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Encontro de culturas discute políticas públicas para povos tradicionais

Pedro Moreira
Enviado Especial da EBC

São Jorge (GO) – O Encontro de Culturas Tradicionais da Chapada dos Veadeiros, que começou no último fim de semana termina no domingo (28), tem uma agenda política reivindicada pelos povos tradicionais. Está previsto na programação, o 2º Encontro de Lideranças Quilombolas de Goiás (GO). Representantes das 22 comunidades de descendentes de escravos já reconhecidas pelo estado de Goiás puderam debater, juntas, suas demandas e desafios. O encontro conta com a parceria, também, da Casa de Cultura Cavaleiro de Jorge e da Secretaria de Estado de Políticas para Mulheres e Promoção de Igualdade Racial de Goiás (Semira).

Entre as comunidades, está o povo Kalunga, considerado o maior grupo quilombola do país. Domingos da Cunha Fernandes é o representante da comunidade Kalunga de Fazenda da Ema, no município de Terezinha de Goiás. Segundo ele, as demandas por lá são muitas. Falta um posto médico, faltam estradas. Domingos ressalta que o problema mais urgente é a demora na demarcação do território tradicionalmente ocupado, que está nas mãos de fazendeiros.

“Todo dia vai um lá e diz que as terras estão para sair. Nosso povo vai morrendo de velho e nunca [a regularização] sai. Eu vou até acabando a fé. O que está faltando é o seguinte: diz que é o Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] ir lá, medir e liberar ela. Mas nunca foi ninguém lá, não. Vai um bocado de gente lá, faz umas propostas bonitas lá, diz que agora, daqui uns dois dias, uns dois meses está liberado”, relatou o representante da comunidade.

O espaço “arrochado”, como ele diz, impede o desenvolvimento da agricultura de subsistência e empurra as novas gerações para a cidade. “Aí, no caso, estão ficando só os velhos dentro das casas. É ruim pra comunidade, porque a comunidade vai ficando fraca. Se os filhos nasceram alí, daquele pessoal que é dos kalungas, ficando tudo por alí, a tendência da comunidade é reforçar mais. Mas não tem, não tem como ficar.”

A representante dos kalungas da comunidade de Vão das Almas, no município de Cavalcante (GO), Natalina dos Santos Rosa, a Dona Dainda, considera positiva a oportunidade de se reunir com outras lideranças. Ela também destaca a presença de representantes dos governos, o que acaba facilitando o acesso a programas e políticas públicas.

No ano passado, um documento contendo as principais questões levantadas foi encaminhado aos patrocinadores do evento e às entidades relacionadas. Dona Dainda conta que a comunidade dela não tinha escola. As crianças estudavam numa construção de palha, com apenas um professor. Muitos alunos ficavam sob a sombra de árvores para estudar. “Hoje [há] um colégio com seis salas e vão construir mais um”.

Agora, acrescentou a representante quilombola, a luta é para melhorar o acesso à comunidade. “Quando vem o tempo da chuva, tem três rios que tem que atravessar de canoinha de madeira. Não tem como atravessar nada para o outro lado. Então a coisa que mais queremos são as pontes nos rios.”

Outro problema apresentado na reunião é a falta de uma estrutura institucional nos municípios que se dedique à promoção dos direitos das comunidades negras. Das 246 cidades de Goiás, cerca de 30 possuem um órgão voltado para a promoção da igualdade racial. Para reverter tal situação, a superintendente de Promoção da Igualdade Racial de Goiás, Raimunda Montelo, explica que vem incentivando, junto aos municípios, a criação de estruturas de apoio, como conselhos comunitários e secretarias.

Raimunda destaca as vantagens de reunir as lideranças. “Em primeiro lugar, o empoderamento, eles falarem por si e mapear as suas demandas, as suas necessidades, sem necessidade de representantes. Sem pessoas que não são da comunidade falarem em nome deles. Isso é um problema que a gente encontra, principalmente da comunidade kalunga, que é uma comunidade grandiosa, que todo mundo quer tirar foto do lado deles, sempre tem alguém que quer captar um recurso em nome deles.”

Durante o encontro, estão sendo eleitos os delegados estaduais que vão participar da 3ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Conapir), que vai ocorrer no período de 5 a 7 de novembro, em Brasília (DF), com o tema Democracia e Desenvolvimento por um Brasil Afirmativo.

