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As mulheres vão barrar a reforma da previdência

As mulheres de 1917

De acordo com numerosos historiadores, aquelas mulheres que se manifestavam para exigir pão desencadearam, sem saber, a tempestade que acabou com o czarismo

No dia 8 de março de 1917, as trabalhadoras da planta têxtil do bairro de Vyborg, em Petrogrado, se declararam em greve, abandonaram a fábrica e foram de oficina em oficina convocando centenas de pessoas, para aumentar a adesão ao movimento, e logo teriam que se enfrentar violentamente contra a política e o Exército. Pouco qualificadas, mal pagas, obrigadas a cumprir jornadas de 12 ou 13 horas em ambiente sujo ou insalubre, aquelas mulheres demandavam solidariedade e pediam que os homens a apoiassem em sua luta, especialmente os que eram trabalhadores qualificados, como os metalúrgicos, considerados os mais politicamente influentes entre a mão de obra da cidade. As manifestantes lançavam paus, pedras e bolas de neve contra janelas, e forçando a entrada nos centros de trabalho, exigindo ademais o fim da guerra e retorno dos homens da frente de batalha.

 

De acordo com numerosos historiadores, aquelas mulheres que se manifestavam para exigir pão – com métodos de protesto consagrados e primitivos, por demandas puramente econômicas e guiadas mais pela emoção que pela preparação teórica – desencadearam, sem saber, a tempestade que acabou com o czarismo, antes deste desaparecer atrás dos grandes batalhões de trabalhadores masculinos e partidos políticos dominados por homens. Desde o começo das greves, em fevereiro, se escutavam consignas contra a participação russa na I Guerra Mundial. A audácia, a determinação e os métodos das mulheres mostravam que elas sabiam qual era a raiz dos seus problemas, a necessária unidade da classe operária e a importância de convencer os soldados a deixar de proteger o Estado czarista e apoiar a revolta.

Trotsky explicou mais tarde: “as mulheres trabalhadoras desempenham um papel importante na relação entre operários e soldados. Avançam contra as forças de segurança com mais atrevimento que os homens, empunham rifles, suplicam, quase ordenam que eles abaixem as baionetas e se unam a elas. Os soldados ficam nervosos, envergonhados, trocam olhares inquietos, vacilam. Logo, o primeiro se decide, e então todas as baionetas se levantam e se colocam por cima dos ombros, para que a multidão avance”.

No final do dia, alguns soldados aceitaram o chamado das trabalhadoras e se uniram a elas, passando a utilizar os bondes como barricadas contra as forças de segurança que se mantiveram leais. Convencer os soldados para a causa não nasceu somente da consigna delas em defender o retorno dos soldados em guerra, ou por causa da espontaneidade contagiante dos protestos. As trabalhadoras da indústria têxtil haviam se relacionado desde 1914 com um grande número de soldados, a maioria deles do setor rural próximo de Petrogrado. Os homens dos quartéis e as mulheres das fábricas eram provenientes das mesmas regiões, e assim nasciam conversas e se estabeleciam relações que derrubaram o muro entre o operariado e os soldados, permitindo que as trabalhadoras conseguissem mais claramente o apoio armado.

As mulheres trabalhadoras estiveram na primeira linha da Revolução de Fevereiro, que foi o primeiro passo da queda do czarismo. Não foram somente a faísca, mas sim o motor que a impulsou, apesar dos receios iniciais de muitos trabalhadores e revolucionários masculinos. Costuma-se qualificar a Revolução de Fevereiro de espontânea, e em certo sentido isto é verdade: não foi planejada nem organizada por revolucionários. Mas a espontaneidade não equivale a falta de consciência política. As experiências das mulheres que assaltaram as fábricas de Petrogrado quando tanto os trabalhadores como os chefes de família eram obrigados a fazer fila durante horas para conseguir alimentos suprimiu a distinção entre a demanda econômica de pão e a reivindicação política de por fim à guerra. As circunstâncias materiais fizeram com que se culpasse pela fome e a miséria àqueles que eram definitivamente os responsáveis pelas mesmas: a guerra e os políticos que a dirigiam. Estas demandas não podiam ser satisfeitas sem uma mudança política radical.

