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O SUS precisa de Mais Médicos e de Muito Mais!

Nota do Cebes

As manifestações de rua e as consequentes respostas governamentais têm gerado um intenso debate na sociedade sobre as políticas públicas, entre elas, as de saúde. Para o Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (Cebes) o momento é de celebração do aperfeiçoamento e aprofundamento da democracia brasileira. Nossa contribuição nesse debate expõe nossas posições e propostas para o setor da saúde brasileira cotejadas ao Programa Mais Médicos que o governo apresenta como estratégia para atendimento das demandas populares.

É imprescindível reconhecer que a assistência à saúde é dependente dos trabalhadores da saúde e de sua capacidade de produzir o cuidado. Em uma época em que se supervalorizam as máquinas, os exames e a tecnologia, é necessário reafirmar que saúde se faz com gente. Todas as profissões da saúde são fundamentais para uma assistência integral, ou seja, é a equipe de saúde que será capaz de atender e resolver todos os problemas apresentados pela população.

A suficiência quantitativa das equipes de saúde quando bem distribuídas, permitirão o atendimento universal da população residente em todo o território, efetivando o direito constitucional dos brasileiros.

Entretanto, é consenso entre os gestores de todas as esferas do SUS que, entre todas as categorias profissionais da saúde, os médicos são os profissionais mais difíceis de prover nos serviços públicos de saúde.

A população também reconhece esse problema, quando aponta, como mostrou recente pesquisa do IPEA, que o principal problema do SUS é a falta de médicos. Mesmo discordando dessa assertiva que localiza a falta de médicos como principal problema da saúde, o Cebes não pode deixar de reconhecer o que mostram diversos estudos, que faltam médicos no Brasil, e esta falta ocorre principalmente no SUS. Não concordando com a argumentação das entidades médicas que insistem na suficiência de médicos, o Cebes diagnostica a deficiência e má distribuição de médicos como um problema grave.

Por outro lado, ressaltamos que o principal problema do SUS não é a falta de médicos, na verdade mais um dos sintomas do descaso crônico na implantação do projeto SUS, relegado pelos sucessivos governos pós-constitucional ao destino de ser um sistema de baixa qualidade para atendimento da população pobre.

É preciso reafirmar que o principal problema do SUS é a subordinação do setor da saúde à lógica de mercado que se expande sufocando o direito social previsto na Constituição.  Essa lógica de mercado trata a saúde – e a doença – como mercadoria e o crescimento desse mercado como vem ocorrendo no pais faz com que a saúde se distancie dos princípios que orientam o SUS enquanto expressão da saúde como um direito de cidadania.

É preciso analisar as razões pelas quais os médicos não se vinculam ao SUS e não ocupam o vasto território vazio destes profissionais. Nesse sentido, refutamos o argumento de que são apenas as más condições de estrutura e trabalho que explicam a ausência de médicos no SUS. Isso só poderia ser verdade se existisse um contingente de médicos desempregados por recusa de condições insuficientes, o que não existe. Ao contrário, praticamente todos os médicos brasileiros possuem um ou mais empregos como evidenciam os estudos. Outra pesquisa do IPEA, ainda mais recente, mostra que, em média, os médicos brasileiros trabalham 42h por semana e ganham aproximadamente R$ 8.500,00 por mês, o que os coloca no topo de rendimentos entre as profissões de nível superior.

O Brasil vive um boom de crescimento do mercado da saúde e hoje já conta com a presença do grande capital internacional e fundos de investimentos. Esse boom expressa a política concreta que vem sendo praticada de promover e conduzir o setor da saúde ao mercado e se aproveita do resultado da política de inclusão social pautada pela expansão do consumo, tônica da política econômica dos últimos anos.

Essa política de ampliação do consumo, associada à omissão, seja por falta de coragem, ou de tendência na correlação de forças que caracteriza os últimos governos federais que não enfrentam os interesses dos complexos econômicos da saúde (indústria farmacêutica, de equipamentos, planos e seguros privados de saúde, prestadores privados de serviços), e seguem promovendo o crônico subfinanciamento do SUS, criando as condições ideais para a expansão do mercado da saúde. Esta é a principal razão que proporciona a concentração de médicos no setor privado e sua consequente escassez no setor público, e esse modelo saqueia o SUS e gera outras graves distorções na saúde brasileira.

