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O Estado brasileiro é raquítico, então, necessitamos de políticas públicas que conduzam o país ao desenvolvimento

O Brasil de Pochmann

Há todo um Brasil por conhecer, para além das diatribes ideológicas. Mas é difícil chegar ao conhecimento, pois como dizia canção magistralmente interpretada por Elis Regina, “o Brzil não conhece o Brasil, o Brzil nunca foi ao Brasil”… (“Querelas do Brasil”, de Maurício Tapajós e Aldir Blanc).

A entrevista do professor Márcio Pochmann, da UNICAMP, à Carta Maior, por ocasião de sua nomeação como presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) dá o que pensar como referência sobre a magnitude e o desafio de encarar a “esfinge Brasil”.

O que mais ressalta da entrevista é que, em termos de senso comum, há todo um vasto Brasil por se conhecer e se reconhecer. Tornaram-se lugares comuns dos mais encontradiços mídia a fora e a dentro expressões como “este não é um país decente”, “se este país fosse sério”, e por aí se vai.

Essas expressões se avolumaram desde que a campanha contra a reeleição de Lula não deu certo em 2006. Perplexos, “formadores de opinião” descobriram que, ao invés do lago em julgavam precipitar suas jóias, viviam à beira de um copo dágua onde lançavam analgésicos auto-dissolventes para os que não queriam acreditar no que estavam vendo ou ouvindo: que o povão ia por outro rumo que o pretendido, e conscientemente.

Há um marterlar contínuo na tecla de que o “país está pior do que estava”. Esse “pior” pode ter arrimo na segurança, onde sem dúvida as tarefas são gigantescas, na corrupção, com a afirmação de que “este é o governo mais corrupto da nossa história”, ou nas crises do momento, como a da aviação, conscientemente apelidada pelos conservadores como “apagão aéreo”.

Mas há um outro Brasil que vai medrando silenciosamente (até por conivência do governo, que tradicionalmente anuncia mal o que faz), longe deste “Brzil” que se empolga com a rive gauche do Sena ou do Tâmisa, alguns do Spree (em Berlim), e desqualifica sistematicamente as margens do Ipiranga… como habitadas , para tais olhares, por alguma forma muito semelhante à da humanidade mais ainda assim algo diferente dela. Como se os homo sapiens habitassem do Trópico de Câncer para o Norte, e abaixo só restasse espaço para os neandertais (exceto se forem da Austrália ou da Nova Zelândia).

Estudos consistentes do IPEA que o professor e nosso colega de Carta Maior Márcio Pochmann, liderados pelo pesquisador Sergei Soares, por Ricardo Paes de Barros, com o concurso de outros pesquisadores, vêm demonstrando (ver o portal do IPEA e da UNICAMP) que os índices de desigualdade vêm caindo no Brasil. Não só isso: como no México, uma parte substancial dessa redução da desigualdade se deve a políticas de transferência como o Bolsa Família. As estimativas são de que a pobreza se reduziu de 21 a 28% nos últimos anos. E não só no governo Lula, se esclareça, ainda que neste a redução tenha se acelerado devido ao aumento da abrangência dos programas de transferência e à política de recuperação do salário mínimo. Também as estimativas sobre o papel do Bolsa Família nessa redução varia, mas o reconhecimento de que o programa foi fundamental é de consenso, como também no caso do México.

Não dá para dizer que entramos de vez num círculo virtuoso de crescimento sustentável. Mas dá para dizer que um dos trabalhos do professor Pochmann vai ser o de continuar descortinando esse Brasil insuspeito para os eternos coveiros do amanhã, como o IPEA vem fazendo.

Por Flávio Aguiar – Carta Maior.
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“O Estado brasileiro é raquítico”

O professor Márcio Pochmann, da Unicamp, assume nesta quarta-feira (15) a presidência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Colaborador assíduo da Carta Maior, Pochmann concedeu entrevista a Flávio Aguiar. Para ele, o Estado brasileiro, ao contrário do que prega o conservadorismo, “é raquítico” e não tem condição de gerir o país do jeito que está.

SÃO PAULO – Toma posse hoje (15/08), às 16 horas, em cerimônia transmitida pela rede NBR e pela internet na página do IPEA, o novo presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o professor Márcio Pochmann, da UNICAMP, e colaborador assíduo da Carta Maior.

