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Lula, Dilma e o futuro do Brasil

Os brasileiros foram decidindo, ao longo dos últimos anos, o tipo de país que queremos. Lula tornou-se o presidente de todos os brasileiros, ancorado em um modelo econômico e social de democratização do país. Reformulou o modelo econômico e o acoplou indissoluvelmente a políticas sociais de distribuição de renda, de criação de emprego e de resgate da massa mais pobre do país. Dilma pretende consolidar essa hegemonia também no plano político.

Mas a questão essencial, aberta, sobre o futuro do Brasil, não se dará nesses planos: o modelo econômico, submetido a difíceis e inevitáveis readequações, será esse, com aprofundamento e extensão das politicas sociais. A possibilidade do governo consolidar sua maioria e de se intensificar e estender a sangria da oposição, é muito grande.

A questão fundamental que decidirá o futuro do Brasil se dá no plano dos valores. Nosso país foi profundamente transformado em décadas recentes. Esgotado o impulso democrático pela frustração de termos um governo que democratizasse o país não apenas no plano político e institucional, mas também nas profundas estruturas injustas e monopólicas geradas e/ou consolidadas na ditadura, sofremos a ofensiva neoliberal dos governos Collor, Itamar e FHC, que não apenas transformaram o Estado e a sociedade brasileiros, mas também os valores predominantes no país.

O resgate no plano da economia e das relações sociais que o governo Lula logrou – e a que o governo Dilma dá continuidade – não afetou os valores predominantes instalados na década anterior. O justo atendimento das necessidades de acesso aos bens e serviços básicos de consumo da massa mais pobre da população foi acompanhada, pela retomada da expansão econômica, pela continuidade e a extensão dos estilos de consumo e dos valores correspondentes gerados no período anterior.

Que valores são esses? Eles se fundamentam na concepção neoliberal da centralidade do mercado em detrimento dos direitos, do consumidor em detrimento do cidadão, da competição em detrimento do justo atendimento das necessidades de todos. É o chamado “modo de vida norteamericano”, que se difundiu com a globalização e com a hegemonia mundial que os EUA conquistaram no final da guerra fria, com o fim do mundo bipolar e sua ascensão a única potencia global.

Trata-se de uma visão do mundo não centrada nos direitos, na justiça, na igualdade, mas na competição entre todos no mercado, esse espaço profundamente desigual e injusto, que não reconhece direitos, que multiplica incessantemente a concentração de riqueza e a marginalização da grande maioria.

A extensão do acesso ao consumo para todos e o monopólio dos meios de comunicação – concentrados em empresas financiadas pelos grandes monopólios privados – favoreceram que as transformações econômicas e sociais não tivessem desdobramentos no plano da ideologia, dos valores, no plano cultural e educativo. No momento em que a ascensão social das camadas pobres da população ganha uma dimensão extraordinária, o tema dos valores que essas novas camadas que conseguem, pela primeira vez, ter acesso a bens fundamentais, fica em aberto que valores serão assumidos por esses setores, majoritários na sociedade brasileira.

Não por acaso setores opositores, em meio a uma profunda crise de identidade, tentam apontar para essas camadas sociais ascendentes como seu objetivo, para buscar novas bases sociais de apoio. E o próprio governo tem consciência que na disputa sobre os valores desses setores ascendentes se joga o futuro da sociedade brasileira.

Há várias questões pendentes, preocupantes, com que o governo Dilma se enfrenta. As readequações da política econômica não conseguiram ainda dar conta da extensão dos problemas a enfrentar: taxas de juros altas e em processo de elevação, desindustrialização, riscos inflacionários, insatisfação com o aumento do salario mínimo – para citar apenas alguns.

Da mesma forma que as condições em que se dão obras do PAC revela como a acelerada busca dos objetivos do plano não levou devidamente em consideração as condições a que as empreiteiras submetem as dezenas de milhares de trabalhadores das obras mais importantes do governo federal. Jirau, Santo Antonio, Belo Monte – são temas que estão longe de ter sido devidamente equacionados.

As mudanças, mesmo se de nuance, na politica externa, suscitam perguntas sobre se a equilibrada formulação de perseguir o respeito aos direitos humanos sem distinção do país, se reflete na realidade, quando inseridas em um mundo extremamente assimétrico, em que, por exemplo, o Irã é denunciado, enquanto os EUA – por Guantánamo – e Israel – pela Palestina – não são tratados da mesma forma. Em que a Líbia é bombardeada, enquanto se trata de maneira diferenciada a países em que se dá o mesmo tipo de movimento opositor, como o Iémen e o Bahrein, para citar apenas alguns casos. Se iniciativas que impeçam que se trate, objetivamente, de dois pesos, duas medidas, não forem tomadas, o equilíbrio que se busca não se refletirá no conflitivo e desequilibrado marco de relações internacionais.

