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O Senhor Mercado tem motivo para estar ansioso agora

Política monetária voltada à estabilização da inflação no médio prazo pode provocar desestabilização no longo prazo ao sobrevalorizar ativos, diz analista

História revela que período precedente de estabilidade nos preços não basta para impedir quedas macroeconômicas graves

MARTIN WOLF
COLUNISTA DO “FINANCIAL TIMES”

UM DOS professores do megainvestidor americano Warren Buffett, Benjamin Graham, costumava avisar a seus alunos que o tal de “Senhor Mercado” é neurótico: seus estados de humor oscilam entre o otimismo incrível e a depressão avassaladora. No momento, ele está mudando da despreocupação para a ansiedade, e, por isso, dos bens de risco para o dinheiro vivo ou até mesmo para o clássico da proteção: o ouro.

O Sr. Mercado tem razões para estar ansioso. A combinação atual de preços altos a muito altos de bens reais (como imóveis e ações); de uma diferença baixa de bens de risco sobre bens sem risco (por exemplo, títulos corporativos e do mercado emergente sobre títulos do Tesouro americano); a alta dos preços reais de commodities (especialmente o petróleo) e as mudanças enormes nos padrões de poupança, investimentos e finanças em todo o mundo (conforme manifestadas nos “desequilíbrios” globais e no endividamento crescente dos setores familiares, especialmente nos EUA) são bons motivos para nervosismo.

Sucesso gera excesso

Por que os mercados chegaram a sua posição exposta atual? A resposta é que o sucesso gera excessos. É esse o argumento do novo e fascinante artigo de William White, assessor econômico do Bank for International Settlements.

White argumenta que uma política monetária voltada à estabilização da inflação no médio prazo pode muito bem provocar desestabilização no longo prazo. As mudanças benéficas advindas na economia mundial -a queda dos preços do petróleo após 1985, a redução dos preços de computadores e comunicações, a queda dos preços de bens manufaturados da China e a liberalização das economias- reduziram as pressões inflacionárias.

Isso tudo justificou a adoção de políticas monetárias de acomodação. Mas estas ajudaram a fazer explodir uma série de bolhas de preços de bens nos sistemas financeiros liberalizados, especialmente no Japão nos anos 1980, nas economias de mercado emergentes -especialmente as da Ásia oriental- no final dos anos 1990, e, finalmente, nas economias de alta renda da América do Norte e da Europa.

Num ambiente de inflação baixa, foram aplicados ainda mais estímulos monetários para lidar com as conseqüências de cada queda nos preços de ativos. Em última análise, porém, podem ser necessários a inflação ou baixas contábeis em grande escala para fazer o valor da renda, dos bens e da dívida voltarem ao normal.

Lição da história

Uma coisa a história deixa clara, como observa White: “Um período precedente de estabilidade dos preços não basta para evitar quedas macroeconômicas graves”. Não ocorreu inflação alta antes da Grande Depressão dos anos 1930, da década perdida do Japão nos anos 1990 ou das crises dos mercados emergentes asiáticos em 1997 e 1998. O que precedeu todos esses acontecimentos extremos foram booms de investimento, movidos pelo crédito, numa era de inflação estável.

Para White, “uma combinação de transformações tecnológicas e desregulamentação levou a um processo acelerado de desintermediação dos bancos, dependência crescente dos processos de mercado, globalização e consolidação institucional. Em outras palavras, hoje temos um sistema financeiro liberalizado que parece apresentar tendência muito maior a manifestar tendências de boom e quedas”.

“Animado pelo otimismo justificado provocado por algum fato particular, é oferecido crédito, o que provoca a alta dos preços de bens relacionados. Isso ao mesmo tempo incentiva os investimentos fixos e aumenta os valores colaterais, o que, por sua vez, promove a expansão ainda maior do crédito. Com o tempo, e fortalecido por um aumento associado na produção, esse processo conduz a uma disposição crescente a assumir riscos (“exuberância irracional), o que confere ímpeto ainda maior aos ciclos de crédito. Mais tarde, quando as expectativas exageradas de risco e retorno acabam se frustrando, o processo inteiro entra em modo inverso”, diz White sobre a sucessão de booms e quedas.

Quanto mais longa a fase de estabilidade macroeconômica, maiores serão os prováveis excessos de investimento e contração de empréstimos.