As multidões de brasileiros que foram às ruas em todas as cidades exigindo saúde e serviços públicos de qualidade para nós é a expressão de ser possível iniciar novos pactos sociais, dentro e fora do setor Saúde, criando efetivas condições para uma mudança nesta correlação de forças, que privilegie o interesse público ante os interesses econômicos.

Nesse contexto de situar o direito a saúde no centro do projeto político de desenvolvimento social e econômico do país, o Cebes chama a atenção para o fato de que as medidas que compõem o Programa Mais Médicos são necessárias e louváveis , porém insuficientes para o setor que necessita urgentemente de outras medidas estruturantes de curto, médio e longo prazos. Com estas referencias para o entendimento da crise setorial, expressamos nossa preocupação e apresentamos propostas em relação ao Pacto pela Saúde formulado pelo Governo Federal:

•    Mediante a injusta falta de assistência médica que acomete a população e a dificuldade dos gestores em contratar profissionais médicos, é muito bem vinda a atração de profissionais médicos estrangeiros ao país. Entretanto, esta medida deve ter caráter emergencial e focalizado para garantir o clamor do povo brasileiro que expressou isso nas ruas denunciando que parcelas significativas da população não tenham garantido seu direito constitucional à assistência médica. Simultaneamente deverão ser adotadas medidas estruturantes para o problema;

•    Mesmo sem tangenciar o grave problema do subfinanciamento setorial, o anúncio de investimentos na infraestrutura das unidades de saúde, especialmente na Rede de Atenção Básica, constitui uma medida importante e necessária, que respeita os profissionais de saúde e principalmente os usuários do SUS. A medida adequada e de longo prazo é garantir financiamento para investimentos permanentes no sistema;

•    É preciso aprofundar as mudanças curriculares na formação médica, para além da ampliação do tempo do curso. Nesta perspectiva o Ministério da Saúde, como gestor nacional do Sistema Único de Saúde, deve fazer valer sua atribuição constitucional de “ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde”, expressa no inciso III do artigo 200 da Carta Magna;

•    É preciso que as universidades tenham como missão primeira formar os profissionais de saúde com o perfil necessário para as necessidades da população brasileira, ou seja, o trabalho no SUS. Para isso, é fundamental que o ensino seja totalmente integrado com a Rede de Atenção à Saúde e que sejam rompidos os entraves que apartam os Hospitais Universitários do SUS;

•    É igualmente necessário que a expansão das vagas e cursos de graduação em medicina seja feita essencialmente via universidades públicas, e nas localidades que mais necessitam de médicos. É preciso ampliar acesso e interiorizar as escolas de medicina, e isso deve ser feito pela expansão da rede de Universidades Federais;

•    Tão importante quanto formar médicos com perfil ético e humano para trabalhar no SUS é formar os especialistas necessários para garantir a integralidade da assistência. Universalizar a Residência Médica e torna-la obrigatória, garantindo vagas a todos os egressos de acordo com as necessidades do Sistema Único de Saúde, é uma necessidade;

•    Merece nosso apoio a contratação estratégica de médicos brasileiros, por parte do governo federal, para atuarem nos municípios e áreas de difícil provimento, onde a ausência desses profissionais é mais sentida pela população. Mas são necessárias mudanças na Lei de Responsabilidade Fiscal que limita a capacidade das municípios  e estados para a contratação de profissionais de saúde que preferencialmente devem estar vinculados institucionalmente aos municípios;

•    Imediatamente deve ser criado e implantado o Plano Nacional de Cargos, Carreiras e Salários para os trabalhadores do SUS, conforme foi apontado na última Conferência Nacional de Saúde. O Cebes defende a criação imediata da carreira nacional nos moldes do definido pela Mesa de Negociação Permanente do SUS.

É fundamental que o governo federal saiba aproveitar esse momento em que a sociedade brasileira reivindica serviços públicos de saúde com garantia de acesso e qualidade e corrija o erro que foi a regulamentação da Emenda Constitucional 29 sem a vinculação do percentual de 10% da Receita Corrente Bruta da União para a Saúde.

Com a retirada dos incentivos e renúncias fiscais aos planos e seguros privados de saúde e com o incremento de recursos advindos dos royalties do Pré-Sal e da Taxação de Grandes Fortunas, é perfeitamente possível garantir esse patamar mínimo de investimento na saúde dos brasileiros sem que isso acarrete em desequilíbrio fiscal.

