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Por 13:28 Sem categoria

Sobre a estabilidade da economia

Pesquisa Estado/Ipso, publicada na edição do Estadão de 16 de setembro último, em plena ebulição provocada pelo estouro da bolha imobiliária americana, deve ter levado espanto e confusão aos arraiais tucanos. Ela revelou que para 67 % dos brasileiros o presidente Lula é responsável pela estabilidade da economia e que apenas 7% consideram que este mérito pertence a FHC.

Pior que isso, informa Alberto Carlos Almeida, diretor da “Ipso Public Affairs”, para 80% dos brasileiros o atual presidente deu mais apoio aos pobres; o antecessor ganhou o aval de apenas 9%. Para 73%, Lula favoreceu melhor o poder de compra dos brasileiros; só para 16% FHC foi melhor neste quesito. Lula reduziu mais o custo da cesta básica para 73%, o ex-presidente, só para 15%. Lula controlou melhor a inflação para 66%; FHC, só para 19%.

Alberto Carlos Almeida sugere que estes números catastróficos se explicam pelo fato de que os diabólicos petistas inventaram e repetiram infinitas vezes o discurso da herança maldita. E os pobres tucanos foram incapazes de comunicar ao povo, nas eleições de 2002 e de 2006, as grandes realizações do governo FHC.

Esta explicação trôpega depõe contra a eficácia dos meios de comunicação que, em sua esmagadora maioria, movem contra o presidente Lula e contra o PT uma campanha intensa de demonização e desqualificação. Creio inclusive que a prudência sugere aos tucanos que procurem outros meios para se comunicar com o povo, porque os que estão aí fracassaram completamente.

Uma outra hipótese para explicar tanta insensibilidade aos encantos e realizações dos tucanos é que o povo, antecipando-se aos conselhos do ministro Guido Mantega, já teria começado a se informar através da imprensa estrangeira. Confirmada esta hipótese, caberia aos tucanos enquadrar os editores de publicações como The New York Times, The Economist, El Pais, Le Monde etc., que não se cansam de tecer loas à economia do Brasil.

Outra forma de encarar nossa história recente seria ouvir vozes dissonantes. Dia desses, Luciano Coutinho, presidente do BNDES, disse que a estabilidade proporcionada pelo Plano Real “foi extremamente precária” e “vulnerável” às crises cambiais que culminavam em pressões inflacionárias e, conseqüentemente, em aumento da taxa de juros. Para Coutinho, a “verdadeira” estabilização da economia brasileira ocorreu a partir de 2005, com o crescimento das exportações, do saldo do balanço de pagamentos e das reservas internacionais.

Lamentavelmente, Luciano Coutinho padece de vício insanável. Ele participa do governo Lula. É, portanto, suspeito e dificilmente seria ouvido pelos tucanos.

Existem, no entanto, analistas mais próximos do ninho. A leitura de “Desenvolvimento e Crise no Brasil – História, Economia e Política de Getúlio Vargas a Lula” – (Luiz Carlos Bresser Pereira) poderia ser edificante, até mesmo para um tucano, já que Bresser Pereira foi ministro de FHC.

No livro acima referido, fazendo um balanço da era FHC, Bresser Pereira, colocando sua reputação acadêmica acima das contingências políticas, sustenta: “Seu governo, entretanto, não ficará na história como o grande governo que poderia ter sido porque deixou a desejar no plano gerencial, como a crise da energia de 2001 demonstrou, e principalmente porque fracassou no plano econômico. Não apenas porque não logrou retomar o desenvolvimento: na verdade, não chegou a estabilizar macroeconomicamente o país, de forma que deixou uma herança pesada para o futuro governo em termos de altas dívidas – interna, ou do Estado, e externa, ou do país – e de altos déficits – público ou do Estado, e externo, ou da nação. Dívidas e déficits que se espelham nas mais altas taxas de desemprego que o país já teve” (págs. 335 e 336).

Antes de emitir este veredicto condenatório, Bresser tinha registrado: “Quatro anos depois, em meio a uma crise econômica grave que só foi evitada graças ao socorro do FMI, o presidente foi reeleito. Imediatamente deixou flutuar o câmbio, e o país pareceu voltar em direção ao equilíbrio econômico e, possivelmente, à retomada do desenvolvimento. Quatro anos depois, o que vimos? O país novamente em crise de balanço de pagamentos e novamente socorrido pelo FMI” (pág. 334).

Delfim Neto economizaria toda essa peroração. Ele costuma resumir este assunto numa frase simples: “FHC passará à história como o único presidente que quebrou o Brasil duas vezes”. Por outro lado, precisamos relevar que Bresser Pereira é amigo de FHC, daí a suavidade de suas críticas. Fosse de outra forma, ele não deixaria de registrar que a desvalorização do Real foi uma imposição do mercado, não foi um ato de audácia, foi feita com muito atraso e não precisava ter sido vazada.

Mas justiça seja feita, em outra passagem Bresser Pereira sugere a natureza criminosa da valorização administrada e artificial do Real. Com efeito, na página 362, ele afirma: “Esta política interessava aos países ricos, que assim viam justificados seus grandes superávits comerciais, interessava aos bancos internacionais que podiam emprestar a elevadas taxas de juros aos países emergentes, e interessava às autoridades locais na medida em que ali havia um elemento populista – o populismo cambial – suficientemente disfarçado para contar com o apoio do FMI.”

Ainda para contrariar os tucanos, Bresser Pereira trata do efeito Lula sobre a última crise cambial da era FHC. Neste item sublinha: “Por que a crise cambial? Procurou-se explicar o fato com a subida de Lula nas pesquisas eleitorais. Entretanto, o candidato do PT já estava com intenções de voto superiores a 30% muito antes de a crise se desencadear. Na verdade, desde as eleições municipais de outubro de 2000, quando o PT alcançou ampla vitória, principalmente nas grandes cidades, estava claro que a probabilidade de eleição de um candidato de esquerda era muito grande.”

Neste campo, caberia apenas acrescentar que o terrorismo de mercado vigente na época e amplamente difundido pela imprensa, com a intenção de prejudicar a candidatura Lula, não alcançou seus objetivos. O eleitorado incorrigível preferiu ignorar as cassandras do couro: “É Serra ou o Caos”.

Diante do exposto, resta expressar a esperança de que Ali Kamel não proponha a censura do livro de Bresser Pereira, utilizado na elaboração deste artigo, e que os tucanos não enveredem para a solução “brechtiana” de dissolver o povo, que está implícita na fala de quem invoca o espírito de Carlos Lacerda para derrotar o PT.

O povo que viveu na pele todas as peripécias econômicas aqui relatadas tem discernimento e quando chamado a se pronunciar sabe fazê-lo com sabedoria, mesmo quando a maioria dos meios de comunicação se esforça para criar confusão e difundir desinformação.

Por Ricardo Berzoini, que é presidente nacional do PT e deputado federal por São Paulo.

ARTIGO COLHIDO NO SÍTIO www.pt.org.br.

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