Três perguntas

Essa análise levanta três perguntas. Ela é correta? Se é, o que nos diz sobre a situação atual? E que lições devem ser tiradas disso em termos de política econômica?

A resposta à primeira pergunta é que a história é plausível. As últimas duas décadas e meia foram marcadas por uma série de crises financeiras precedidas por crédito fácil e investimentos excessivos. Uma das respostas adotadas tem sido a adoção de uma política monetária ainda menos restritiva. Uma resposta igualmente interessante, especialmente no leste da Ásia, tem sido o retorno à dependência das taxas de câmbio competitivas e do crescimento pelas exportações. Nesse caso, porém, o aumento da dívida sobre o qual se baseia o crescimento desses países ocorre em outros países -sobretudo nos EUA.

A resposta à segunda pergunta é que esse processo pode continuar por muito tempo com baixa inflação. Só se chega ao limite a partir do momento em que a inflação se torna uma preocupação séria. Isso pode ser um fator de risco agora. A alternativa é que ela possa ser um risco para um país de moeda vulnerável, como os EUA. A alta dos preços do ouro e outras commodities sugere que os temores de inflação podem estar aumentando.

A resposta à terceira pergunta não é tão clara. White sugere que se reconsidere o estabelecimento de metas estreitas para a inflação. O regime atual garante resistência limitada a altas exageradas de confiança.

Mas o período prolongado de inflação e produção estáveis que boa parte do mundo vem desfrutando constitui argumento contra a adoção de mudanças radicais no regime econômico. Os distúrbios no sistema financeiro podem ser administrados, argumentam os defensores da ortodoxia atual, desde que a inflação seja mantida sob controle.

Tendo a pensar que os responsáveis pela política econômica deveriam levar em conta os desequilíbrios financeiros emergentes, incluindo o aumento do endividamento, quando traçam a política monetária. De qualquer maneira, o investidor sábio não pode ignorar fatos como esses. Na fase de expansão, o Sr. Mercado, eufórico, sempre vai ignorar o acúmulo de riscos.

Cedo ou tarde, porém, ele se dará conta dos riscos e imediatamente começará a entrar em pânico. É isso o que ele está fazendo agora. Afinal, ele é humano.

ARTIGO COLHIDO NO SÍTIO www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi2405200609.htm.

