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Ora, então que aumentem o depósito compulsório!

Se o governo pretende realmente “enxugar a liquidez”, como se diz no jargão do economês, ele pode aumentar o nível do depósito compulsório, ao invés de continuar elevando a taxa oficial de juros. O efeito sobre a redução da demanda agregada será no mesmo sentido. E a maior parte da sociedade ficará agradecida.

Paulo Kliass

Por mais que esperneiem os chapabranquistas inveterados e os governistas de maneira geral, o fato é que a atual conjuntura econômica carrega consigo um grau razoável de incerteza e de insegurança. Dessa forma, apontar os equívocos da política econômica não pode ser confundido com as críticas apresentadas pelo conservadorismo e pelo financismo, que buscam soluções ainda mais ortodoxas do que as já conservadoras medidas que têm sido implementadas pela equipe econômica. Pelo contrário, trata-se aqui de apontar caminhos que permitam à nossa sociedade reencontrar o caminho do desenvolvimento sustentável em termos econômicos, sociais e ambientais. Permanecer calado ou fazer o ilusório jogo do contente é a pior contribuição que se pode oferecer para essa mudança necessária.

Notícias preocupantes: crescimento do PIB, setor externo e emprego
É bem verdade que não estamos ainda em um quadro de recessão ou de estagnação econômica, apesar das expectativas de crescimento do PIB para esse ano se apresentarem como muito mais modestas do que as taxas inicialmente previstas pelo governo. A Lei de Diretrizes Orçamentárias, encaminhada pelo Executivo ao Congresso Nacional em meados do ano passado, por exemplo, mencionava um crescimento do PIB de 5,5% em 2013. Hoje em dia, integrantes do próprio Ministério da Fazenda reconhecem que o simples fato de se atingir 2% já pode ser objeto de comemoração.

As estatísticas relativas ao setor externo também são fonte de preocupação. Apesar da manutenção de superávit na Balança Comercial (diferença entre o total de exportações e importações), a cada mês revela-se mais instável a situação da chamada conta de Transações Correntes, onde são computados os valores relativos às movimentações de natureza financeira do setor externo. Para o primeiro semestre desse ano, por exemplo, o déficit foi de US$ 43,5 bilhões, um valor 73% mais elevado do que o do mesmo período do ano passado. Apesar da folga relativa proporcionada pelo elevado estoque de nossas reservas internacionais (US$ 374 bi), o quadro começa a ficar tenso também nas contas externas.

A recente divulgação dos dados oficiais a respeito da dinâmica do emprego também aponta uma criação líquida de postos de trabalho ainda positiva. O Relatório do CAGED relativo ao primeiro semestre, no entanto, demonstra que os 826 mil postos criados representam um índice 30% inferior ao desempenho do mercado de trabalho observado no período janeiro-junho do ano passado. Ou então, um crescimento quase 50% inferior aos dados observados para o emprego ao longo do primeiro semestre de 2011. A conclusão a se tirar é que a economia ainda cresce, mas a uma passada perigosamente mais lenta do que o ritmo observado nos anos anteriores e mais devagar do que o previsto pelo próprio governo.

O equívoco das medidas conservadoras do governo
O cardápio de medidas apresentadas e adotadas pela equipe de Dilma até o momento, no entanto, tem sido muito influenciado pela orientação do conservadorismo. Em um quadro sensível como esse que vivemos, o governo tenta se vangloriar com um discurso que clama pela austeridade fiscal, que propõe cortes nas despesas públicas, que generaliza a concessão de isenções tributárias ao grande capital, que se orgulha pela geração de superávit primário e que tem provocado a elevação da SELIC durante as últimas 3 reuniões consecutivas do Comitê de Política Monetária (COPOM). Ora, elas são o tipo de medida que incentiva a paralisia e não a busca do salto para frente, a saída para a crise. A pretexto de tentar se sair bem na foto e demonstrar uma suposta “seriedade” na condução da política econômica, o que se consegue é promover a aproximação do Brasil às zonas perigosas da retração do nível de atividade.

Porém, os setores ligados aos interesses do capital financeiro não se dão jamais por satisfeitos. Insistem, persistem e repetem “ad nauseam” suas formuletas, supostamente as únicas eficientes para assegurar o equilíbrio macroeconômico. O mais interessante é que seu raciocínio sempre termina com a exigência pura e simples de uma elevação da taxa de juros. E ponto final! Em conjunturas passadas, por exemplo, o argumento esgrimado para que Henrique Meirelles mantivesse a SELIC na estratosfera se ancorava na suposta necessidade de oferecer alta rentabilidade ao capital especulativo internacional e assegurar um fluxo de ingresso de recursos externos em direção às nossas praias. Já nos tempos mais recentes, o argumento utilizado para pressionar por novos aumentos da taxa oficial a cada nova reunião periódica do COPOM tem sido o eterno risco de retorno da inflação.