Temos convicção de que, com o investimento adequado e com a coragem necessária para enfrentar os interesses econômicos que incidem sobre o setor saúde, é possível e necessário consolidar o direito cidadão à saúde e o Sistema Único de Saúde, como demanda o povo brasileiro. O SUS precisa de Mais Médicos e de Muito Mais…

Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
Rio de Janeiro, 15 de julho de 2013

Artigo colhido no sítio http://cebes.org.br/verBlog.asp?idConteudo=4700&idSubCategoria=56

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‘Mais médicos’: programa atende a todas as necessidades prioritárias do SUS?

Viviane Tavares – Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz)
Especialistas e militantes discutem programa criado como resposta do governo federal às reivindicações por melhorias na saúde pública.

 O governo anunciou, nesta última segunda-feira, dia 8 de julho, o programa ‘Mais Médicos’, que, entre outras ações’ pretende levar médicos para regiões com dificuldades de atrair estes profissionais, além de exigir que os estudantes de medicina, como parte da sua formação, passem a trabalhar dois anos pelo SUS. Esta ação – que integra o Pacto pela Saúde que apresentou cinco propostas , – foi uma das mais polêmicas, embora, segundo alguns especialistas e militantes, não seja isoladamente a mais importante.

O programa Pacto pela Saúde lançado no dia 24 de junho em uma reunião entre prefeitos e governadores das capitais garante investimento de R$ 12,9 bilhões até 2014 para a expansão e a aceleração de investimentos por mais e melhores hospitais e unidades de saúde e por mais médicos. De acordo com o Ministério da Saúde, estão planejadas a construção, reforma e ampliação de hospitais, Unidades de Pronto Atendimento (UPAs 24h) e de unidades básicas, além de hospitais universitários. O Pacto pretende ainda aumentar o número de vagas em residências médicas, além de perdoar a dívida dos hospitais filantrópicos.

Para o presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Luís Eugênio de Souza, o que este programa prevê é importante, mas não são apenas estas as necessidades do SUS. “Além da construção, é preciso assegurar o custeio das unidades de saúde, assim como é fundamental organizar as redes integradas de serviços”, explica.

Para Luis Eugênio agora é a hora de fortalecer o Movimento Saúde + 10 – que prevê a aplicação de 10% das correntes brutas da União para o SUS. “Em um importante ato público, realizado no dia 10 de julho, durante o 29º Congresso do Conasems, o Movimento, liderado pelo Conselho Nacional de Saúde, conseguiu o compromisso do presidente da Câmara Federal, deputado Henrique Alves, de receber em plenário o Projeto de Lei de Iniciativa Popular que já reuniu mais de um milhão e meio de assinaturas. A entrega será feita no dia 5 de agosto. Creio que, sensível às manifestações populares, a área econômica do governo federal não vai, dessa vez, pressionar os parlamentares a rejeitar a proposta”, informa o presidente da Abrasco.

O vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Aloísio Tibiriçá, afirma que esta pauta de mais recursos para o SUS é perfilada também pela entidade que representa. “Nós vimos o governo derrubar a Emenda Constitucional 29, que daria mais dinheiro à saúde, que favoreceria um projeto de saúde para a nação brasileira, e assim atender às regiões de difícil provimento. O projeto Saúde + 10 não vai resolver, mas é já um passo. O resto é proposta demagógica, são projetos eleitoreiros”, opina.


Mais médicos ou menos corporativismo?

A opinião de que projeto não vai resolver a saúde brasileira é unânime entre os especialistas ouvidos pela EPSJV, mas o Mais Médicos causou reações diversas. Como informa o MS, 22 estados estão abaixo da média nacional na quantidade de médicos, que é 1,8 para cada mil habitantes, sendo que cinco estados têm menos de um médico para cada grupo de mil habitantes. Em 1.900 cidades, a proporção é menor que um médico para cada três mil pessoas, e outras 700 não têm nenhum médico permanente.