Ademais, as mulheres bolcheviques desempenharam um papel crucial na greve, dedicando muitos anos de esforço a organizar as trabalhadoras não qualificadas, apesar de certas atitudes entre alguns homens de seu próprio partido, que diziam que organizar as mulheres era, no melhor dos casos, uma forma de distração da luta contra o czarismo e, no pior, fazer o jogo das feministas das classes altas, que afastariam as mulheres da luta de classes. Muitos homens no movimento revolucionário pensavam que as manifestações do Dia Internacional da Mulher eram prematuras e que as trabalhadoras deviam esperar que os trabalhadores qualificados estivessem prontos para empreender a ação decisiva. Foram as militantes femininas, uma minoria no partido, que advogaram pela convocação de uma reunião de trabalhadoras no bairro de Vyborg, para falar da guerra e da inflação, e foram as ativistas femininas que convocaram uma manifestação contra a guerra no Dia Internacional da Mulher. Uma delas foi Anastassia Deviátkina, uma bolchevique e trabalhadora industrial que, depois da Revolução de Fevereiro, criou um sindicato de esposas de soldados.

Depois de fevereiro, as mulheres desapareceram quase totalmente da crônica como parte integrante do desenvolvimento da revolução ao longo de 1917, apesar de algumas revolucionárias destacadas como Alexandra Kollontái, Nadeshda Krúpskaia e Inessa Armand, citadas tanto por sua vida privada como esposas e amantes como por sua atividade prática e suas colaborações teóricas.

Nos órgãos administrativos surgidos das cinzas do czarismo quase não havia mulheres. Algumas estavam presentes em conselhos municipais, como delegadas da Assembleia Constituinte ou deputadas de um soviete. Os comitês de fábrica estavam dominados por homens, inclusive em centros onde a maioria da planta era composta por mulheres. Os motivos disso eram duplos e estavam relacionados: as mulheres ainda tinham a tarefa de alimentar as suas famílias em circunstâncias difíceis e careciam de confiança e educação, e também de tempo para dar um passo adiante ou se comprometer muito mais nas atividades políticas. A vida que levavam as trabalhadoras na Rússia ao longo de séculos, a realidade material de sua opressão, condicionavam sua capacidade de compatibilizar o aumento indiscutível de sua consciência política com o compromisso político.

Antes de 1917, a Rússia era uma sociedade predominantemente camponesa. A autoridade absoluta do czar estava consagrada, era reforçada pela Igreja e se refletia na instituição da família. O matrimônio e o divórcio estavam submetidos ao controle religioso: as mulheres eram subordinadas legalmente, consideradas uma propriedade, subumanas. Provérbios russos comuns incluem expressões como esta: “pensava que via duas pessoas, mas não era mais que um homem com sua mulher”. O poder do homem dentro do lar era absoluto e se esperava da mulher que fosse passiva em condições brutais, entregada pelo pai ao marido e constantemente vítima de violência autorizada. As mulheres camponesas e trabalhadoras enfrentavam castigos e trabalhos pesados nos campos e nas fábricas, com a importante carga extra do cuidado dos filhos e as responsabilidades domésticas numa época em que os partos eram difíceis e perigosos, não existiam os anticoncepcionais e a mortalidade infantil era elevada.

Entretanto, a implicação política das mulheres em 1917 não veio do nada. A Rússia era uma contradição: paralelamente à profunda pobreza, a opressão e a tirania sofrida pela maioria das pessoas, a economia russa esteve no auge durante as décadas anteriores a 1905. Enormes fábricas modernas produziam armas e roupa, as ferrovias conectavam as cidades em rápido crescimento e os investimentos e técnicas da Europa deram lugar a fortes aumentos na produção de ferro e petróleo. Estas drásticas mudanças econômicas geraram uma imensa transformação social nos anos que precederam a primeira guerra mundial: cada vez mais mulheres camponesas foram trabalhar nas fábricas das cidades, empurradas pela pobreza e estimuladas por empresários que, graças à mecanização, geravam mais postos de trabalho não qualificado e cuja preferência por uma mão de obra dócil deu lugar a um enorme aumento do número de mulheres empregadas na produção de linho, seda, algodão, lã, cerâmica e papel.

