Já pensaram como os mitos são criados? Às vezes vêm da pura imaginação humana e, muitas vezes, têm um fundo de realidade. Pega-se um fato, viraliza-se esse fato, com uns bons e muitos toques de fantasia, em que o protagonista é uma vítima deveras prejudicada que se ergue das cinzas para continuar sua empreitada contra a injustiça. Alguma semelhança com as ficções em torno da tal cadeirada? E a tal facada, te vem à memória? Pois então!
Que a política (principalmente a partidária) no Brasil virou circo há muito tempo, sabemos. Os debates são shows de horrores, com ataques recheados de mentiras e totalmente esvaziados do debate de ideias, de ideologia e de propostas que deveriam ser. Mas, já notaram o quanto os circos, os de verdade, são raros hoje em dia? Já se perguntaram por que? Circo parece coisa do passado. E, de certa forma, talvez seja. O picadeiro já não tem animais selvagens (que bom), as piadas circulam tão rápido nas redes, em formatos tão diversos, que parece perda de tempo ouvir um palhaço (de verdade), e por aí vai. O circo está vazio, porque ninguém mais dá palco ao show circense. Já nos palcos bufônicos da política nacional…
E damos palco, e palco eles ganham. Vídeos diretamente da cama hospitalar, memes se reproduzindo astronomicamente. Estamos rindo? Sim. Estamos achando que se merecem? Sim. Mas há quem esteja se aproveitando desse palco todo. Se para alguns, a cena grotesca é motivo de risos, para outros é o surgimento de um novo mito. Para mim, sinceramente, mito bom é o mito grego (ou troiano, egípcio, druida, afro ou indígena).
O que, de fato, construímos quando celebramos uma agressão? E, mais, numa situação que deveria ser de debate político? É claro que não estávamos esperando que aquelas duas “figuras” fossem trazer luz a questões importantes e fossem realmente construir um diálogo ideológico e político aproveitável. Mas, me questiono (enquanto rio amargamente de tantos memes que provam a criatividade nata do brasileiro) os usos que permitimos que sejam feitos por aqueles que acreditam que ali ocorria uma luta de gladiadores. Como a cena é vista por aqueles que enxergam ali dois possíveis novos mitos? E, principalmente, dar visibilidade a isso (lembrando que a maior parte daqueles que tendem a projetar suas fantasias DCômicas em homens da política não costumam acompanhar debates na TV) está mais ajudando ou atrapalhando a real democracia!?
Com o olhar obviamente parcial, porque todos o são, daqui o que eu vejo no fim dessa estrada ladeada por facadas, cadeiradas e espectadores que se dividem entre risos e rezas, é um fim do mundo que pode nem precisar de um meteoro.
Regina Maria Mirandaé formada em Letras, pela UFPR, e especialista em Educação à Distância. É bancária do Banco do Brasil, dirigente sindical e professora particular de Produção de Texto.