O programa aponta que estes profissionais serão selecionados por meio de três editais: um para atração de médicos – estes trabalhadores deverão ser formados no Brasil, brasileiros formados no exterior ou estrangeiros, nessa ordem de preferência. A exigência de participação dos estrangeiros é que tenham conhecimentos de Língua Portuguesa, que sejam oriundos de países onde a proporção de médicos para cada grupo de mil habitantes é superior à brasileira. Todos os trabalhadores estrangeiros deverão cursar também especialização em Atenção Básica. Uma vez selecionados, o Programa oferecerá bolsa federal de R$ 10 mil, sob a supervisão de instituições públicas de ensino. O outro edital é para a inscrição das cidades que querem participar do programa, que deverão assumir as despesas de moradia e alimentação destes trabalhadores, e para as entidades que supervisionarão este trabalho.

A presidente do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), Ana Maria Costa, afirma que este é um projeto corajoso para enfrentar um problema crônico no país e aponta que é apenas o primeiro passo para um caminho maior de transformação na formação dos médicos brasileiros: “Essa medida tem aspectos importantes porque condiciona o médico a passar dois anos servindo ao SUS, fazendo assistência ao povo brasileiro. Além do compromisso do médico que recebeu do setor público uma formação cara e agora é a hora de fazer essa devolução, tem o aspecto formativo do médico em passar dois anos lidando com a população brasileira, que pode servir para fixá-lo nestas localidades. Mas essa retaguarda do modelo de formação tem que prepará-lo muito bem para isso”, explicou.

A Abrasco faz coro à opinião do Cebes em relação à aproximação dos estudantes com a realidade da saúde do Brasil. “A nossa entidade vê com bons olhos a inserção, a mais precoce possível, de estudantes de saúde, mas não apenas de medicina, nos serviços do SUS que disponham de condições adequadas de funcionamento e sempre com a supervisão de preceptores ou tutores. Essa inserção tanto qualifica a formação profissional quanto contribui para a melhoria da qualidade dos serviços”, opina e analisa: “É importante ainda ressaltar que essa iniciativa governamental revela que a voz das ruas encontrou eco. Se ainda não é o eco perfeito, ao menos, mostra a possibilidade de o movimento social influir na formulação das políticas públicas”.

Aloísio Tibiriçá, do CFM, discorda e afirma que a desigualdade de médicos se dá pela falta de investimento público, e que esta não pode ser uma forma de retenção. “O mercado domina a locação de recursos humanos, porque, como qualquer profissão, você vai aonde o mercado oferece melhores condições. É assim com jornalista, engenheiro, arquitetos… Nós consideramos que o investimento público tem que ser forte para conseguir reter os profissionais”, explica e completa: “No final da gestão do Ministro José Gomes Temporão. foi realizada, junto a entidades médicas, a proposta de uma carreira nacional de um médico do SUS, uma espécie de embrião de uma carreira de Estado para o médico, mas foi engavetada pelo ministro Padilha”.

Contratação de médicos estrangeiros

Antes de apresentar o programa Mais Médicos, a proposta inicial da presidente era trazer médicos estrangeiros de Cuba, Espanha e Portugal para atuar nestas regiões do país. Neste contexto, o Conselho Federal de Medicina se posicionou contra a vinda destes médicos. No entanto, se esta ‘importação’ acontecesse, o CFM exigia que houvesse a aplicação do Revalida, uma prova que serviria para validar o diploma dos médicos estrangeiros.

Com o Programa apresentado no início da semana, a contratação destes médicos só acontecerá caso as vagas não sejam preenchidas por médicos brasileiros. O que ficou ainda a ser debatido é a questão do exame. Segundo o MS, esses médicos terão registro provisório, portanto, esta prova pode ser dispensada. “A aprovação no exame e consequente validação do diploma autoriza o profissional a trabalhar em qualquer região do país, concorrendo livremente no mercado de trabalho. Dessa forma, se o exame fosse realizado não seria possível determinar onde esse médico trabalhará, o que não resolveria o problema de falta de médicos no país concentrada no interior”, justifica o Ministério, via assessoria de imprensa.

Aloísio Tibiriçá, do CFM, informa que a exigência do Revalida já é praticada em muitos países. “Em muitos países que têm médicos estrangeiros, estes passaram por processos rigorosos de validação de diploma e critérios de trabalho no interior. As pessoas falam que estamos com uma pauta corporativista, mas o que queremos prezar é pela valorização dos médicos brasileiros e pela qualidade da medicina praticada no país”, argumenta.

