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Por 23:07 Sem categoria

Somos todos trabalhadores

Viviane Tavares – Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz)
Nesse último 1º de maio comemoramos 70 anos da CLT, mas ainda não reconhecemos os trabalhadores que ficaram de fora dessa conquista.

“Os preceitos constantes da presente Consolidação salvo quando for em cada caso, expressamente determinado em contrário, não se aplicam : a) aos empregados domésticos, b) aos trabalhadores rurais; c) aos funcionários públicos da União, dos Estados e dos Municípios e aos respectivos extranumerários em serviço nas próprias repartições; d) aos servidores de autarquias paraestatais”. O artigo 7º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) já mostra que nem todos os trabalhadores podem ter os mesmos direitos. E a realidade de hoje aponta que essa conquista ainda está longe de ser alcançada.

O economista Marcio Pochmann avalia que uma das justificativas dessa distinção é que a natureza do trabalho é diferente, como é o caso dos trabalhadores domésticos. “Uma coisa é o trabalho dentro de uma atividade econômica, em uma estrutura que visa o lucro. Outra é o trabalho dentro de uma estrutura familiar, que não visa o lucro de maneira geral. A CLT seria uma preocupação com a classe trabalhadora submetida a subordinações privadas, mercantis, atreladas ao lucro, então, as formas de trabalho à margem deste conceito não foram incorporadas, como o trabalho autônomo, o consultor, entre outros”, explica.

Com condições de trabalho precárias e pouco reconhecimento por parte do Estado, os trabalhadores domésticos e rurais são, entre os que ficaram de fora, os que passam por uma situação mais grave, segundo a avaliação do professor titular da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Ricardo Antunes que lembra daqueles que vêm aparecendo como os pessoas jurídicas (PJ), contrato temporário, home office, entre outros. O caso dos trabalhadores domésticos está na pauta da discussão nestes últimos tempos. Após a aprovação, há exato um mês (2 de abril), da Emenda Constitucional 72/13 , mais conhecida como PEC das Domésticas, estabeleceu-se a igualdade de direitos trabalhistas entre os trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores. Mas a reação tomou proporções enormes por parte do patronato e parlamentares que não acharam viável a garantia desses direitos, entre eles, o pagamento de hora extra, a determinação da jornada de trabalho e férias, entre outros. Ricardo Antunes explica que esta reação se dá por um passado escravocrata, que até hoje não foi apagado da memória. “É uma primeira abolição porque, pelo menos, os trabalhadores terão direito de ir à justiça exigir os seus direitos se eles não foram bancados no espaço do emprego doméstico. É por isso que eu sou contra a vigência do legislado sobre o negociado, porque cada um negocia para si e isso perde a ideia do conjunto”, diz.

No artigo “A revolta da sala de jantar “, publicado na Folha de São Paulo no caderno Aliás, Ricardo Antunes explica a origem do trabalho doméstico. “Como o assalariamento industrial excluiu a força de trabalho negra das fábricas (preterida em favor dos imigrantes brancos), formou-se um bolsão excedente de trabalho ex-escravo que encontrou acolhida no trabalho doméstico. E, como um prolongamento da família senhorial, manteve-se as vantagens da era serviçal. Agora, os ‘de cima’, para recordar Florestan Fernandes, estão novamente alvoroçados com a ampliação de direitos dos ‘de baixo’. Algo lhes incomoda neste avanço plebeu”, explica no artigo.

Marcio Pochman compreende a reação dos empregadores, mas defende que a lei seja colocada em prática. “Somos uma país com sete milhões de trabalhadores domésticos, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). A tentativa de fazer com que as famílias passem a operar do ponto de vista do emprego da mão de obra como se fosse uma unidade empresarial, é algo que será necessitado agora. Por isso, as reações possíveis. É interessante lembrar também que o fato de ter leis não implica em mudança da realidade. O Brasil é um país que tem leis, mas estas não pegam”, analisa o economista.

Trabalhadores rurais

Os trabalhadores rurais tiveram seus direitos conquistados pela Lei nº 5.889/73 , regulamentada pelo Decreto nº 73.626/74 , e no artigo 7º da Constituição Federal/88, mas também sofrem para colocá-los em prática. Dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) mostram que, de 1995 a 2012, foram libertados 44.230 trabalhadores rurais no Brasil e estima-se que outros 25 mil ainda são vítimas da escravidão. A contratação sazonal, ou seja, o contrato por tempo determinado, a falta de qualificação e a ausência de proteção previdenciária são problemas que grande parte dos trabalhadores rurais ainda enfrentam. No total, são mais de 15,7 milhões de trabalhadores rurais no Brasil, de acordo com dados de 2009 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

“A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) também compreende que são necessárias outras ações do Estado para garantir a efetiva melhoria das condições de vida e trabalho no campo, dentre os quais as ações de fiscalização pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) das relações de trabalho no meio rural, a construção de uma Política Nacional de Controle e Uso de Agrotóxicos no Brasil e um conjunto de medidas e de envolvimento das partes e da sociedade na busca de garantias do direito desses trabalhadores e trabalhadoras”, diz o documento apresentado pela Contag aos trabalhadores.

Servidores públicos

Menos atacados por serem protegidos pela Lei 8.112/02 – regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais -, mas não longe de serem vítimas de direitos trabalhistas, os servidores públicos também têm diversas pautas a serem conquistadas. Entre elas, a manutenção do direito de greve (Veja a matéria da Poli 26 ), salário com reajustes de acordo com a inflação e condições de trabalho favoráveis. Exemplo desta última demanda pode ser visto no documentário ‘Saúde não é um experimento ‘, produzido pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário (SINPAF) e divulgado nesta última semana, durante a Plenária Sindical, realizada no dia 25 de abril. O filme mostra as condições de trabalho encontradas por trabalhadores de empresas brasileiras de pesquisa e desenvolvimento agropecuário. Entre os depoimentos do documentário, está o do assistente de pesquisa em campo experimental da Embrapa, Iracindo Silveira, que trabalhou 30 anos em contato com produtos químicos e usou por muito tempo sonda de nêutrons, equipamento com fonte radiativa para medir a umidade do solo. “Estou com um tumor e eu não sei o que aconteceu, de onde surgiu esse tumor, mas ele está lá. Trabalhei minha vida inteira no campo, aplicando veneno direto e, indiretamente, utilizava uma sonda de nêutrons. A própria pessoa que nos emprestava essa sonda deixou de usar porque ela tinha vazamento. Hoje, além de estéril, eu me sinto me sinto impotente. Esse trabalho me fez perder as forças, perder o tato, não consigo falar direito. Hoje, depois de 30 anos de Embrapa, estou mutilado por algumas coisas que eu nem sei o que são”, diz no depoimento do filme.

Notícia colhida no sítio http://www.epsjv.fiocruz.br/index.php?Area=Noticia&Num=743

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