A manutenção do “tripé” e os juros elevados
Toda a ação no campo da economia está orientada pelo paradigma do famoso “tripé da política econômica”, em vigência desde a edição do Plano Real em 1994. Criado para tentar por fim à espiral inflacionária que assolava o Brasil há muito tempo, o modelo pressupunha: a) meta anual de inflação a ser cumprida pelo governo, com um índice como centro (atualmente fixada em 4,5% ao ano) e uma diferença de 2% para cima e para baixo; b) geração de superávit primário para pagamento de juros e serviços da dívida pública; c) liberdade de fluxo de capitais externos e na formação da taxa de câmbio.

A variável sobre a qual o governo menos tem capacidade de influenciar é o ritmo de crescimento dos preços. Os modelos de macroeconomia que embasam esse tipo de ajuste encaram a inflação como sendo um problema de descompasso entre oferta e demanda de bens e serviços no conjunto da sociedade. Em razão da livre ação das forças no mercado, um determinado volume de demanda agregada maior do que a oferta agregada pode significar fator de desequilíbrio. Em tais circunstâncias, esse fenômeno tende a provocar preços mais altos nos mercados de bens e serviços, em comparação ao que seriam em situação de suposto equilíbrio.

De acordo com esse raciocínio, caberia à política monetária entrar em ação com o intuito de retirar recursos dessa pressão da demanda sobre a oferta. Esse seria o caminho para reequilibrar os preços de uma forma geral e evitar a inflação. E aqui entra o pulo do gato da política monetária contracionista. A hipótese subjacente é que a elevação dos juros operaria como atrativo para parcela desses recursos da demanda, que deixariam de se dirigir ao consumo de bens e serviços e seriam reorientados à poupança, em busca da maior rentabilidade oferecida pelos títulos no mercado financeiro.

Como se pode perceber, trata-se de um mundo completamente idealizado, bastante distante da realidade concreta vivida pela maioria da população de um país chamado Brasil no ano de 2013! As pressões inflacionárias mais recentes não serão resolvidas apenas pelo fato do COPOM aumentar a SELIC, pois a maior parte da pressão sobre a demanda vem de setores que nem tem essa capacidade toda de poupança e muito menos que deixariam de consumir para aplicar seus recursos em títulos oferecidos pelas instituições financeiras. É o caso típico da tão famosa “inflação do tomate” de alguns meses atrás. Os preços recuaram pela dinâmica cíclica da produção e oferta de determinados alimentos.

O “esquecimento” de uma alternativa: depósito compulsório
Mas então, vá lá, sejamos generosos e vamos conceder um crédito a essa hipótese equivocada – que o problema seja realmente o excesso de demanda agregada e que ela deva mesmo ser reduzida. Nesse caso, qualquer manual básico de macroeconomia tradicional oferece uma alternativa à elevação da taxa de juros para se obter o mesmo resultado de redução da pressão da demanda sobre a oferta. Trata-se do aumento da alíquota do depósito compulsório. O interessante é que nenhum desses sábios do financismo – que enchem a boca para defender maior rigidez na condução da política monetária – menciona essa alternativa a ser utilizada pelo governo.

O depósito compulsório é um instrumento já existente na regulamentação de nosso sistema financeiro e prevê que os bancos sejam obrigados recolher junto ao Banco Central um percentual de todos os seus depósitos. A ideia é evitar que os bancos emprestem a terceiros um volume muito grande dos recursos que ali são depositados. Esse mecanismo de controle sobre a chamada “criação monetária” pelo sistema bancário permite, assim, atuar sobre a quantidade de recursos que são canalizados para consumo. Com isso, tem-se uma redução da massa monetária disponível para a demanda agregada. Atualmente, por exemplo, a alíquota de recolhimento compulsório sobre os depósitos à vista nas instituições financeiras é de 44%. Em outros tempos, já foi bem maior. No primeiro semestre de 2003, por exemplo, estava em 60%. Em 1999, oscilou entre 65% e 75%. Ou seja, há espaço para uma eventual mudança.

