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Regulação e necessidades do sistema

Nesse aniversário dos trintas anos da previdência privada no Brasil, há muita coisa a comemorar, como demonstraram os encontros promovidos pelo Assprevisite em vários estados brasileiros. Há também, no curso evolutivo do sistema, uma agenda a ser desenvolvida. Segue abaixo uma proposta para reflexão.

Criação de um órgão oficial autônomo. O Estado brasileiro não foi capaz de acompanhar institucionalmente os aprimoramentos ocorridos na previdência complementar brasileira. A ausência de um órgão estatal com quadros estáveis e especializados, dirigentes com mandato e orçamento próprio, a comunidade de fundos de pensão estará vulnerável a mudanças de humor, de estilo e de prioridades desse ou daquele governo. Esse risco de mudanças abruptas na regulação, que poderíamos talvez chamar de risco regulatório ou risco político, é antes de tudo um risco sistêmico, que pode abalar a estabilidade de regras de que tanto depende a previdência privada.

O órgão de supervisão dos fundos de pensão não pode ser forte por uma prioridade eventual desse ou daquele governo, mas sim por força da institucionalidade, que confere impessoalidade e continuidade às relações entre os agentes governamentais e os integrantes da previdência complementar. Enquanto não houver uma agência institucionalmente sólida, os fundos de pensão estarão sujeitos à sobreposição de órgãos e instâncias oficiais, com alto risco regulatório e risco político de descontinuidade.

Déficit e superátiv. Tendo em vista que dois terços da previdência complementar operada por fundos de pensão ainda se compõem de planos de benefício definido, a gestão do passivo atuarial é algo fundamental. Se as obrigações do plano previdenciário estiverem mal dimensionadas, o fundo pode não honrar seus compromissos, independentemente da boa gestão dos recursos. A meu ver, é preciso disciplinar minimamente o que seja déficit e superávit (passando inclusive pelo aprimoramento do plano de contas), bem como a forma de tratá-los, tarefa do CGPC, pois tanto um como outro constituem situações de desequilíbrio, que não podem se perpetuar.

Despesas Administrativas. Não parece razoável que se queira aplicar a Resolução CPC 01, de 1978, ou mesmo o Decreto 606/92 (nível federal), para efeito de monitoramento de despesas administrativas. O limite quantitativo para aferição de despesa administrativa não pode ser linear, pois não pode tratar igualmente os desiguais. Muitos planos previdenciários entraram em extinção, sem o ingresso de novos participantes; outros foram saldados, com cessação inclusive das contribuições previdenciárias, sem falar dos planos que, à medida em que amadurecem, com um número maior de assistidos, entra em declínio a contribuição previdenciária. O ideal é que se criasse um novo disciplinamento para todos os planos de previdência, sem exceção, com base na combinação de liberdade com transparência. No entanto, a Lei Complementar 108 exige uma regulamentação, que estabeleça “critérios e limites” para as despesas administrativas dos planos patrocinados pelas estatais. O disciplinamento dessa matéria é extremamente relevante, pois a partir daí os participantes e assistidos, bem como os patrocinadores, poderão cotejar em bases mais objetivas os diferentes custos de administração de seus planos previdenciários.

Governança corporativa. As estruturas de governança dos fundos de pensão melhoraram muito nos últimos anos, com a profissionalização dos membros da diretoria e o fortalecimento dos conselhos deliberativo e fiscal. Para efeito de qualificação ou de imputação de responsabilidade, a legislação não diferencia os conselheiros indicados pelo patrocinador ou eleitos pelos participantes e assistidos. Todos os dirigentes do fundo – diretores e conselheiros – são responsáveis pela boa gestão do plano previdenciário, devendo se orientar pelos princípios da prudência, do conservadorismo e lealdade à integridade e solidez do plano previdenciário. Questões como competência, custos, conflitos de interesses e transparência serão cada vez mais debatidas e tendem a se inserir no processo de auto-regulação do sistema.