Mas a questão estrategicamente central – mencionada anteriormente – é a questão das ideias, dos valores, da cultura, das formas de sociabilidade. Nisso, as dificuldades na politica cultural (retrocessos, isolamento politico, ausência de propostas, falta de consciência da dimensão da politica cultural no Brasil contemporâneo), na educativa – com a indispensável e estreita articulação entre politicas educativas e culturais – e o seu desdobramento fundamental nas politicas de comunicação, são os elementos chave. Com a integração das políticas sociais – do Bolsa Família às praças do PAC -, das politicas de direitos – dos direitos humanos aos das mulheres e de todos os setores ainda postergados no plano da cidadania plena – deveria ir se constituindo uma estratégica ampla e global para promover e favorecer formas solidárias e humanistas de sociabilidade. Para que estejamos a favor do governo não apenas porque nossa situação individual está melhor, mas porque o principal problema que o Brasil arrasta ao longo do tempo – a desigualdade, a injustiça social, a marginalização das camadas mais pobres – tem tido respostas positivas e sua superação é o principal objetivo do governo.

Foi criada no Brasil uma nova maioria social e politica, que elegeu, reelegeu Lula e elegeu Dilma. Trata-se agora de consolidar essa nova maioria no plano das ideias, dos valores, da ideologia, da cultura. Esse o maior e decisivo desafio, que vai definir a fisionomia do Brasil da primeira metade do século XXI.

Por Emir Sader.

ARTIGO COLHIDO NO SÍTIO www.cartamaior.com.br

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Buldogue do povão?

22 de abril de 2011 às 11:13h

Com Lula, o setor privado beneficiou-se muito mais do que com FHC

As circunstâncias obrigam a um retorno à repisada questão do confronto administrativo entre os ex-presidentes Lula e FHC. Nos últimos dias, os dois voltaram a ser protagonistas no cenário político. O tucano reapareceu assinando artigo, controvertido até mesmo dentro da própria oposição, no qual propõe ao PSDB “desistir do povão” e cortejar o setor social contrário a Lula: o reduzido contingente de ricos e da classe média alta.

Lula entrou de sola em FHC: “Sinceramente, não sei como alguém estuda tanto e depois quer esquecer o povão (…) todos são brasileiros”.

FHC retrucou. Propôs uma nova disputa eleitoral entre os dois. Como se sabe, Lula, esse buldogue do povão, foi derrotado duas vezes por FHC. Em 1994 e 1998. Entretanto, a administração tucana encerrou-se com uma vitória acachapante de Lula, na opinião dos eleitores ouvidos pela pesquisa Sensus. O petista com 87% de aprovação (dezembro de 2010) e o tucano com 34,7% (outubro de 2002).

Esse contraste está justificado no estudo O Emprego Público no Brasil, recém-concluído por Fernando Mansor de Mattos, do Departamento de Economia da Universidade Federal Fluminense e pesquisador do Ipea. A partir desse trabalho, ele comparou, a pedido deste colunista, alguns dados dos governos Lula e FHC.

Entre eles, Mansor de Mattos revela uma grande surpresa para os “privatistas” neoliberais da era tucana. Não houve “inchaço” do setor público no governo Lula. Entre o fim de 1995 e o fim de 2002, último ano do governo FHC, o emprego privado formal com carteira assinada cresceu 3,9% ao ano, em média. Entre 2003 e 2009, penúltimo ano da era Lula, cresceu 5,9%. “No emprego público houve crescimento de mísero 0,02% com FHC, e de 3,72% com Lula”, diz ele.

Vale lembrar que os tucanos tinham como programa desmontar o Estado brasileiro. Reduzi-lo ao mínimo. Os petistas aumentaram a oferta de serviços públicos: cresceu o número de universidades federais e de programas de saúde pública, entre outros. Mesmo assim, o aumento nesse setor, no âmbito municipal, foi maior do que no federal. Mansor de Mattos ainda lembra: “Nas regiões mais pobres do País, ao contrário do que apregoa o senso comum, não há uma proporção maior de funcionários públicos”.

É importante atentar ao seguinte cruzamento de informações: o número de funcionários, em relação ao total de empregados do setor formal, era maior no governo do PSDB. Explica-se: no governo de Lula cresceu o número de empregados do setor público. Mais, inclusive, do que no governo FHC. No entanto, no governo Lula também cresceu e, no caso, cresceu muito mais o total de empregados do setor privado.

Desmonta-se, também, a falácia de que o Estado brasileiro seja desproporcional em tamanho e desmedido na geração de empregos. Os números mostram o contrário. O corpo administrativo do Estado é menor do que as exigências de um país com dimensões continentais. Talvez seja errática a qualidade dos empregos que gera e, certamente, a qualidade do serviço que oferece deixa a desejar. Mas esta é outra história.

Por Maurício Dias, que é jornalista, editor especial e colunista da edição impressa de CartaCapital. A versão completa de sua coluna é publicada semanalmente na revista. mauriciodias@cartacapital.com.br

ARTIGO COLHIDO NO SÍTIO www.cartacapital.com.br

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