O presidente da Abrasco também acha que a avaliação dos médicos pode ser um caminho, mas ele entende que esta revalidação deve ser feita tanto para os estrangeiros como para os brasileiros. “Assegurar a competência técnica dos profissionais a serem contratados é fundamental, assim como um conhecimento razoável da realidade social do país. No entanto, qualquer processo de avaliação deve envolver as escolas e as faculdades, as representações docentes e discentes”, propõe. Ana Maria Costa avalia o Revalida como uma queda de braço colocada pelo CFM, já que todas as entidades concordam que o Brasil não quer médicos despreparados. “Não queremos médicos de baixa qualidade atendendo à nossa população nem brasileiros, nem cubanos, nem espanhóis, nem de nenhuma nacionalidade… Nós já temos muito problema com os médicos atuais, nós temos uma presença muito grande de mortes e adoecimentos por atrogenia [doença provocadas por intervenções médicas], isso mostra que tem problema de qualidade do médico, particularmente, e devemos buscar fortemente à qualificação destes médicos. Mas também não entendemos que o Revalida, que é uma prova, possa dar conta de apresentar a realidade do conhecimento e da qualidade destes profissionais”, analisa e acrescenta: “o que precisamos é acabar com essas universidades de má qualidade e acompanhar de perto a formação e o trabalho destes profissionais”.

Formação de médicos

A presidente do Cebes indaga um ponto fundamental: os dois anos serão suficientes para formar um médico comprometido com o SUS? E, ela mesma responde: “Não. Este comprometimento deveria vir desde a graduação”. Ana Maria aponta ainda que uma medida importante é o fortalecimento das universidades federais, a criação de universidades nos interiores e a extinção das más escolas de medicina. “Sem dúvida, as referências que hoje existem nas diretrizes da formação médica do Brasil avançaram – o uso de metodologias mais comprometidas, que permitam uma formação mais integral, que leva e conduz a uma visão mais generalista e menos especialista -, mas a tarefa de fazer valer, avaliar o ensino médico, dentro da perspectiva técnica, ética e política é fundamental”, explica e acrescenta: “Se nós mudarmos a maneira como o médico é formado no Brasil, voltado para o mercado de especialidades, voltado para um compromisso cada vez maior com o mercado e menos com o SUS, cada vez maior com a doença e a tecnologia e cada vez menor com a necessidade de saúde da população, se não mudarmos essa ótica da formação médica, essa medida não vai ter grande impacto”.

Luis Eugênio, da Abrasco, avalia este programa como uma oportunidade destes profissionais conhecerem a realidade brasileira. “Nos cursos profissionais de saúde, especificamente, é preciso sim enfatizar abordagens que exponham os estudantes à realidade social do Brasil, que é muito diversificada. Nesse sentido, os estudantes não podem ficar restritos aos hospitais universitários, devem ser treinados em outros ambientes, como unidades básicas de saúde nas cidades grandes, médias e pequenas”, explica.

A assessoria do Ministério da Saúde explica que esta nova grade curricular foi inspirada em países como Inglaterra e Suécia, onde os alunos precisam passar por um período de treinamento em serviço, com um registro provisório, para depois exercer a profissão com o registro definitivo. “O objetivo é aprimorar a formação médica no Brasil, assegurando maior experiência prática aos futuros profissionais, ampliando a inserção do médico em formação nas unidades de atendimento do SUS e aperfeiçoando seu conhecimento sobre a realidade da saúde do brasileiro”, explica.

Já o representante do CFM aponta que o problema de formação dos médicos está na falta de projeto de Estado. “O que formamos até hoje? Formamos médicos para o mercado, o mercado baliza as especializações, por isso, não conseguimos formar nem especializar de acordo com as necessidades deste país. Além disso, as especialidades chamadas generalistas são as mais desvalorizadas pelo governo, são as mais mal remuneradas, seja na tabela SUS, que remunera a rede complementar, seja na rede pública, além da forma precarizada de contratação. O médico se forma hoje para o mercado porque não há intervenção pública nisso”, explica Aloísio.

Mais “Trabalhadores da Saúde”

Segundo a presidente do Cebes, os médicos não são a única categoria de trabalhadores que faltam no interior do Brasil e o plano de carreira para servidores do SUS é uma necessidade de todos os trabalhadores da área. “O que vemos pela primeira vez é o enfrentamento de um assunto crônico, que é a questão dos recursos humanos, mas deve-se tangenciar a questão das outras profissões. As outras precisam de medidas concretas, como, por exemplo, os enfermeiros. Isso está relacionado aos baixos salários, pouca instabilidade, entre outros fatores. Precisamos voltar a discutir dois fatores: a questão do plano de cargos e salários e o ato médico”, explica.