Muitas mulheres participaram das greves do setor têxtil em 1896, em manifestações contra Guerra Russo-Japonesa e, sobretudo, na revolução de 1905, durante a qual trabalhadoras não qualificadas de fábricas têxteis, alimentícias e de tabaco, junto com empregadas domésticas e lavadeiras, fizeram uma greve e tentaram criar seus próprios sindicatos, num cenário de revolta massiva. O efeito da I Guerra Mundial contribuiu decisivamente para o aumento do peso econômico e político das mulheres. O conflito destroçou as famílias e alterou completamente a vida das mulheres. Milhões de homens foram convocados para ir à frente de batalha, muitos foram feridos ou morreram, obrigando as mulheres a lavrar os campos, sustentar os lares e trabalhar nas fábricas. As mulheres representavam 26,6 % da mão de obra em 1914. Três anos depois já eram quase a metade (43,4 %). Sua proporção aumentou drasticamente inclusive em empregos qualificados: se em 1914 só representavam 3 % da mão de obra na indústria metalúrgica, em 1917 a cifra aumentou a 18 %.

Na situação de poder instaurada pela Revolução de Fevereiro, as ações de mulheres não cessaram, mas passaram a formar parte do processo que supôs a perda do apoio da classe operária por parte do governo a favor do soviete e, no interior deste, por parte da direção socialista moderada dos mencheviques e socialistas revolucionários a favor dos bolcheviques no mês de setembro.

A esperança da classe operária de que sua vida melhoraria com a queda do czar se viu frustrada pelo governo e a direção do soviete, que decidiram continuar a guerra. Em maio, as manifestações anti guerra forçaram a queda do primeiro governo provisório formado por uma coalizão dos dirigentes mencheviques e socialistas revolucionários dos sovietes com os liberais. A frustração dos trabalhadores e das trabalhadoras deu lugar a novas greves, encabeçadas novamente por mulheres. Cerca de 40 mil lavadeiras ligadas a um sindicato dirigido pela bolchevique Sofia Gonchárskaia se declararam em greve por um aumento salarial, a jornada de oito horas e a melhora das condições de trabalho: medidas de higiene e saúde, prestações de maternidade – muitas trabalhadoras ocultavam sua gravidez até que davam à luz na fábrica – e o fim do acosso sexual.

Junto com outras ativistas do sindicato, Gonchárskaia foi de uma lavanderia a outra convencendo as mulheres a se unir à greve. Encheram baldes d´água fria para apagar as estufas. Numa lavanderia, o proprietário chegou a atacar Gonchárskaia com uma alavanca, mas ela foi salva pelas colegas que o agarraram por trás.

Em agosto, devido às tentativas do general Kornílov de esmagar a revolução, as mulheres se reuniram para defender Petrogrado, construindo barricadas e organizando a assistência médica. Em outubro, mulheres do partido bolchevique participaram na prestação de assistência média e nas cruciais comunicações entre localidades – algumas eram responsáveis por coordenar o levantamento em distintas zonas de Petrogrado, e também havia mulheres na Guarda Vermelha.

Também havia uma condutora de bonde, se chamava Rodiónova e havia escondido 42 rifles e outras armas na garagem quando o governo tentou desarmar os trabalhadores após as jornadas de julho. Em outubro ela se encarregou de assegurar que dois bondes com metralhadoras saíssem da garagem para assaltar o Palácio de Inverno. Teve que assegurar que o serviço de bondes funcionaria durante a noite de 25 a 26 de outubro para contribuir com a tomado do poder e comprovar a situação dos postos da Guarda Vermelha em toda a cidade.

A trajetória da revolução também criou uma fissura entre as trabalhadoras – para elas, a guerra era a causa dos seus problemas e os apelos em nome da paz se intensificaram na medida em que avançava o ano – e as feministas, que seguiam apoiando o derramamento de sangue. Para a maioria das feministas liberais de classe alta, que defendiam a igualdade perante a lei, no ensino e na reforma social, essas conquistas se obteriam mostrando-se leais ao novo governo e apoiando o esforço da guerra. As mostras de patriotismo formavam parte da tentativa de obter um assento junto à mesa. A Revolução de Fevereiro relançou a batalha das feministas pelo sufrágio universal, que supunha um importante passo adiante quando foi aprovado, em julho. Entretanto, para a maioria das mulheres o direito a voto não fazia grande diferença em suas vidas, que seguiam submetidas à escassez, às longas jornadas de trabalho e à luta por manter a família unida. Tal como havia escrito Alexandra Kollontái em 1908: “por mais radicais que pareçam as reivindicações das feministas, não se deve perder de vista o fato de que elas não podem, devido à sua posição de classe, lutar por mudanças fundamentais na estrutura econômica e social contemporânea sem a qual a liberação das mulheres não pode ser completa.