Assim, se o governo pretende realmente “enxugar a liquidez”, como se diz no jargão do economês, ele pode aumentar o nível do depósito compulsório, ao invés de continuar elevando a taxa oficial de juros. O efeito sobre a redução da demanda agregada será no mesmo sentido. E a maior parte da sociedade ficará agradecida, uma vez que não haverá o enorme impacto negativo sobre as despesas financeiras do orçamento do Estado. Resta saber se há disposição da equipe de Dilma em contrariar os interesses da banca e liberar recursos para despesa orçamentária nas áreas sociais e não para gastos parasitas com o financismo.

Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.

Artigo colhido no sítio http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=6210

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As ideias econômicas do conservadorismo autêntico

O conservadorismo autêntico continua presente, exibindo suas ideias e buscando espaço para um eventual retorno à cena principal. Cabe aos responsáveis pela política econômica não enveredar por caminhos que contribuam para criar um ambiente favorável a tais projetos.

Paulo Kliass

As evidentes dificuldades apresentadas pela equipe de governo em lidar com as questões centrais da política econômica têm causado grande desgaste à Presidenta Dilma e prejudicado a credibilidade quanto à busca de saídas para o baixo crescimento das atividades em nosso País.

A ausência de sinalização a respeito de um rumo claro a ser adotado tem provocado uma enorme confusão entre os chamados “agentes econômicos”, a respeito de qual seria a verdadeira tendência a seguir em vários aspectos das políticas públicas. Vejamos alguns desses elementos:

a) política monetária: o início do mandato foi marcado pela manutenção da taxa de juros oficial nas alturas, provocando um custo elevado nas operações de crédito para empresas e famílias. Foram 15 meses com SELIC acima de 10%. A tendência logo depois é revertida e a taxa é reduzida 7,25%. No entanto, ao longo dos últimos meses, mais uma vez, a opção foi pela retomada da alta nos juros. Um ziguezague desorientador.

b) política cambial: o governo optou pelo discurso favorável à manutenção da “liberdade cambial”, com as consequências obviamente negativas da valorização artificial de nossa moeda. No período de juros muito elevados, por exemplo, a cotação chegou a R$ 1,54 por dólar. Em seguida, o governo passa a aceitar alguma mudança – positiva, diga-se de passagem – no patamar da relação do real com o dólar norte-americano, que chega a superar R$ 2,25 por dólar. Mas teme que isso provoque efeitos na inflação. Não há clareza a respeito da essência de tal política.

c) política fiscal: a Presidenta Dilma faz questão de ressaltar, a todo momento, seu compromisso com a chamada “austeridade fiscal”. Esse fio orientador para o conjunto de sua equipe, e para a sociedade de forma geral, se vê reforçado pela geração sucessiva de superávit primário ao longo dos exercícios. Porém, esse tipo de estratégia compromete a execução orçamentária nas áreas do social e dos investimentos. Ao invés de assumir publicamente a necessidade de mudar tal orientação, o governo recorre a manobras contábeis e artifícios casuísticos de maquiagem do superávit. Com isso, o instrumento da política fiscal acaba perdendo a credibilidade necessária.

d) política tributária: desde o início da crise em 2008, a política de isenção e desoneração tributária passou a ser utilizada em maior escala, com o objetivo de reduzir preços e manter a demanda interna aquecida. Porém, o governo lançou mão de outros instrumentos de redução de tributos, como foi o caso da desoneração previdenciária da folha de pagamentos das empresas e dos impostos sobre aplicações de recursos externos no mercado de capitais. Ora, esse tipo de medida – executada no afogadilho e sem nenhum planejamento – apenas contribui para reduzir a capacidade arrecadadora do Estado e compromete a execução das políticas públicas.

e) política de concessões: a continuidade do processo de privatização dos serviços públicos deu-se pela via da concessão dos mesmos ao capital privado. Assim, tem sido o caso das rodovias, das ferrovias, dos portos, dos aeroportos, entre outros. Porém, a cada leilão ou licitação realizada, o governo acaba cedendo às pressões do empresariado interessado, o que provoca redução dos recursos a serem pagos ao poder público, aumento das tarifas previstas e elevação das taxas de rentabilidade asseguradas aos consórcios vencedores. Ao sinalizar com esse tipo de flexibilidade de forma recorrente, o governo reforça a postura de chantagem do capital, que simula desinteresse e exige sempre melhores condições e mais benesses.