Em nota à EPSJV, o Ministério da Saúde explicou que outros profissionais de Saúde, como enfermeiros e dentistas, também serão contemplados com novos incentivos federais. “Até 2015, o ministério vai abrir mil novas vagas de residência multiprofissional, direcionadas para todas as áreas da saúde além da medicina. Outra medida será o lançamento do edital do Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica (Provab), voltado para enfermeiros e dentistas, que devem atuar em municípios onde já trabalham médicos do Provab”, informa. No total, de acordo com a nota, serão abertas vagas para 1.500 profissionais, sendo mil enfermeiros e 500 dentistas. Além de bolsa, eles terão acesso a um curso a distância de especialização de 12 meses, com foco na Atenção Básica.

Luis Eugenio, da Abrasco, aponta que faltam todas as categorias profissionais e técnicas. “Tem falta, sobretudo, de carreiras estruturadas. Que as pessoas, no senso comum, confundam médicos com profissionais de saúde, é compreensível, mas que o governo confunda, não”, analisa.

Ato médico

O ato médico , sancionado pela presidente Dilma Rousseff com vetos na noite de ontem, também é uma das questões que respinga em diversos profissionais da saúde. Os vetos feitos pela presidente atenderam parte dos pedidos de instituições como o Cebes e a Abrasco, sob o argumento de que traria impactos negativos ao SUS. Em tramitação há 11 anos, a PLS 286/2002, conhecido como ‘Ato Médico’, tinha entre outros pontos a exclusividade dos médicos na formulação do diagnóstico nosológico (que descreve, estuda e classifica doenças); um artigo que determina como atividade privativa do médico a indicação do uso de órteses e próteses; a direção e chefia de serviços médicos; além do procedimentos considerados de invasão da epiderme e derme, o que impediria outros profissionais de aplicar injeções, por exemplo. “Na prática, a Lei é inócua para os médicos e prejudicial para o exercício dos demais profissionais e para a população. É inócua, pois não vai beneficiar em nada os médicos e é prejudicial, pois pode ensejar uma séria infindável de questionamentos às práticas dos demais profissionais”, diz o presidente da Abrasco em relação ao texto anterior ao veto.

Notícia colhida no sítio http://www.epsjv.fiocruz.br/index.php?Area=Noticia&Num=770

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Padilha e Mercadante convocam CDES a participar de pacto pela saúde

Ministros da Saúde, Alexandre Padilha (foto), e da Educação, Aloizio Mercadante, apresentam ao Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República a proposta para aumentar o número de médicos no Brasil. Maurício Thuswohl, de Brasília

Maurício Thuswohl

Brasília – Os ministros da Saúde, Alexandre Padilha, e da Educação, Aloizio Mercadante, convocaram os integrantes do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) a auxiliarem o governo no debate e formulação das políticas públicas que visam o aumento do número de médicos no Brasil e a ampliação do atendimento em todas as regiões e para todas as camadas sociais do país. Ao lado da presidenta Dilma Rousseff, que defendeu um pacto social pela saúde, Padilha e Mercadante participaram na terça-feira (17) em Brasília do Seminário Internacional sobre Desenvolvimento, evento que marcou os dez anos de atuação do CDES. Ambos defenderam junto aos conselheiros as mudanças recentemente anunciadas para o setor.

Padilha afirmou que a área de saúde representa hoje 30% dos investimentos em inovação tecnológica realizados pelo país, e que o governo tem investido no aumento dos serviços e no aprimoramento da gestão: “Nos últimos cinco anos, aumentamos em 70% os serviços e em 45% os equipamentos que dependem exclusivamente de médicos. Aumentamos em 17% o número de leitos e em apenas 14% o número de médicos”, disse. O ministro apresentou outro dado que, segundo ele, revela a necessidade de mais médicos que tem hoje o Brasil: “Nos últimos dez anos, geramos 143 mil primeiros empregos de carteira assinada para médicos e formamos 93 mil médicos. Geramos, portanto, 50 mil postos a mais do que nossa capacidade atual de formação”.

