fetec@fetecpr.com.br | (41) 3322-9885 | (41) 3324-5636

Por 10:40 Sem categoria

Uma ação para a esquerda: fazer da informação pública, um bem público

A armação da estratégia de ataque se inicia com o lance pela esquerda com a posse de informações sobre o Estado.

Por José Tanajura Carvalho

O editorial da Carta Maior — CM, Golpe: a derrubada em marcha (aqui), no dia 28 último, assinado pelo jornalista Joaquim Palhares, é, de fato, um manifesto àquelas e àqueles que se nutrem na utopia da democracia. Visto que, após avaliar a ascensão reacionária e entreguista nos intermédios de determinados setores da política atual brasileira, o editorial propõe a articulação das forças progressistas em defesa e avanço das políticas sociais conseguidas nos últimos doze anos e na garantia da soberania nacional. Também nesta mesma CM, em 15 de junho passado, Aram Aharonian — no artigo Onde está a esquerda? (aqui) — desafia a esquerda em derrotar o neoliberalismo em todas as suas frentes com o apontamento de novas formas de resistência. Em ambas as oportunidades, o editorialista e o articulista deixam clara a necessidade das forças progressistas, especialmente no caso brasileiro, colocarem em prática o que alguém já dissera com relação ao futebol: a melhor defesa é o ataque.

Nesse caso, a armação da estratégia se inicia com o lance pela esquerda com a posse de informações sobre o Estado. Contudo, até então se verifica que a jogada morre na pequena área amiga, na medida em que as forças progressistas não têm conseguido se apropriar da informação pública, para utilizá-la na construção de argumentações no combate às articulações de direita renascidas nas ideias neoliberais.

Não se pode, entretanto, deixar de exemplificar a questão com avanços institucionais e de conquistas sociais no plano da informação pública. Diversos países contam, por exemplo, com as chamadas Leis de Acesso à Informação, como é o caso do Brasil. Entretanto, a Lei de Acesso à Informação — LAI (Lei nº 12.527/2011) brasileira não define a forma de como o Estado deva faculta ser percebido sistemicamente, ou seja, como sendo um mesmo organismo político, social e econômico, visto que as informações não poderiam deixar de ser solicitadas, conforme a lei, com os mais diversos objetivos, momentos, origens e espaços. Procedimento que reproduz, certamente, o conjunto de informações sobre o Estado, mas em número tão grande e dispersas em subconjuntos que dificilmente ocorrerá a sua percepção como totalidade. Isto se houver condições de atender às solicitações isoladas de forma generalizada e igualitária.

Nesse caso, a sociedade encontrará dificuldades na obtenção de informações sobre o público, sendo, então, compelida a assumir custos econômicos e políticos para se informar sobre o Estado através da mídia privada. Alternativa contingente pelos interesses privados da imprensa, por sua vez, envolvida com os seus próprios objetivos capitalísticos e de seus patrocinadores. Haja vista o Brasil não possuir regulação minimamente moderna sobre os meios de comunicação, enquanto diversos países a possuem há algum tempo. Inclusive, a legislação brasileira em vigor (LGT – Lei 9.472/97) favorece a marmorização de oligopólios no segmento de comunicações no país.

O avanço da Internet — através dos chamados blogs — assinala o surgimento da mídia alternativa de exposição e crítica ao Estado, com contribuição relevante para o debate político. No momento, afora a questão de se tratar de uma tecnologia em desenvolvimento quanto à forma de linguagem e de conteúdo, há forte embate, que sinaliza ser duradouro e de resultado imprevisível, entre os blogs de grupos independentes, sem amarras oligopolistas, e aqueles afiliados a grandes grupos de mídia que sentem ameaçados nos seus interesses comerciais e nas suas convenientes platitudes de exposição política.

Entretanto o que se faz necessário é a exposição do Estado na sua totalidade com acessibilidade popularizada, conquanto seja sistematizada na confiabilidade científica, regularidade, amplitude, aprofundamento, e garantia de continuidade na produção e distribuição da informação pública, atribuições que fogem à dinâmica precípua da mídia privada ou mesmo estatal.

O acesso ao conhecimento sobre o Estado, portanto, vai além de dispositivos funcionais dispostos em normas, aparelhamentos institucionais e de organizações de caráter privado. Porquanto as suas extensões são definidas por interesses institucionalizados ou particulares, enredados em minúcias formais e procedimentais sobre as quais a sociedade, e, mais precisamente, as classes populares, pouco ou nada podem interferir em grau suficientemente satisfatório para gerar elementos que julgam ser essenciais na sua relação com o Estado.

Cabe, então à esquerda, promover a produção e a distribuição de informação pública na confirmação como um bem público devidamente institucionalizado e sistematizado, orgânico mesmo ao Estado. A primeira iniciativa, nesse sentido, é constar no texto constitucional o tratamento da informação pública como um bem público, portanto, como um direito social, compreendido como conteúdo de políticas públicas nas esferas municipal, estadual e federal.