A esse quadro de preocupante instabilidade começam a se agregar os resultados negativos quanto ao aumento da inflação, à elevação do déficit no setor externo e ao baixo desempenho do PIB. Esse é o caldo de cultura ideal para que os setores conservadores comecem a trabalhar seus porta-vozes em busca de mudanças de rota e de pessoas nos cargos mais importantes na esfera econômica. Ainda que a orientação básica do governo tenha se comportado bastante favorável e adequada aos interesses do capital ao longo da década, o fato é que a pressão por mudanças mais radicais nunca deixou de se fazer presente.

As origens das ideias do conservadorismo
Durante a primeira quinzena deste mês, dois economistas renomados lançaram algumas de suas ideias a respeito do que deveria ser feito, de acordo com a lógica mais ortodoxa e liberal. Ambos eram professores da PUC/RJ e a partir da década de 1980 tiveram a oportunidade de se iniciar como responsáveis pela política econômica na área federal. Em seguida, tornaram-se banqueiros. Profissionais bem preparados, formaram parte do núcleo duro que se encarregou pela divulgação e implementação dos alicerces e fundamentos do neoliberalismo por nossas terras. Depois que os tucanos saíram do governo federal, eles se reúnem periodicamente em um instituto de pesquisa no bairro carioca da Gávea, a Casa das Garças. Fica situado a apenas algumas centenas de metros daquele campus universitário, onde tudo começou e continua – os meninos da PUC.

O foco central da abordagem conservadora continua sendo a questão do Estado. Aqueles que propugnavam que a História tinha chegado a seu fim, também consideram que tudo o que é público carrega em si um karma negativo e a solução a ser perseguida é – sempre! – o Estado reduzido à sua dimensão mínima. Mas nessa luta desesperada para justificar essa causa anacrônica, acabam por se valer de argumentos que não encontram nem mesmo respaldo na realidade concreta.

Reflexões de Lara Rezende
Vejamos o que pensa André Lara Rezende, em artigo publicado no Valor Econômico:

“O Estado brasileiro tornou-se um sorvedouro de recursos, cujo principal objetivo é financiar a si mesmo. Os sinais dessa situação estão tão evidentes, que não é preciso conhecer e analisar os números.”

Porém, o fato é que os dados e informações oficiais – que ele acha que nem precisam ser conhecidos – demonstram um quadro bem diferente. Em primeiro lugar, quase a metade dos recursos do Orçamento da União são destinados para o pagamento de juros e serviços da dívida pública – gasto parasita, na esfera do financismo. Em seguida, em que pese todo o esforço que foi feito em sentido contrário na época de ouro do neoliberalismo, boa parte dos recursos públicos ainda são alocados em setores sociais, como a educação, a saúde, previdência e assistência social. Apesar de todos sermos a favor de uma melhoria na gestão da máquina estatal e de maior eficiência na alocação do gasto público, o Estado brasileiro está longe de ser um ente que “se financia a si mesmo”. Na verdade, esse tipo de assertiva só pode ser compreendido como a pavimentação do terreno para a volta de propostas sugerindo privatização completa desses últimos resquícios de Estado de bem estar social.

Em seguida Lara Rezende se aventura a explicar fenômenos como a sobrevalorização cambial e a desindustrialização, com base em uma suposta repartição do espaço público entre os diferentes agentes da base política do governo. Uma loucura! Vejamos aqui:

“A combinação de um projeto anacrônico com o loteamento do Estado entre o sindicalismo e o fisiologismo político, ao contrário do pretendido, levou à sobrevalorização cambial e à desindustrialização.”

Ora, qualquer indivíduo minimamente informado a respeito do fenômeno econômico sabe que a valorização artificial e excessiva de nossa moeda guarda relação direta com a enxurrada de recursos externos, que se explica pela alta taxa de juros aqui praticada. E isso só foi possível graças à abertura tresloucada de nosso mercado ao capital especulativo internacional, que foi levada a cabo quando eles estavam à frente da política econômica. Esse mesmo fenômeno acaba provocando consequências negativas para a atividade industrial interna, uma vez que os preços dos manufaturados importados ficam muito baixos e os nossos produtos industriais não conseguem condições de competir tampouco nos mercados externos. Pressão sindical e fisiologismo político passam longe de tais movimentos.