Nos últimos dez anos, segundo Padilha, o Brasil multiplicou por quatro seu investimento per capita em saúde. Apesar disso, diz o ministro, “a oferta de médicos no país é crítica” e muitos hospitais brasileiros funcionam sem o número suficiente de médicos: “O Brasil tem poucos médicos e eles são mal-distribuídos. Vinte e dois estados brasileiros estão abaixo da média nacional de 1,2 médico para cada mil habitantes, que já é baixa. Cinco estados se encontram em situação de alta escassez, com menos de um médico para cada mil habitantes, e mesmo dentro dos estados a situação é desigual. No passado, não formamos os especialistas de que precisávamos”.

O aumento do número de médicos formados, segundo Padilha, terá um “enorme impacto social” em todo o país: “Precisamos dar oportunidade ao jovem negro, da periferia, do interior, da classe média baixa. Dar oportunidade ao médico que quiser se especializar. Precisamos também mudar a formação médica, por isso é importante a adoção do segundo ciclo de formação com o atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS)”, disse. O ministro afirmou ser fundamental a participação dos diversos setores da sociedade no debate sobre o pacto pela saúde: “O CDES é um espaço privilegiado para essa discussão, que deve ser movida pelo interesse nacional e não por interesses corporativos”.

Novos médicos
Aloizio Mercadante falou sobre a necessidade de aumentar o ingresso de novos médicos no mercado de trabalho brasileiro a partir do aumento do número de vagas nas faculdades de medicina em todo o Brasil. Nos últimos dez anos, segundo o ministro da Educação, dobrou o ingresso de estudantes de medicina no país, que formou 14.634 médicos: “Ainda assim, sob qualquer parâmetro que a gente analise, faltam médicos no Brasil. Temos que ter uma política pública para uma melhor distribuição dos médicos no Brasil, pois eles estão muito concentrados”, disse.

Mercadante afirmou que “existem dois caminhos para melhorar a oferta de médicos” no Brasil: “Um deles é o Revalida, que é uma prova que todo médico que faz e todo médico estrangeiro que quiser trabalhar aqui terá de fazer esse exame, que não é nem mais nem menos do que é exigido do estudante de medicina no Brasil. O outro é o programa Mais Médicos, que irá trazer mais médicos para trabalhar no Brasil, nas condições que o Ministério da Saúde está desenvolvendo”.

O ministro falou também sobre a adoção do segundo ciclo de formação, que está sendo debatido no Ministério da Educação e no Conselho Nacional de Educação, com provável aplicação a partir de 2015: “Esse ciclo será feito em forma de serviços que serão prestados no SUS. Não é uma iniciativa inédita nem, absolutamente, uma coisa específica do Brasil, pois já é praticada em pelo menos 13 outros países, inclusive em alguns que são referências em serviços de saúde”, disse. Mercadante anunciou que, enquanto estiverem prestando serviços ao SUS, os médicos em segundo ciclo de formação receberão bolsa de auxílio financeiro e supervisão acadêmica. Além disso, serão obrigatoriamente alocados em unidades próximas à sua região e terão sua prestação de serviço vinculada à residência médica.

Políticas afirmativas
A polêmica criada em torno das propostas do governo para o aumento do número de médicos foi comentada por Mercadante: “O debate sobre esses dois anos de formação complementar dos médicos é intenso. Da mesma forma que o debate sobre o Pro-Uni, quando sofremos grande resistência, inclusive uma ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF), sob a alegação de que iríamos comprometer a qualidade do ensino. Hoje, os alunos do Pro-Uni têm desempenho muito próximo dos demais alunos. Também sofremos resistência quando fizemos o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ou defendemos a adoção da política de cotas nas universidades”.

As políticas afirmativas do governo na área de educação, segundo Mercadante, sempre foram alvo das críticas das elites. Como resposta, ele citou os 24 mil estudantes de medicina que atualmente recebem bolsas do Fundo de Financiamento Estudantil (FIES): “Os alunos pobres e carentes do FIES só têm condições de concluir seu curso de medicina com a bolsa que recebem. Depois, para pagar esse financiamento, precisarão de oito anos de serviços no SUS. Mas, para isso não houve crítica. Sabem por quê? Porque são pobres”, encerrou o ministro.

Notícia colhida no sítio http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=22374

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