Fundamentalmente, trata-se de alterar a Constituição Federal, no seu art. 5º, inciso XXXIII, no propósito de retirar do texto a forma infinitiva, com denotação de impessoalidade — […] todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral […] — substituindo-a por determinação imperativa, qual seja a de que […] todos têm direito e receberão […]. Bem como incluir no Art. 6º da Constituição, a informação pública como um bem público. Tal que o Estado brasileiro passe a ter a obrigação de produzir e distribuir a informação pública na acepção de direito social, semelhantemente como é estabelecido para os demais direitos sociais. Por conseguinte, constar, na Constituição, determinação que obrigue as esferas de governos incluírem, no planejamento plurianual, as suas ações entendidas como políticas públicas, e a subsequente vinculação, nas respectivas leis orçamentárias, percentual certo e líquido da receita resultante de impostos, taxas e contribuições, visando o aprofundamento e consolidação da acessibilidade à informação pública. Assim como, por exemplo, são definidos e explicitados, na Lei do Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO), Lei Orçamentária Anual (LOA), e na prestação de contas anual, a manutenção e o desenvolvimento do ensino e das ações e serviços públicos de saúde. Haja vista que o princípio constitucional da publicidade relativa aos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos, ter assumido, pelo vazio constitucional, o caráter meramente de propaganda de realizações (sic) de governos nas diferentes esferas e poderes, formas sub-reptícias de promoção de agentes políticos e públicos, em oposição ao artigo 37, § 1º (redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998), que veta tais alusões.

A segunda iniciativa é fazer cumprir o que está estabelecido na CRFB, art. 70 e 71, com referência ao controle externo do Estado a ser exercido pelo legislativo, com auxílio dos Tribunais de Contas, que deverá apreciar o ato administrativo dos entes públicos de que resulte receita ou despesa (LEI Nº 8.443/92). Na combinação dos artigos da CRFB citados, quer dizer, nos propósitos dos Constituintes de 1988, o conceito de controle externo se concilia àquele aqui desenvolvido de informação pública como um bem público. Todavia, o desempenho dos Tribunais de Contas tem se mostrado aquém da norma constitucional enunciada, e muito ainda haverá de ser feito para o conseguimento de níveis satisfatórios de colaboração, principalmente quanto ao entendimento de acessibilidade à informação pública como instrumento de base à participação social de gestão sobre no Estado. Semelhantemente se poderia argumentar em relação ao papel da Controladoria Geral da União — CGU ao lidar com o controle interno da União.

Outra iniciativa é a mobilização de profissionais em disciplinas afins à gestão pública, para o desenvolvimento de pesquisas teóricas e empíricas sobre o Estado, com o objetivo de reprodução da informação pública. Especificamente, por exemplo, o arcabouço das ciências econômicas será capaz de objetivar o fato econômico gerado no decurso da escolha e implantação de políticas públicas, com a argumentação lógica da economia política e o conjunto metodológico de instrumentos preditores. Contudo, a mobilização desta ciência tem sido resvalada da produção em volume e densidade como base e propósito da informação pública. Em que pese à academia e centros de pesquisas se dedicarem, com inteira validade, à publicação de trabalhos empíricos e de concepção reflexiva com significado para a acumulação de conhecimentos eruditos das atividades humanas. Não obstante, em boa parte, tais esforços acrescentam muito pouco ao contexto da informação pública, na medida em que suas formulações e conclusões, não se conectam objetivamente à gestão concreta do Estado e suas relações cotidianas com a sociedade. Visto que se encerram nos prolegômenos do exercício acadêmico e menos no questionamento do Estado em linguagem de ser instrumentalizado no debate político e, consequentemente na participação social na gestão do Estado.

Como terceira iniciativa, poder-se-ia ter como exemplo ações de diversas cidades e países, mas, pela atualidade e proposições, um exemplo em destaque é o projeto Praças Digitais, em desenvolvimento a partir de 2013, pela Prefeitura da cidade de São Paulo, através da Secretaria Municipal de Serviços e da Empresa de Tecnologia da Informação e Comunicação do Município de São Paulo – PRODAM. Tal projeto compreende a instalação de acesso gratuito à Internet, em 120 praças e localidades públicas do município de São Paulo, uma experiência que poderá ser validada para as demais cidades brasileiras. Neste caso, será necessária a inclusão, entre os recursos técnicos, o acesso a links direcionados à informação pública sobre as diferentes esferas e poderes.

Finalmente, as determinações do formato e conteúdo da informação pública como política pública, de produção e distribuição universal e gratuita, podem ter como origem o debate entre os diversos segmentos sociais — os partidos políticos, os sindicatos, as associações de classe e de moradores, os movimentos sociais — nos momentos da elaboração do Plano Plurianual e da Lei Orçamentária (CRFB, art. 164) das diferentes esferas de poder e do Estado. Evidentemente, é pressuposto que a elaboração da política pública para a informação pública deva ter clareza de objetivos e metas, e explícita quanto aos indicadores de avaliações do proposto e do realizado, em condições temporais de antes, depois e, sobretudo, na concomitância de sua execução.

Artigo colhido no sítio http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Uma-acao-para-a-esquerda-fazer-da-informacao-publica-um-bem-publico/4/33919

Close