Propostas de Pérsio Arida
Em entrevista concedida ao mesmo jornal, Pérsio Arida avança outras ideias do conservadorismo genuíno e sincero. Logo no início, identifica aquele que seria um dos maiores problemas de nossa economia: a questão da remuneração da força de trabalho. Vejamos aqui:

“Várias medidas necessárias dependem de vontade política. A mais óbvia é mudar a lei de indexação do salário mínimo. É uma excrescência: o mínimo sobe automaticamente com o PIB, em termos reais. Quem ganha salário mínimo merece ter aumento real, é obvio que sim. Mas o problema não é esse. É que ele é piso para todas as negociações sindicais. A economia funciona como se tivesse choques de salário real e indexa as aposentadorias.”

A crueldade da observação não esconde o sentido de classe presente no raciocínio. Ora, em tese parece razoável imaginar que se há crescimento da economia, então o resultado dessa ampliação real do PIB deva ser repartido por todos os setores da sociedade. Mas, aqui, não! É uma “excrescência” que o salário mínimo receba esse mesmo ganho real (sic). Os trabalhadores não merecem compartilhar do crescimento da economia nacional. Apenas o capital deve ser beneficiado por essa elevação de renda. Isso sem levar em conta a enorme dívida histórica que a sociedade brasileira tem para com os que vivem apenas de sua capacidade laboral e que, precisamente por isso, merecem receber um tratamento mais acelerado de recomposição de seu poder aquisitivo.

Não contente em sugerir a redução de direitos ao conjunto dos trabalhadores da ativa, Arida passa a tecer considerações a respeito dos aposentados e do nosso modelo previdenciário. Ao ser indagado se seria ruim um sistema que repassa ganhos reais para as aposentadorias, ele afirma o seguinte:

“O Brasil é o único país que conheço no mundo que dá compulsoriamente aumento real de pensão para aposentados. No fundo, está tirando renda dos segmentos ativos da sociedade e transferindo para os aposentados.”

Mais da metade dos benefícios concedidos pelo Regime Geral de Previdência Social não supera o valor de um salário mínimo mensal. Uma parcela bastante reduzida alcança a soma de 2 salários. Ora, não é concebível criticar o modelo por incorporar esses ganhos reais de alguns pontos percentuais a cada biênio, segundo o que estabelece a legislação. Não são os aposentados que estão “tirando renda” dos segmentos ativos da sociedade. Na verdade, os inativos já estão mais do que prejudicados pela vigência da fórmula do “fator previdenciário” (criado ainda no governo de FHC e mantido desde então). Essa redução do valor dos benefícios e de outros gastos públicos ocorre para que possam ser beneficiados os setores de renda elevada, esses sim os que se apropriam do rentismo financeiro gerado pelo próprio Estado.

Além disso, Arida se esquiva de mencionar o fato de que foram justamente a política de valorização do salário mínimo, a manutenção da política da previdência social e as alocações do tipo Bolsa Família que permitiram ao Brasil se voltar para o mercado interno a partir de 2008 e evitar um maior prejuízo provocado pela crise financeira internacional.

Mais à frente, o autor resvala para o comércio internacional e faz algumas considerações carregadas de significado, pois implicam o retorno à política externa do período anterior a 2003. Suas palavras são as seguintes:

“Mas acho que fazer acordos de livre comércio com os parceiros comerciais que importam, que são Estados Unidos, Europa e Ásia, seria mais produtivo do que insistir no caminho do Mercosul.”

Assim, o ideal seria abandonar o projeto estratégico de consolidação do bloco regional e das políticas comerciais na linha do chamado “sul-sul”. Segundo ele, a opção mais adequada deveria ser a retomada da via preferencial pelos países ricos, com a definição de Estados Unidos e Europa como parceiros prioritários. Uma loucura! Ao longo da última década – por mais críticas que se possa fazer ao modelo neocolonial baseado no setor primário exportador – o Brasil conseguiu diversificar sua corrente de comércio e deixou de ser dependente apenas da economia norte-americana. O Mercosul passou a ter um peso cada vez mais expressivo em nosso regime de trocas, assim como a China. Aliás, não fosse tal reorientação e estaríamos ainda em piores condições, haja vista as consequências provocadas pela recessão nos países do Hemisfério Norte.

Como se pode perceber, o conservadorismo autêntico continua presente, exibindo suas ideias e buscando espaço para um eventual retorno à cena principal. Cabe aos responsáveis pela política econômica não enveredar por caminhos que contribuam para criar um ambiente favorável a tais projetos. Afinal, estão baseados em princípios que a própria história recente acabou por relegar à condição de coadjuvante no debate econômico.

Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.

Artigo colhido no sítio http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=6204

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