Edição: Marcos Chagas

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Notícia colhida no sítio http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2013-07-23/encontro-de-culturas-discute-politicas-publicas-para-povos-tradicionais

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Cinema e luta de classes

Em entrevista à Carta Maior, Diogo Noventa, da Companhia de Estudo de Cena e do Coletivo de Vídeo Popular, analisa a relação entre cinema e luta de classes. “Hoje o que vemos é que a estética do cinema moderno perdeu sua postura anticapitalista e se integrou de maneira confortável no capitalismo estetizado internacional. Por exemplo: as descontinuidades narrativas e a câmera na mão em plano sequencia tornaram-se a iconografia fácil dos comerciais”.

Gérson Trajano – Especial para Carta Maior

São Paulo – O cinema é a expressão da burguesia. É certo que quando o cinema nasceu, a burguesia já praticava a literatura, o teatro e a música, mas essas artes já existiam antes dela. A arte que a burguesia cria é o cinema. E sendo o cinema gerador de signos ideológicos é a expressão audiovisual ideológica do burguês.

O cinema não é uma arte qualquer. Além de reproduzir a ilusão da realidade é uma arte apoiada na máquina, uma das musas da burguesia. Une-se assim, a técnica e a arte para realizar o sonho de mostrar a realidade nas mãos da burguesia.

A possibilidade de o outro de classe expressar-se no cinema está em relação direta com a propriedade dos meios de produção. Segundo Jean-Claude Bernardet, no livro “Cineastas e Imagens do Povo”, sempre se falou em colocar o povo na tela, mas nunca se questionou a dominação dos meios.

“Os cineastas prefeririam resolver a questão imaginando-se os porta-vozes ou representantes do povo ou até mesmo a expressão da ‘consciência nacional’”, diz Bernardet.

Para Diogo Noventa, da Companhia de Estudo de Cena e do Coletivo de Vídeo Popular, fazer cinema implica uma relação direta com a questão da luta de classes. “O modelo atual de sociedade, pautada pela exploração do homem pelo homem, evidencia bem isso”.

Noventa participou da mesa de debates Cinema e Luta de Classes, promovida pelo organizadores do 8º Festival de Cinema Latino-americano, no Memorial da América Latina, Leia os principais trechos da entrevista concedia por ele à Carta Maior.

Qual a relação cinema e luta de classes?

Diogo Noventa – O cinema como um meio de expressão e comunicação dos homens e mulheres que vivem na sociedade contemporânea tem uma relação enorme com a luta de classes uma vez que vivemos em uma sociedade de classes, uma sociedade dividida entre a classe dos donos dos meios de produção, a burguesia, e dos que vendem sua mão de obra, os trabalhadores, e dos excluídos dessa sociedade.

Dentro desse contexto temos um inimigo comum que é a burguesia e sua lógica mercantilista da vida, que são um dos elementos dinâmicos do capitalismo. A lógica burguesa e seus agentes tratam a arte como mercadoria determinando seu valor pelo sucesso ou fracasso de sua venda. A luta contra isso tem dois aspectos.

O primeiro aspecto da crítica ao tratamento mercadológico da arte é de que a arte, ou no nosso caso o “cinema arte”, o “cinema de autor”, é mais do que um simples trabalho. Seu valor cultural e espiritual, seu valor estético, é insultado pela sua transformação em mercadoria. Esse posicionamento aparentemente antiburguês carrega em si o culto ao artista como um sujeito especial e de sensibilidade rara, dotado de genialidade, e uma crença da existência de um estado puro da arte. Ao tentar salvar o cinema, se fortalece a mentalidade de que o verdadeiro cinema salva, com isso se estabelece determinados padrões de qualidade e sensibilidade.

Em relação ao público essa perspectiva crítica solidifica estereótipos e preconceitos, elaborando o discurso que desmoraliza e desqualifica os espectadores de telenovelas e de filmes abertamente comerciais (“Vai que dá certo”, “Se eu fosse você”). Essa posição diante do público “comum” assume ações de natureza aristocrática e social democrata, que se retroalimentam: a face aristocrática está na valorização e manutenção dos espaços do verdadeiro cinema (festivais elitizados e isolados do público, salas de bancos). A face social democrata está nas ações de acesso e formação de público para o “bom” cinema, como forma de educar o povo que se encontra aquém da compreensão do puro cinema ou é hostil a ele de forma desinteressada e deselegante.