Limites e diversificação de investimentos. Os limites mínimos de aplicação foram suprimidos em 1994, ou seja, há pouco mais de dez anos, fruto da evolução do sistema. Nos próximos anos, os limites e sub-limites para investimentos, que hoje vão além das “diretrizes” previstas na LC 109/01 (art. 9º), terão que ser revistos. Enquanto havia uma concentração excessiva em títulos do Tesouro, em face das altas taxas de juros, era fácil adotar uma postura inercial. Em razão do novo cenário econômico, caracterizado por inflação sob controle, taxas de juros em declínio, contas externas em ordem e disciplina fiscal, e do ambiente democrático consolidado, o Brasil passa a ser uma referência segura para o mundo dos investimentos de longo prazo, especialmente os investidores institucionais, como os fundos de pensão.

Em tal cenário, é razoável supor que boa parte dos recursos vá migrar da dívida pública para a dívida corporativa privada, ficando mais tenso o ponto ótimo entre risco e retorno. Com isso, os gestores precisarão de maior liberdade, assumindo também maior responsabilidade, sem a tutela estatal dos limites quantitativos, que hoje descem a pormenores algumas vezes potencialmente contrários aos interesses dos poupadores. Se a taxa básica de juros chegar nos próximos anos à casa dos 4%, a discussão em torno dos investimentos no exterior também vai forçosamente aparecer, já que o interesse do fundo de pensão, acima de tudo, é o de garantir a aposentadoria dos participantes e assistidos dos planos de previdência, aproveitando as oportunidades num mundo cada dia mais globalizado e plano.

Nesse contexto, a análise de risco de crédito ganhará importância nunca vista entre nós. Com a diversificação dos investimentos, os fundos de pensão darão contribuição ainda maior para o universo empresarial brasileiro, influenciando positivamente na melhoria da governança das empresas onde investem e na democratização do capital, a exemplo do que tem ocorrido noutros países mais desenvolvidos (sobre a temática de um novo “capitalismo social” ou “economia civil”, há um interessante livro: “The New Capitalists – how citizen investors are reshaping the corporate agenda”, 2006, Harvard Business School Press).

Poder Judiciário. Os fundos de pensão entraram definitivamente na agenda do Poder Judiciário. Com a existência de novos conflitos envolvendo os fundos de pensão, é natural que o Poder Judiciário seja provocado para resolvê-los. Nos últimos anos, cresceu consideravelmente o volume de processos judiciais tratando de previdência complementar, muitos já em tramitação nos Tribunais Superiores. Em várias situações, o Judiciário tem acolhido pedidos que, no longo prazo, poderão tornar os fundos de pensão insolventes. Não se pode ignorar um dos pilares da previdência complementar, isto é, a necessidade de constituição de reservas que garantam o benefício contratado (Constituição Federal, art. 202).

Apesar da alta qualificação intelectual e dedicação de seus integrantes, o Poder Judiciário não tem conseguido dar respostas adequadas para muitos dos problemas que lhe são apresentados. Número excessivo de processos, enorme variedade de temas sob a consideração do mesmo magistrado, estrutura recursal complexa, proliferação dos cursos de direito e baixa capacidade gerencial da administração judiciária são algumas das causas da falta de eficiência do Poder Judiciário. Além disso, vale lembrar que a tradição brasileira não é a da previdência capitalizada, e sim a da previdência oficial do INSS. Ou então é a previdência do servidor público, ligada ao Tesouro. Em ambas, se faltar dinheiro, o orçamento público é logo chamado, o que não acontece com a previdência complementar, mesmo que patrocinada por empresas estatais. Diante desse quadro, um dos maiores desafios é administrar, com base na Resolução CGPC 13/04, o “risco jurídico” enfrentado pelos planos de previdência privada.

Previdência complementar dos servidores públicos: é importante aprovar o Projeto de Lei 1992/07, pois significará um grande passo para a unificação e universalização da previdência básica, como um pilar obrigatório, e, partir daí, uma previdência complementar privada e voluntária para todos os trabalhadores, celetistas ou estatutários.

Sinergia das indústrias de previdência complementar, seguros e mercado de capitais. Por fim, como tendência geral, é razoável supor que haverá uma aproximação cada dia maior entre os segmentos voltados para a captação da poupança popular, isto é, previdência complementar, seguros e mercado de capitais, seja pela colaboração sinérgica, seja pela concorrência.

Por Adacir Reis, que é sócio do escritório Reis Advocacia, sediado em Brasília, e presidente do Instituto San Tiago Dantas de Direito e Economia. Foi Secretário de Previdência Complementar

ARTIGO COLHIDO NO SÍTIO http://www.assprevisite.com.br/Clipping111771.html.

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