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A Central Única dos Trabalhadores e a defesa do trabalho decente na conjuntura da crise econômica

No Fórum Econômico de 2006, em Davos, Juan Samovia (Diretor geral da OIT) descreveu o que chamou de Crise Global do Emprego, caracterizada por um cenário mundial de altas taxas de desemprego, um processo crescente de informalidade e precarização das condições trabalho e o crescimento do contingente mundial de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza. “A falta contínua de oportunidades de trabalho decente, o investimento insuficiente e um nível de consumo excessivamente baixo provocam a erosão do contrato social básico sobre o qual repousa a sociedade democrática, a saber, que todos devem participar do progresso.” (Juan Somavia, Diretor Geral da OIT)

Desde a década de 80, o modelo econômico neoliberal e o processo de globalização vêm agravando estas condições. Apesar das altas taxas de crescimento econômico mundial, com médias acima de 5% nos anos anteriores a 2008, o processo de concentração de renda continuou a produzir baixas taxas de criação de emprego e acentuando a precarização das condições de trabalho.

Partindo do pressuposto de que o trabalho é a condição primordial para a superação deste cenário, somente através da geração de novos empregos com condições dignas será possível eliminar a pobreza e a exclusão social que atingem os povos. Não bastará criar novos postos de trabalho, é necessário que eles garantam ao trabalhador renda suficiente para superar a situação de pobreza, ambiente e condições de segurança e saúde. No conceito da OIT, trabalho decente é qualquer ocupação produtiva e adequadamente remunerada, exercida em condições de liberdade, equidade e segurança e que seja capaz de garantir uma vida digna para as todas as pessoas. No Brasil, a Agenda Nacional de Trabalho Decente se estrutura a partir de três prioridades:

– Prioridade 1 – Gerar Mais e Melhores Empregos, com igualdade de oportunidades e de tratamento.

– Prioridade 2 – Erradicar o Trabalho Escravo e eliminar o Trabalho Infantil, em especial em suas piores formas.

– Prioridade 3 – Fortalecer os Atores Tripartites e o Diálogo Social, como um instrumento de governabilidade democrática.

A Central Única dos Trabalhadores, CUT Brasil, tem trabalhado em todos os seus espaços de penetração e sido voz ativa destas prioridades, mas é preciso salientar que nossa Central Sindical vai além delas, trabalhando em outras frentes para conquistarmos o Trabalho Decente no Brasil:

Geração de emprego

O Brasil vive um momento de crescimento econômico que tem garantido a diminuição das taxas de desemprego. A CUT tem atuado de maneira intransigente pela garantia e ampliação dos direitos trabalhistas, lutando contra a informalidade neste cenário de geração de novos postos de trabalho. No ano passado a CUT lançou a Campanha Nacional pela Redução da Jornada de Trabalho. O objetivo da campanha é reunir o maior número possível de atores sociais em torno da proposta de redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais, sem redução de salário. A redução garantirá a criação de estimadamente 2,2 milhões de novos postos de trabalho. Além da geração de emprego, a redução será um eficiente instrumento de distribuição de renda e de melhoria da qualidade de vida dos trabalhadores.

Valorização da renda

Uma das políticas mais bem sucedidas da CUT nos últimos tempos, em conjunto com as demais centrais sindicais brasileiras, foi o acordo assinado com o governo em 2006 que garantirá uma política constante de valorização do salário mínimo que teve um reajuste de 12% neste ano, garantindo aos brasileiros o maior salário mínimo em reais dos últimos 45 anos (fonte: Ipea/Dieese).

Luta contra a precarização das relações de trabalho

A CUT lançou, também no ano passado, uma campanha contra a terceirização no Brasil, cujo lema é Precarizar Não! O objetivo da campanha é levar o debate a toda a sociedade e dar subsídios aos seus sindicatos, levando até os locais de trabalho, informações sobre os riscos da terceirização que retira direitos dos trabalhadores, para que possam acompanhar em suas bases os processos e intervir através da conscientização dos trabalhadores e das mesas de negociação coletiva.

