Trabalhadores/as com deficiência da CUT se reúnem em São Paulo para debater avanços e desafios
Escrito por: William Pedreira
O preconceito, o desrespeito às leis e a dificuldade na implantação de políticas públicas ainda são barreiras enfrentadas pelas pessoas com deficiência no cotidiano atual.
A CUT, com seu papel de vanguarda e compromisso com uma sociedade mais justa e igualitária, onde todos/as sejam respeitados/as, tem trabalhado para garantir os direitos fundamentais e universais dos trabalhadores e trabalhadoras com deficiência.
Nesta sexta (26), a Central deu inicio ao seu III Encontro Nacional de Trabalhadores e Trabalhadores com Deficiência, comparecendo dirigentes das estaduais e de diversos ramos.
Em todos os seus eventos e atividades, a CUT tem se preocupado com a acessibilidade universal que possibilite a participação de todos/as trabalhadores/as.
No caso deste Encontro, a partir da contribuição das companheiras Adriana Macarini e Daniela Klemp, foi disponibilizada a tradução simultânea por meio da linguagem brasileira de sinais (libras). Ambas foram saudadas pelos presentes pelo Dia do Intérprete de Libras celebrado neste 26 de julho.
Os materiais distribuídos durante a atividade também serão disponibilizados em braile e vídeo-transcrição. “A CUT é a primeira central a construir um espaço para fazer o debate político sobre a qualidade de vida das pessoas com deficiência, a inclusão do trabalhador na sociedade e no mercado de trabalho. A CUT nasceu buscando a transformação do país, construindo espaços importantes a partir dos sindicatos, federações, confederações e estaduais”, destacou Flavio Henrique, coordenador do Coletivo Nacional dos Trabalhadores e das Trabalhadoras com Deficiência.
Contexto histórico – Antonio José Ferreira, secretário nacional de Políticas para as Pessoas com Deficiência da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, recordou que os trabalhadores começam a participar efetivamente das questões referentes ao trabalho na medida em que se destacavam na produção independente, na prestação de serviços ou no oferecimento de serviços artesanais.
“Tivemos a sorte de sermos marcados na sociedade com as primeiras expressões de trabalho do companheiro Antonio Francisco Lisboa, conhecido como Aleijadinho, que expressava através da arte o protagonismo dos trabalhadores com deficiência, tendo as suas obras reconhecidas em diversas localidades”, observou.
A partir dos anos 80, com a abertura democrática do país, os trabalhadores com deficiência tiveram a oportunidade de ocupar o Congresso Nacional, possibilitando a inclusão na Constituição Federal de diversos artigos que garantem a transversalidade das políticas e asseguram às pessoas com deficiência a proteção ao trabalho, acesso à educação, saúde, assistência social e acessibilidade.
Apesar da resistência de alguns setores, a luta organizada dos movimentos obteve importantes avanços na sociedade brasileira. No começo dos anos 90 foi aprovada a Lei de Cotas (Art. 93 da Lei nº 8213/91) e a lei da reserva de vagas nos concursos públicos.
Pela Lei de Cotas, a empresa com 100 ou mais empregados é obrigada a preencher de 2% a 5% dos seus cargos com trabalhadores com deficiência ou beneficiários reabilitados. A Lei também relaciona outras dimensões: empresa com 200 empregados tem que garantir no mínimo 2%; de 201 a 500 (3%); de 501 a 1.000 (4%); de 1.001 em diante (5%).Passados mais de 20 anos, a aplicação da Lei ainda enfrenta dificuldades em seu cumprimento. “O empresariado utiliza diversos artifícios para justificar o não cumprimento da Lei, como a não existência de trabalhadores qualificados para ocuparem as vagas. Utiliza também uma brecha própria Lei que inclui a contratação de trabalhadores reabilitados. São falcatruas que demonstram o preconceito, a discriminação e o tamanho do nosso desafio. É uma discussão política que temos de levar para nossas bases, para dentro das nossas convenções coletivas e cobrar dos órgãos responsáveis uma fiscalização permanente das empresas”, orientou Flavio Henrique.
“Precisamos espantar o fantasma de que as pessoas com deficiência não são qualificadas. Não queremos aposentadoria, emprego faz de conta, mas um trabalho que permita o protagonismo, a autonomia e a inclusão da pessoa com deficiência, um trabalho que possa garantir o sustento das nossas famílias. Para isso, é necessário uma outra política de acesso, de mobilidade, urbanismo, para que o trabalhador possa se locomover até a empresa, onde deve ser garantido a todos e todas as condições para que exerçam seu trabalho com dignidade. O maior problema das pessoas com deficiência é o olhar da sociedade. Precisamos construir uma cultura de inclusão, que a sociedade nos veja como iguais”, complementou José Ferreira.