Para a maioria das mulheres trabalhadoras e camponesas, as questões de opressão e igualdade não se planteavam de forma abstrata, e sim surgiam concretamente do processo de luta pela melhora de suas vidas e das vidas dos seus homens e filhos. As que se politizaram abertamente e adquiriram confiança, muitas vezes como filiadas ao partido bolchevique, o fizeram a partir de sua própria ação coletiva contra a guerra e os políticos, ação que se centrava na luta contra a fome, a guerra e pela propriedade da terra. Robert Service lembra que o programa político bolchevique “parecia cada vez mais atrativo para a massa de trabalhadores, soldados e camponeses, enquanto se agravava a agitação social e a ruína econômica do país alcançava o clímax no outono”. Mas só com isso não poderia se fazer uma revolução em outubro.

Este processo incluiu tanto trabalhadoras, camponesas e esposas dos soldados, além dos homens. Sem o apoio da massa da mão de obra não qualificada em Petrogrado, a qual era composta em sua maioria por mulheres, a insurreição de outubro não teria triunfado. O apoio aos bolcheviques não foi cego, e sim o resultado, em palavras de Trotsky, de “um desenvolvimento cauteloso e doloroso da consciência” de milhões de trabalhadores, homens e mulheres. Até outubro, se havia tentado de tudo: a traição do governo e dos mencheviques, as manifestações trazendo repressão e escassos avanços, que já não satisfaziam as esperanças de uma vida melhor. A tentativa de golpe de Kornílov colocou as coisas em seu lugar: ou eles iriam até o final, ou seriam esmagados. Um trabalhador expressou desta maneira a situação: “os bolcheviques sempre havia dito que `não somos nós que os convenceremos, e sim a própria vida´. E agora os bolcheviques triunfaram porque a vida demostrou que sua tática era a correta”.

Foi um mérito dos bolcheviques levar mais a séria a participação das mulheres. Apesar de que, visto hoje, as mulheres ainda estavam sub representadas, elas dedicaram grandes esforços à organização e formação das trabalhadoras. O fato de que os bolcheviques fizeram mais outros partidos socialistas para incluir as mulheres não se devia necessariamente a um maior compromisso com os direitos das mulheres. Tanto mencheviques quanto bolcheviques eram conscientes da necessidade de trabalhar com as mulheres como parte da classe operária, mas os bolcheviques souberam integrar a luta pela igualdade entre homens e mulheres numa estratégia baseada na ação de classe contra o governo e a guerra, enquanto os partidos que defendiam a continuação da guerra não podiam fazer muito mais além de informar das greves das mulheres e falar dos direitos políticos, sem poder oferecer nenhuma solução concreta à pressão material que as mulheres sofriam.

Os bolcheviques impulsaram cada vez mais a organização e politização das mulheres, em parte porque aprenderam desde o começo explosivo de fevereiro e em parte graças à tenacidade de suas próprias filiadas. Destacadas mulheres bolcheviques como Kollontái, Krúpskaia, Armand, Konkordiya Samoilova e Vera Slútskaia, entre outras, levaram tempo batalhando porque o partido dedicou um esforço especial à organização das trabalhadoras e ao desenvolvimento de sua educação política. Lutaram por convencer seus camaradas masculinos de que as mulheres trabalhadoras tinham uma importância crucial e não eram “um elemento passivo, conservador e atrasado que obstaculizava a revolução”. O periódico bolchevique Rabotnitsa (Trabalhadora), publicado pela primeira vez em 1914 e relançado em maio de 1917, continha artigos sobre a importância das creches e de uma legislação que melhorasse as condições de segurança nos postos de trabalho das mulheres, e repetidamente destacava a necessidade de haver igualdade, e que as questões das mulheres deveriam ser vistas como um problema de todos os trabalhadores.