A pauta da campanha é seguinte: 1) Direito à informação e negociação prévia com os sindicatos dos trabalhadores; 2) Proibição da terceirização na atividade-fim; 3) Responsabilidade solidária da empresa contratante pelos direitos trabalhistas e previdenciários; 4) Igualdade de direitos e de condições de trabalho; 5) Penalização das empresas infratoras.

Proteção social

A CUT tem participado das discussões a cerca da previdência, discutindo com o governo, com os trabalhadores de sua base e com a sociedade mecanismos que garantam maior proteção ao trabalhador aposentado através de uma previdência pública universal. Temos também participado das discussões e das negociações por políticas públicas que garantam a todos os trabalhadores o acesso à saúde, educação e cultura, entre outros. Em 2007 e 2008, a CUT realizou uma jornada de debates por todo o país e construiu um documento com orientações para os governos nas diversas instâncias, sobre as políticas públicas que os trabalhadores defendem para garantir um crescimento com desenvolvimento e inclusão social.

Erradicação do Trabalho Infantil e Escravo

O movimento sindical, de maneira especial os trabalhadores rurais, junto com outras organizações da sociedade civil e movimentos populares, tem se unido ao poder público na luta pela erradicação do trabalho infantil e escravo, fiscalizando empresas públicas e privadas, conscientizando a população e buscando desenvolver projetos para reintegração dos trabalhadores ao mercado em condições dignas, capacitação dos trabalhadores e pela integração das crianças ao ambiente escolar.

Diálogo social

A CUT tem participado ativamente junto com as demais centrais sindicais brasileiras, das discussões junto ao Governo e a Sociedade organizada, com o objetivo de defender os direitos que já foram conquistados e de construir em conjunto políticas que garantam a ampliação dos direitos dos trabalhadores e de melhores condições de vida para todos os cidadãos. Faz parte também da atuação da CUT, a participação em diversos conselhos de órgãos estatais como BNDES, FGTS, FAT, onde a atuação da central é fundamental para garantir que os recursos utilizados e ações desenvolvidas signifiquem ganhos para os trabalhadores.

Ratificação das Convenções da OIT

Um das principais lutas que a CUT tem empreendido nos últimos anos é o projeto de ratificação das Convenções 151 (que garante a direito de negociação coletiva aos servidores públicos) e 158 (que proíbe as demissões imotivadas). Os dois projetos se encontram no Congresso Nacional e a CUT tem acompanhado ativamente seu andamento.

Porém, além de destacar acima algumas das linhas gerais de ação da CUT, na perspectiva da Agenda do Trabalho Decente, gostaríamos de apresentar uma visão do momento atual e dos desafios que estamos enfrentando no Brasil no cenário da crise mundial atual. Apesar do consenso que existe de que a crise é mundial, precisamos fazer um recorte especial para analisar seus efeitos no Brasil, que vive nos últimos anos um período de crescimento econômico com geração de emprego.

O bom desempenho da economia brasileira entre 2004 e 2008 alicerçou-se, em grande medida, na expansão do mercado interno via incremento do crédito e de medidas de distribuição de renda, especialmente as políticas de valorização do salário mínimo e o Programa Bolsa Família. Em conseqüência, expandiu-se a contratação de empregos formais nos diversos setores da atividade econômica e iniciou-se um processo de recuperação dos salários em geral, por meio das negociações coletivas.

A CUT desempenhou um papel fundamental para este cenário positivo. Baseada nas diretrizes firmadas em suas Plenárias e Congressos, várias têm sido as iniciativas, propostas, articulações e mobilizações realizadas pela Central na defesa do desenvolvimento com geração de emprego e renda.

Os trabalhadores brasileiros têm claro que a crise atual é grave e estrutural, é uma crise do sistema que explora os trabalhadores, que concentra renda e que condena milhões à fome e à miséria. Este sistema, desde as últimas décadas do Século 20, tem se guiado por políticas de liberalização financeira e comercial. O resultado desta liberdade sem controles foi um processo de “financeirização” sem limites, cuja expressão é a existência de um fosso entre a riqueza produzida na forma de papéis (títulos públicos, ações e derivativos) e a riqueza real alcançada pela produção e pelo trabalho.

