas ele chama a atenção para “três mudanças de paradigmas” às quais deve se submeter o novo governo. Curiosamente, as três ocorridas durante o primeiro governo da ex-presidente Dilma Rousseff. “Algumas por mérito e outras por culpa dela mesma”, diz.

A primeira é a questão ética. A Operação Lava-Jato teve condições de avançar graças a leis aprovadas no governo Dilma, como aquelas que permitiram a delação premiada, a responsabilização da pessoa jurídica e a delação premiada, além da atualização da lei de lavagem de dinheiro. Sem elas o Ministério Público Federal teria poucas condições de avançar como avançou na Lava-Jato. “Qualquer que venha a ser o governante terá que conviver com esse novo padrão ético. Ele pode até delinquir, mas vai responder por isso”.

A segunda mudança: o governo não tem mais margem de manobra para interferir na economia como fazia Dilma. A ex-presidente, por exemplo, quis limitar o lucro de empresas, de um lado, e interferir na gestão, de outro.

A terceira é gastar perdulariamente, sem respeito aos limites prudenciais e legais. “Pegar despesa provisória e transformar em despesa permanente”, como explica Queiróz.

Dilma fez, mas a prática é antiga. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso cobriu aumento para servidores e reajuste do salário mínimo com base na CPMF, o “imposto do cheque”, que era uma receita provisória. “Esse padrão mudou. Mudou em função do episódio que resultou na cassação da Dilma”. Temer tenta mexer na chamada “regra de ouro” porque a despesa já existe, não está tentando criar uma nova.

Antes de o Congresso aprovar a reforma política, a previsão era que a renovação da Câmara dos Deputados seria uma das maiores da história recente. Longe disso. O maior índice de mudança, depois da Constituinte, se deu na eleição de 1990 – 61% dos deputados não voltaram; em 1994, após o escândalo dos “Anões do Orçamento”, o índice foi de 54%. Desde então se mantém entre os 43% e os 47%. Devido ao desgaste do atual Congresso, a expectativa era de um recorde histórico. As novas regras do jogo, estabelecidos na reforma política de 2016, mudaram o rumo da prosa.

Pelo menos três novos elementos contribuem para a manutenção do status quo: recandidatura, tempo de campanha e financiamento eleitoral.

Em 2018 haverá mais candidatos à reeleição que de costume, pois o Judiciário tem considerado crime a prática do caixa dois e os deputados precisam da cobertura do foro especial. Até 2014, pelo menos 20% dos deputados desistiam de tentar a reeleição de saída, por motivos variados. Por outro lado, a redução de 90 para 45 dias do tempo de campanha favorece quem já está no mandato. Por último, ausência do financiamento empresarial de campanha também ajuda a quem já tem mandato. Como haverá uma janela para troca de partido em março, os atuais deputados têm exigido de suas siglas que canalizem para eles os recursos financeiros do partido e o tempo de rádio e televisão. O velho Congresso larga na pole position.

(*) Jornalista. Publicado originalmente no jornal Valor Econômico

Artigo colhido no sítio http://www.diap.org.br/index.php/noticias/agencia-diap/27811-raymundo-costa-governo-novo-congresso-velho

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