O papel desempenhado pelas mulheres em fevereiro e sua atividade como parte da classe operária de Petrogrado contribuíram a uma mudança no ponto de vista de muitos homens bolcheviques, que achavam que aceitar algumas demandas das trabalhadoras ajudava à causa das feministas, as quais mantinham o discurso de que de que a revolução era dirigida pelos trabalhadores (homens) mais qualificados e politicamente conscientes. Entretanto, foi uma batalha árdua até que Kollontái propôs, em abril, uma seção de mulheres dentro do partido: quase ninguém deu ouvidos a ela, apesar de contar com o apoio de Lenin, cujas Teses de Abril não foram recebidas com muito entusiasmo pela direção bolchevique. Aliás, Kollontái foi a única que apoiou Lenin no comitê central.

Nos meses seguintes, todavia, ficou claro que tanto os argumentos de Lenin sobre a relação entre a revolução e o poder dos sovietes como a postura de Kollontái sobre a importância das mulheres trabalhadoras se derivavam da dinâmica da revolução e poderiam ser um avanço para a mesa. A imprensa bolchevique, e não somente o Rabotnitsa, afirmava agora que as atitudes machistas arraigadas punham em risco a unidade da classe trabalhadora, e o partido trabalhou  para que as mulheres estivessem representadas nos comitês de fábrica, criticou as atitudes dos homens que consideravam as mulheres como uma ameaça e tentou convencer os homens a votar pelas mulheres – especialmente em setores onde elas eram a maioria – e as respeitassem como companheiras de trabalho, representantes e camaradas.

Seis semanas depois da Revolução de Outubro, o matrimônio eclesiástico foi substituído pelo registro civil e o divórcio se concedia a pedido de qualquer mesmo do casal. Essas medidas foram incluídas um ano mais tarde no Código de Família, que declarou as mulheres iguais perante a lei. Se aboliu o controle religioso, pondo fim de uma vez a séculos de opressão institucionalizada: qualquer membro do casal podia pedir o divórcio sem ter que dar nenhuma justificação. As mulheres tinham direito a administrar seu própria dinheiro e nenhum membro do casal tinha direito sobre a propriedade do outro. Se erradicou o conceito de ilegitimidade: se uma mulher no sabia quem era o pai, de outorgava a responsabilidade coletiva sobre o filho a todos aqueles que haviam mantido previamente relações sexuais com ela. Em 1920, a Rússia foi o primeiro país em legalizar o aborto a pedido da mulher.

A revolução de 1917 foi iniciada e conformada por mulheres, e no decorrer daquele ano elas colocaram em xeque muitos preconceitos arraigados na sociedade, muitos dos quais conseguiram eliminar, mudando a percepção dos que as consideravam inferiores, ou uma propriedade, passivas, atrasadas, conservadoras, não confiáveis, frágeis. E isso foi conquistado graças à ação e ao compromisso político de muitas mulheres. Entretanto, a Revolução Russa não aboliu a dominação masculina nem liberou as mulheres: as privações catastróficas da guerra civil e as conseguintes distorções do governo soviético impediram. As desigualdades se mantiveram. Poucas mulheres ocuparam postos de autoridade, poucas foram eleitas para órgãos administrativos e as ideias machistas não podiam desaparecer do nada, assim como as condições extremamente adversas.

Durante a revolução, as mulheres não participaram em pé de igualdade com os homens nem contribuíram tão significativamente com os níveis superiores do processo político, mas dentro das limitações impostas pela vida elas desbordaram as expectativas e determinaram boa parte do sucesso da revolução. Como dizem McDermid e Hillyer: “a divisão do trabalho entre mulheres e homens se manteve, mas em vez de concluir que as mulheres fracassaram na hora de combater o domínio masculino, poderíamos entender como elas manobraram dentro de sua esfera tradicional e o que isso significava para o processo revolucionário”.

As mulheres foram parte integrante da revolução de 1917, fazendo história junto com os homens, não como espectadoras passivas ou nulidades políticas, mas sim como participantes valiosas cujo compromisso foi mais significativo para o fim da opressão arraigada. Ver a revolução com os olhos das mulheres nos proporciona uma leitura mais rica do que ainda hoje é o momento histórico mais transformador para a vida das próprias mulheres.

Artigo colhido no sítio https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Direitos-Humanos/As-mulheres-de-1917/5/39043

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