O segundo aspecto da crítica é a possibilidade dos cineastas e artistas aderirem ou colaborarem com um movimento ampliado de superar e derrubar a sociedade burguesa. Essa identificação de classe pode ter duas variações. A mais comum é a identificação sem reconhecimento de classe, onde artistas e trabalhadores, na prática são explorados e oprimidos, cada qual dentro do seu grupo. A segunda variação mais urgente e menos comum é a identificação com reconhecimento de classe, onde os artistas se entendem como trabalhadores e se comprometem dentro e fora de sua arte, com as causas mais gerais do povo e dos trabalhadores.

Qual a estética do cinema burguês?

DN – A principal estética identificada com o cinema burguês é a chamada narrativa clássica, que tem seu clímax nos anos 1950, mas até hoje carrega o símbolo da ideologia e um contraponto a ela são os filmes antigos ou primeiro cinema. O interessante é que essas duas estéticas cinematográficas se entrecruzaram, ocorreu uma tensão estética e temática entre essas duas formas narrativas, prevalecendo a estética da classe dominante.

A solidificação da narrativa clássica é um fato cultural, que tem suas bases na concepção política e econômica de seus investidores, com isso não pode ser diretamente relacionada a preferência do gosto de público. D. W. Griffith foi quem melhor organizou a dinâmica dessa linguagem dentre tantos cineastas e empresários que também trabalhavam em prol de sua criação. No entanto, desde sua consolidação o método clássico já encontrava oposição de cineastas russos, como Vertov e Eisenstein, de surrealistas e do expressionismo alemão, que são referências do chamado cinema moderno do pós-guerra.

A criação da narrativa clássica consolidou o cinema como um espetáculo gerador de lucro, sendo – no campo das expressões artísticas – um expoente das formas capitalistas de desenvolvimento econômico do início do século XX. Nesse período e ainda hoje a identificação do uso do método da narrativa clássica em um filme, significava identificar, no campo da forma, sua aproximação com os interesses da classe dominante. Contudo, hoje o seu oposto não é verdadeiro, não é possível afirmar que a não utilização da narrativa clássica significa um rompimento com os interesses dominantes.

Hoje o que vemos é que a estética do cinema moderno perdeu sua postura anticapitalista e se integrou de maneira confortável no capitalismo estetizado internacional. Por exemplo: as descontinuidades narrativas e a câmera na mão em plano sequencia tornaram-se a iconografia fácil dos comerciais. Desse conflito histórico das formas de narrativas podemos tirar uma perspectiva útil para um cinema popular anticapitalista: procurar e contrapor ás formas vigentes uma tradição retirada das obras negligenciadas e deixadas a margem da história. É aqui que os primeiros filmes podem recuperar sua potencia, não para se reescrever o passado mas para provocar a superação da dominação cultural que está ligada a luta de classes.

Como combater a hegemonia da estética burguesa no cinema?

DN– Primeiramente entender que a hegemonia é mutável, portanto ela se transforma conforme o contexto. Não podemos nos prender a módulos fixos tanto hegemônicos como combativos. Tendo isso em vista indico cinco pontos que podem contribuir com esse combate histórico.

Primeiro: O trabalho audiovisual consequente deve partir de um estudo cujo interesse seja crítico e político em relação ao tempo presente em que se realiza. Todo tema deve ser compreendido e recriado pelo conjunto de seus trabalhadores dentro de um processo que não reproduza a divisão social do trabalho na produção de bens. Como aponta Marx, “o modo de produção da vida material condiciona o processo em geral de vida social, política e espiritual”. Acredito que a representação crítica passa antes pela superação da divisão entre trabalho espiritual/intelectual e trabalho material entre sua equipe de trabalho.