Entre avanços e retrocessos – no Brasil, segundo dados do Censo Demográfico 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 45,6 milhões de brasileiros declararam ter alguma deficiência. O número representa 23,9% da população do país.
Se comparado com períodos anteriores, onde as ações eram voltadas ao mero assistencialismo, a luta organizada do segmento proporcionou importantes avanços na garantia de direitos para as pessoas com deficiência.
Exemplo foi a ratificação pelo Brasil em 2008 da Convenção Internacional da ONU sobre Direitos das Pessoas com Deficiência que, no campo do trabalho, assegura a liberdade de escolha, adaptação física nos locais de trabalho, formação profissional, igualdade salarial para função de igual valor, segurança sindicalização, garantia de progressão funcional, preservação de emprego, habilitação e reabilitação profissional, proteção contra o trabalho forçado, entre outras medidas.
Mais especificamente neste ano, a presidenta Dilma Rousseff sancionou o Projeto de Lei 142/13 que garante aposentadoria especial às pessoas com deficiência.
Pelo projeto, terá direito ao benefício pelo Regime Geral da Previdência Social (RGPS) aquele que contribuir por 30 anos, se homem, e 25 anos para as mulheres, caso a deficiência seja considerada leve.
Com deficiência moderada serão exigidos 27 anos de contribuição para os homens e 22 anos para as mulheres.
Os segurados que possuem deficiência grave poderão se aposentar após 25 anos de contribuição (homens) e 20 anos (mulheres). Terá direito também à aposentadoria especial a pessoa com deficiência que tenha 60 anos, no caso dos homens, e 55 anos, se for mulher, se contabilizar no mínimo 15 anos de tempo de contribuição para a Previdência.
“Temos que avaliar e discutir como será feita a análise do grau da deficiência e a procedência da perícia médica no INSS. Estaremos acompanhando este debate no Grupo de trabalho responsável por debater a normatização desta Lei”, assinalou Junéia Martins, secretária nacional de Saúde do Trabalhador da CUT.
Luiz Soares, membro deste GT da Previdência Social que discutirá a regulamentação da Lei das aposentadorias, citou um instrumento que pode colaborar nas análises, que é a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), construída nos anos 80 e que passou ao longo do tempo por diversas atualizações. “Os marcos legais existentes hoje são fundamentais para garantir o respeito, a dignidade e justiça às pessoas com deficiência”, salientou.
João Batista Gomes, secretário de Políticas Sociais da CUT-SP, lembrou que depois de sete anos finalmente foi arquivado no dia 26 de junho em caráter permanente o Projeto de Lei 112/06 de autoria do senador José Sarney (PMDB-AP) que propunha a flexibilização da Lei de Cotas.
“É mais uma vitória na batalha pelo cumprimento da Lei. Continuaremos buscando fortalecer nossos instrumentos para aprofundarmos a luta por uma sociedade onde todos estejam incluídos e tenham seus direitos respeitados”, disse Batista.
Estatuto contradiz a Convenção da ONU – está em discussão no Congresso Nacional o Projeto de Lei 7699/06 que cria o Estatuto da Pessoa com Deficiência.Por ele, pretende-se alterar o conjunto de leis. A aprovação do Estatuto é vista com ceticismo pelos dirigentes, pois apresenta divergências em relação à Convenção Internacional da ONU. “Não tem sentido aprovar um Estatuto que se contradiz e que está rebaixado em relação a Convenção Internacional”, criticou Expedito Solaney, secretário nacional de Políticas Sociais da CUT.
Segundo Flávio Henrique, há uma orquestração para que o Projeto seja aprovado o mais célere possível e da forma como está fundamentado hoje. “O prazo limitado (5 de agosto) para consulta pública demonstra o desejo de tocar o projeto o mais rápido possível. Vamos discutir aquilo que é de interesse para a classe trabalhadora para que não seja estabelecido nenhum documento abaixo da Convenção”, declarou.
O deputado federal Vincentinho (PT-SP), membro da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência, colocou-se a disposição para fazer o enfrentamento no Congresso Nacional. “Os trabalhadores com deficiência infelizmente não foram ouvidos neste debate. Coloco meu mandato e de deputados comprometidos com a causa para sermos porta-vozes desta luta. Com as propostas, buscaremos o diálogo com a relatora do projeto (deputada Mara Gabrilli/PSDB-SP). Caso não haja avanços, devemos construir uma mobilização nacional em defesa dos trabalhadores com deficiência como a CUT sempre fez, exigir e cobrar audiências públicas para que a classe trabalhadora seja ouvida.”
Durante o Encontro, foram apresentados alguns vídeos com histórias do cotidiano de superação dos preconceitos e dificuldades.
Notícia colhida no sítio http://www.cut.org.br/acontece/23528/superar-o-preconceito-e-a-discriminacao-para-avancar-no-cumprimento-das-leis-e-das-politicas-publicas