Pico da inflação e desaceleração da economia devem frear ganhos salariais
O Dieese-PR promoveu nesta terça-feira, 23, a edição paranaense da VI Jornada Nacional de Debates. O evento contou com a participação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e de outras seis centrais sindicais e teve como tema principal as negociações salariais e o trabalho decente.
O palestrante do evento, José Álvaro Cardoso, supervisor técnico do escritório regional do Dieese em Santa Catarina, apresentou dados e informações sobre a atual conjuntura econômica mundial. Segundo ele, o Brasil tem desempenhado um bom papel no cenário econômico durante os últimos períodos da crise que vem se arrastando desde o final de 2008.
Para José Álvaro, alguns dos fatores que têm ajudado o país a enfrentar a crise são o aumento do volume de reservas cambiais, de 205 bilhões de dólares em 2008 para 350 bilhões em 2011; um maior volume de colchão de liquidez, que ajuda a controlar a inflação; uma solidez fiscal maior do que muitos países desenvolvidos, com uma dívida pública de 40% do PIB, enquanto o Japão, por exemplo, está com 80%; um mercado interno em expansão, com maior geração de empregos formais e elevação da renda média do trabalhador brasileiro; e um controle aparente da inflação.
As negociações salariais no primeiro semestre deste ano refletem esta relativa segurança que o Brasil tem alcançado. Das 353 negociações salariais realizadas nos seis primeiros meses de 2011, 93% conquistaram reajustes iguais ou superiores à inflação medida pelo INPC-IBGE – Índice Nacional de Preços ao Consumidor, calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. É o segundo melhor resultado registrado pelo DIEESE desde 2008, quando o Departamento passou a analisar os reajustes conquistados exclusivamente pelas unidades de negociação pertencentes a um painel controlado de categorias profissionais. Apenas em 2010, um ano excepcional para a economia e as negociações salariais brasileiras, a proporção de unidades de negociação com reajustes acima do INPC superou o apurado neste ano.
Negociações no 2º semestre serão mais difíceis
A previsão para o cenário no segundo semestre, no entanto, tende a ser menos animadora. A desaceleração da indústria, mesmo com o lançamento do programa “Plano Brasil Maior” pelo governo federal, um crescimento abaixo do esperado e o período do pico da inflação devem fazer com que os patrões tentem segurar ao máximo as conquistas dos trabalhadores por aumentos reais de salário. “Nos últimos anos, o aumento da produtividade dos trabalhadores está muito acima dos ganhos salariais. Estes ganhos não beneficiam os trabalhadores, geram apenas mais lucros aos patrões e a diminuição dos preços dos produtos para os consumidores”, explica José Álvaro.
O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, já mostrou que a postura contra os ganhos reais vai ser a tônica das negociações. Tombini declarou que os trabalhadores não devem reivindicar aumento real. “O que ele defende, na verdade, é que se calcule a inflação futura, que será gerada nos próximos meses, até março de 2012. Os trabalhadores têm que exigir que os salários sejam ajustados de forma a comportar os desajustes inflacionários do primeiro semestre”, afirma o supervisor técnico do Dieese de Santa Catarina.
Aumento real é bom para o Brasil
Segundo o Dieese, a força do mercado interno, fundamental para a atual conjuntura econômica do país, será fortemente afetada caso haja uma queda na renda da população, especialmente relacionada aos rendimentos do trabalho. Como o mundo está em crise, uma redução no poder de compra dos brasileiros significaria menos consumo, o que pode comprometer as próprias empresas em atividade no Brasil. “Os aumentos reais de salários significam continuidade do processo de incremento geral dos salários do país, que ainda são muito baixos até em relação a outros países emergentes. Enquanto os salários forem baixos se comparados a outros países, o próprio desenvolvimento do país estará comprometido”, garante Sandro Silva, técnico do Dieese do Paraná.
O setor financeiro é um dos que mais lucrou nos seis primeiros meses de 2011. Os bancários, que já estão em Campanha Salarial em todo o país, reivindicam um aumento real de 5%. As negociações com o sindicato patronal devem começar nos primeiros dias de setembro. “O setor financeiro, assim como o de comércio e serviços, mesmo com toda esta crise, ainda se encontra em um momento de crescimento. É só ver o grande aumento dos lucros de todos os bancos neste primeiro semestre. O aumento real é mais do que direito dos trabalhadores, é dever dos patrões destes setores pagarem”, ressalta José Álvaro.
No setor agrícola, há apontamentos na direção de que este ano, devido ao desempenho do setor, haja um maior aumento na renda dos ocupados. Já para os servidores públicos, segundo o Dieese, as negociações devem ser bem mais duras, devido ao ajuste fiscal do governo. Nos estados e municípios, a previsão é de que com o aumento na arrecadação, os salários também sejam ajustados.
O setor que deve ter mais dificuldades nas negociações salariais neste segundo semestre é o da indústria, especialmente nos segmentos intermediários. Segundo o Dieese, a concorrência externa devido à valorização do real deve servir de argumento para que os patrões aleguem que os reajustes salariais irão pressionar ainda mais os custos e assim diminuir a competitividade.
Conferências regionais sobre trabalho decente
Além das questões salariais, o emprego decente foi outro tema bastante discutido na VI Jornada de Debates. A realização da 1ª Conferência Nacional do Trabalho Decente, que irá ocorrer em maio de 2012, tem mobilizado os trabalhadores e as centras sindicais na discussão sobre o tema.
No Paraná, a Conferência Estadual será entre os dias 24 e 29 de novembro, em Curitiba. Antes disso, porém, estão sendo realizados encontros regionais em todo o estado. Sandro Silva, técnico do Dieese-PR, explica que a participação e o envolvimento dos trabalhadores é muito importante para fortalecer o debate e o diálogo social. “A Conferência vai ser tripartite, reunindo governo, empresários e trabalhadores. É preciso que as pessoas saibam que o trabalho decente não se restringe às questões de trabalho escravo. É bem mais do que as condições mínimas que o trabalhador precisa”, explica.
Para Regina Perpétua Cruz, dirigente sindical da CUT, as questões sobre o trabalho decente ainda tem muito a expandir. “Um exemplo são os bancários, que convivem diariamente com as metas abusivas. Não dá pra dizer que um ambiente que tenha tanta pressão, como os bancos, tenha um trabalho decente”, afirma.
A Agenda Nacional do Trabalho Decente se estrutura a partir de 3 prioridades: gerar mais e melhores empregos, com igualdade de oportunidades e de tratamento; erradicar o trabalho escravo e eliminar o trabalho infantil, em especial em suas piores formas; fortalecer os atores tripartites e o diálogo social , como um instrumento de governabilidade democrática.
O objetivo da Conferência é promover a discussão do tema emprego e trabalho decente, visando a formulação de proposta da política nacional de trabalho decente, bem como a atualização do respectivo plano e agenda de trabalho.
Confira as datas e os locais dos encontros regionais sobre trabalho decente no Paraná:
REGIONAL | DATA | LOCAL |
SUDOESTE | 30/09/2011 | Pato Branco |
OESTE | 07/10/2011 | Cascavel |
NOROESTE | 20/10/2011 | Maringá |
NORTE | 21/10/2011 | Londrina |
CURITIBA/LITORAL | 27/10/2011 | Curitiba |
CENTRO SUL | 28/10/2011 | Ponta Grossa |
ESTADUAL | 24 e 25/11/2011 | Curitiba |
Por: Cicero Bittencourt