Segundo: A atitude coletiva do trabalho de transparecer na obra por sua forma processual. A forma de um trabalho audiovisual anticapitalista deve redimensionar o caráter “pronto” da imagem, modelo da forma dominante. Cabe a nós mostrar o processo de construção da imagem na medida em que ele revela um sentido político. Ou seja, não apenas como se chegou a ela, mas por quê. O resultado se abre a produtividade do espectador se o seu desenvolvimento crítico é demonstrado. Assim, o trabalho coletivizado de um filme se torna formador não apenas para quem participou dele, mas também para quem vai assisti-lo. A divisão entre artistas e plateia deve ser encarada como uma contradição a ser superada.

Terceiro: O objetivo de uma forma não convencional se liga ao da pesquisa contemporânea do estranhamento. Como Brecht propõe, não se trata apenas de uma estranheza formal, mas de uma estranheza capaz de causar reflexão histórica. A televisão está repleta de representações morais, de conflitos de ordem psicológica entre mocinhos e vilões, expostos em enquadramentos subjetivantes e emocionalistas. O cinema dialético deve representar conflitos de visão de mundo ligados as diferenças entre as classes sociais, e buscar formas materialistas e contraditórias de representá-lo. Ainda que haja muitos representantes perversos do capitalismo, a representação deve estar mais atenta a perversidade da estrutura social e política que proporciona os atos individuais. Sendo o audiovisual, por sua história de difusão de massa, um dos segmentos artísticos mais controlados pela ideológica dominante, cabe a uma produção crítica demonstrar as expectativas simbólicas hegemônicas, ao mesmo tempo em que estabelece novos padrões de interesse vivo e popular pela representação.

Quarto: O trabalho na área audiovisual é fortemente marcado pela superestrutura tecnológica. A necessária relação entre homem e máquina cria em determinadas experiências um discurso tecnicista e fetichista. Facilmente os trabalhadores se desconectam do debate sobre os assuntos e perspectivas em questão, siderados pela ótica do efeito. É preciso estar atento ao sentido crítico da cena, para que dele se extraiam os procedimentos de decupagem, de uso da câmera e montagem. Um processo crítico de gravação se dá com ênfase nos comportamentos sociais que revelam contradições históricas. Mostramos condições mais do que situações. Mostramos atores que têm um ponto de vista sobre a ficção e que não são serviçais da imagem. Os atores não servem a câmera, mas dialogam com ela para que a imaginação se coletivize. A montagem/edição não exibe os recursos técnicos, mas se serve deles na procura de ritmos que ativem a dimensão social e anticapitalista da crítica estética.

Quinto: Walter Benjamim em O Autor Como Produtor diz: “sabemos que o aparelho burguês de produção e publicação pode assimilar uma surpreendente quantidade de temas revolucionários, e até mesmo propagá-los, sem colocar seriamente em risco sua própria existência e a existência da classe que o controla”. Levando em consideração este argumento, se torna altamente questionável a criação audiovisual crítica que apenas abasteça o aparelho produtivo sem buscar modificá-lo. No campo da circulação – de fato decisivo para o audiovisual – é preciso criar circuitos de distribuição e exibição através do diálogo com outros coletivos organizados, com movimentos sociais, sindicatos, cineclubes. Mas também é preciso desestabilizar a lógica do espetáculo audiovisual, com ações complementares como debates e interações culturais e críticas de vários tipos, a fim de contribuir para a construção de novas redes de diálogo social. O cinema popular precisa sair do cinema.

Quais filmes você apontaria como contraponto ao cinema burguês?

DN – Para além das referências históricas temos uma pequena parcela de vídeos que se opõem ao cinema da classe dominante. Os vídeos de oposição são em sua maioria realizado por coletivos de formação socialista, anarquista e/ou periféricos, e tem como característica uma estrutura técnica mais simples sendo o vídeo seu suporte predominante em relação a película. Grande parte desses trabalhos encontram-se em DVD’s organizados pelo Coletivo de Vídeo Popular de São Paulo, e nos acervos da Mostra Luta, de Campinas/SP, e da Felco – Festival Latino-americano da Classe Obrera. Esses vídeos tem dois pontos de contato com os filmes antigos: primeiro, a circulação e exibição em espaços de encontro da classe trabalhadora (associação de moradores, ocupações culturais, cineclubes periféricos e espaços de movimentos sociais), e segundo, o tratamento não individualizante e psicológico de seus personagens.

Notícia colhida no sítio http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=22371

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