Os efeitos da crise financeira internacional sobre a economia brasileira já começam a se fazer sentir, como o anúncio de férias coletivas, demissões e a suspensão dos investimentos programados em setores importantes de nossa economia. Portanto, é fundamental uma intervenção rápida, correta e decisiva dos governos e da sociedade brasileira para impedir que estes efeitos se espraiem, interrompendo bruscamente o processo de crescimento econômico.

A CUT entende que a superação da crise não pode significar a “socialização das perdas” do setor financeiro com a sociedade em geral. Em um cenário de crise, os trabalhadores são certamente as maiores e primeiras vítimas, por meio da perda do emprego e da rápida queda do nível de renda, dando inicio a espiral econômica negativa: diminuição do consumo, queda da produção, redução do nível de atividade, desemprego e/ou temor da perda do emprego, que provoca mais retração do consumo e de investimentos. Equação perversa para todos os brasileiros.

O governo brasileiro tem adotado medidas para salvaguardar o funcionamento do sistema de crédito e da liquidez das empresas no Brasil com vistas a preservar da crise a economia real. A CUT defende que estas medidas sejam obrigatoriamente acompanhadas de contrapartidas para o Estado e os trabalhadores, como a manutenção do nível de emprego e da renda.

A manutenção do crescimento e sua sustentabilidade é um anseio de toda a sociedade brasileira, mas ela pode ser fortemente obstacularizada pela falta de compromisso de governos estaduais e municipais e de empresários dos diversos setores, que vêem ainda no “rentismo” a forma mais fácil de acumular riqueza.

No período do crescimento recente, o que se percebeu no Brasil foi uma grande acumulação de ganhos expressa nos gigantescos lucros anuais dos bancos e de diversas empresas e no aumento real das receitas tributárias dos governos federal, estaduais e municipais.

Diante deste diagnóstico e das posições históricas da CUT, estamos propondo que os governos federal, estaduais, municipais e os setores empresarias, em conjunto com os trabalhadores, cumpram sua responsabilidade na superação da crise. Isso só será possível com o fortalecimento do mercado interno, portanto, estamos falando em manutenção e ampliação do emprego e da renda.

Neste sentido, as propostas de “flexibilização” de direitos trabalhistas, de redução de salário, de suspensão do contrato de trabalho, e outras medidas desse tipo que têm sido propostas por parte do empresariado, vão na direção contrária do que acreditamos ser o caminho correto. Muito antes, o governo federal tem a política fiscal e tributária para utilizar, o que em certa medida já vem fazendo, mas ainda tem muito a fazer; os governos estaduais têm em suas mãos, instrumento tributário para beneficiar a produção e os serviços e os empresários têm reservas ganhas ao longo dos últimos anos de bonança para continuarem os investimentos. Prova disto é o constante e permanente anúncio de distribuição de dividendos para os acionistas paradoxalmente por empresas que vem propondo aos trabalhadores redução de salário.

É verdade que o desenvolvimento do mercado de ações e o surgimento das sociedades de capital aberto beneficiaram a atividade produtiva, uma vez que liberam o empresário da necessidade de possuir sozinho todo o capital necessário para sua atividade. É verdade também que um dos atrativos do investimento em empresas de capital aberto é a distribuição de dividendos. Mas também é verdade que a menor distribuição ou a retenção de dividendos pode significar a realização de novos investimentos ou a integralização de capital, sem a necessidade de recorrer a terceiros, resultando em um aumento de ganho dos acionistas no futuro. É isto que a economia brasileira precisa neste momento.

Cabe terminar enfatizando que a retomada do crescimento pressupõe também uma nova forma de tratamento de gestão de governo. É fundamental discutir e deliberar, em fóruns democráticos coordenados pelo governo, os principais caminhos a serem trilhados. Trata-se de valorizar a difícil engenharia da negociação entre as representações de classe e do setor público. Neste contexto, a CUT, com seu perfil de luta, propositiva e de negociação, vem exercendo um importante papel.

Por Jacy Afonso de Melo, que é trabalhador bancário no Banco do Brasil e secretário de Finanças da CUT Brasil.

ARTIGO COLHIDO NO SÍTIO www.diap.org.br.

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