Em entrevista à Carta Maior, o novo presidente do IPEA, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Márcio Pochmann, afirma que sua prioridade “é o Brasil, sua complexidade e sua diversidade”. Também afirma que o Estado brasileiro, ao contrário do que prega o conservadorismo da mídia e dos partidos à direita, “é raquítico” e não tem condição de gerir o país do jeito que está. Para ele, o único momento em que o Brasil, ao longo de sua história, revelou alguma pujança econômica e administrativa foi no ciclo que começou com a Revolução de 1930 e terminou em 1980. Nestes 50 anos o Brasil tornou-se um país moderno, com instituições modernas.

O IPEA é um órgão do governo federal, responsável pela coleta de dados em séries históricas, abrangendo dados macroeconômicos e regionais, balanço de pagamentos, câmbio, comércio exterior e interno, contas nacionais, emprego, estoque de capital, finanças, indicadores sociais, moeda e crédito, população, preços, salário e renda, transportes, entre outros. Algumas dessas séries recuam até 1940. As mais procuradas são as da série inflacionária, da balança comercial, da dívida interna e do setor público, e os índices gerais de preços. Segundo a página do órgão, hoje sediado na Secretaria de Planejamento de Longo Prazo (cujo ministro é o professor Mangabeira Unger), o objetivo do IPEA é descrever “o estado de uma nação”, isto é, o Brasil. A seguir, a entrevista do professor e nosso colaborador Márcio Pochmann.

CM – Três prioridades para o IPEA.

Márcio Pochmann – A primeira é o Brasil, sua complexidade, sua diversidade. A segunda é abrir um diálogo sobre o futuro…

CM – Na sua visão, isso quer dizer que o Brasil tem um futuro…

MP – Claro. Somos um país em construção. A terceira é a re-inserção do Brasil no mundo.

CM – Como assim?

MP – Na nova divisão internacional do trabalho o Brasil fica com a execução e não com a concepção.

CM – Um exemplo?

MP – Ao Brasil cabe a produção de produtos primários, de baixo valor agregado, com salários de padrão asiático.

CM – O que é um “padrão asiático de salários”?

MP – Valor baixo, longa jornada de trabalho, alta rotatividade.

CM – Seria o caso do etanol?

MP – O etanol vai se tornar a principal matriz energética do século XXI. Pode-se recolocar o Brasil no mundo, se isto impulsionar a agricultura familiar, a distribuição de renda. Ou se pode fazer de outro modo, o brasileiro tradicional, com 200 fazendas, 200 famílias, o país excludente de sempre, apenas agro-exportador. Como sempre.

CM – O Brasil está condenado a este modelo excludente?

MP – O Brasil só diferiu deste modelo entre 1930 e 1980. Nestes 50 anos o Brasil mudou sua inserção na economia mundial. Mudou seu padrão de produção, graças à industrialização. Deixou de ser uma grande fazenda para ser a 8ª economia do mundo. Estruturou uma sociedade moderna com base no assalariamento e na valorização do trabalho, ainda que tudo isto tenha seguido padrões muito longe de serem o ideal.

CM – Nesta acepção, o que é uma “sociedade moderna”?

MP – O Brasil constituiu instituições, sindicatos, organizando o interesse de trabalhadores e patrões. Construiu um Estado com capacidade de intervenção num país continental.

CM – Isso põe em tela o papel do Estado.

MP – O país tem um Estado raquítico. Apenas 8% da mão de obra ocupada pertence ao Estado. Nos Estados Unidos, são 18%. Na Europa, 25%. Na Escandinávia, 40%. Espanha e Portugal tem cerca de 20%.

CM – Que problemas isto acarreta?

MP – Um dos problemas do PAC é a capacidade de administração, de gestão. Faltam quadros para isso.

CM – O que fazer?

MP – Nossa proposta é discutir o desenvolvimento do país, não só o crescimento econômico. Isso implica discutir educação, saúde, serviços, ciência e tecnologia, cultura, só para começar.

CM – Muito obrigado, professor, parabéns e boa sorte.

MP – Muito obrigado.

Por Flávo Aguiar – Carta Maior.

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