Por 20:40 Notícias

O Senhor Mercado tem motivo para estar ansioso agora

Política monetária voltada à estabilização da inflação no médio prazo pode provocar desestabilização no longo prazo ao sobrevalorizar ativos, diz analista
História revela que período precedente de estabilidade nos preços não basta para impedir quedas macroeconômicas graves
MARTIN WOLF
COLUNISTA DO “FINANCIAL TIMES”
UM DOS professores do megainvestidor americano Warren Buffett, Benjamin Graham, costumava avisar a seus alunos que o tal de “Senhor Mercado” é neurótico: seus estados de humor oscilam entre o otimismo incrível e a depressão avassaladora. No momento, ele está mudando da despreocupação para a ansiedade, e, por isso, dos bens de risco para o dinheiro vivo ou até mesmo para o clássico da proteção: o ouro.
O Sr. Mercado tem razões para estar ansioso. A combinação atual de preços altos a muito altos de bens reais (como imóveis e ações); de uma diferença baixa de bens de risco sobre bens sem risco (por exemplo, títulos corporativos e do mercado emergente sobre títulos do Tesouro americano); a alta dos preços reais de commodities (especialmente o petróleo) e as mudanças enormes nos padrões de poupança, investimentos e finanças em todo o mundo (conforme manifestadas nos “desequilíbrios” globais e no endividamento crescente dos setores familiares, especialmente nos EUA) são bons motivos para nervosismo.
Sucesso gera excesso
Por que os mercados chegaram a sua posição exposta atual? A resposta é que o sucesso gera excessos. É esse o argumento do novo e fascinante artigo de William White, assessor econômico do Bank for International Settlements.
White argumenta que uma política monetária voltada à estabilização da inflação no médio prazo pode muito bem provocar desestabilização no longo prazo. As mudanças benéficas advindas na economia mundial -a queda dos preços do petróleo após 1985, a redução dos preços de computadores e comunicações, a queda dos preços de bens manufaturados da China e a liberalização das economias- reduziram as pressões inflacionárias.
Isso tudo justificou a adoção de políticas monetárias de acomodação. Mas estas ajudaram a fazer explodir uma série de bolhas de preços de bens nos sistemas financeiros liberalizados, especialmente no Japão nos anos 1980, nas economias de mercado emergentes -especialmente as da Ásia oriental- no final dos anos 1990, e, finalmente, nas economias de alta renda da América do Norte e da Europa.
Num ambiente de inflação baixa, foram aplicados ainda mais estímulos monetários para lidar com as conseqüências de cada queda nos preços de ativos. Em última análise, porém, podem ser necessários a inflação ou baixas contábeis em grande escala para fazer o valor da renda, dos bens e da dívida voltarem ao normal.
Lição da história
Uma coisa a história deixa clara, como observa White: “Um período precedente de estabilidade dos preços não basta para evitar quedas macroeconômicas graves”. Não ocorreu inflação alta antes da Grande Depressão dos anos 1930, da década perdida do Japão nos anos 1990 ou das crises dos mercados emergentes asiáticos em 1997 e 1998. O que precedeu todos esses acontecimentos extremos foram booms de investimento, movidos pelo crédito, numa era de inflação estável.
Para White, “uma combinação de transformações tecnológicas e desregulamentação levou a um processo acelerado de desintermediação dos bancos, dependência crescente dos processos de mercado, globalização e consolidação institucional. Em outras palavras, hoje temos um sistema financeiro liberalizado que parece apresentar tendência muito maior a manifestar tendências de boom e quedas”.
“Animado pelo otimismo justificado provocado por algum fato particular, é oferecido crédito, o que provoca a alta dos preços de bens relacionados. Isso ao mesmo tempo incentiva os investimentos fixos e aumenta os valores colaterais, o que, por sua vez, promove a expansão ainda maior do crédito. Com o tempo, e fortalecido por um aumento associado na produção, esse processo conduz a uma disposição crescente a assumir riscos (“exuberância irracional), o que confere ímpeto ainda maior aos ciclos de crédito. Mais tarde, quando as expectativas exageradas de risco e retorno acabam se frustrando, o processo inteiro entra em modo inverso”, diz White sobre a sucessão de booms e quedas.
Quanto mais longa a fase de estabilidade macroeconômica, maiores serão os prováveis excessos de investimento e contração de empréstimos.
Três perguntas
Essa análise levanta três perguntas. Ela é correta? Se é, o que nos diz sobre a situação atual? E que lições devem ser tiradas disso em termos de política econômica?
A resposta à primeira pergunta é que a história é plausível. As últimas duas décadas e meia foram marcadas por uma série de crises financeiras precedidas por crédito fácil e investimentos excessivos. Uma das respostas adotadas tem sido a adoção de uma política monetária ainda menos restritiva. Uma resposta igualmente interessante, especialmente no leste da Ásia, tem sido o retorno à dependência das taxas de câmbio competitivas e do crescimento pelas exportações. Nesse caso, porém, o aumento da dívida sobre o qual se baseia o crescimento desses países ocorre em outros países -sobretudo nos EUA.
A resposta à segunda pergunta é que esse processo pode continuar por muito tempo com baixa inflação. Só se chega ao limite a partir do momento em que a inflação se torna uma preocupação séria. Isso pode ser um fator de risco agora. A alternativa é que ela possa ser um risco para um país de moeda vulnerável, como os EUA. A alta dos preços do ouro e outras commodities sugere que os temores de inflação podem estar aumentando.
A resposta à terceira pergunta não é tão clara. White sugere que se reconsidere o estabelecimento de metas estreitas para a inflação. O regime atual garante resistência limitada a altas exageradas de confiança.
Mas o período prolongado de inflação e produção estáveis que boa parte do mundo vem desfrutando constitui argumento contra a adoção de mudanças radicais no regime econômico. Os distúrbios no sistema financeiro podem ser administrados, argumentam os defensores da ortodoxia atual, desde que a inflação seja mantida sob controle.
Tendo a pensar que os responsáveis pela política econômica deveriam levar em conta os desequilíbrios financeiros emergentes, incluindo o aumento do endividamento, quando traçam a política monetária. De qualquer maneira, o investidor sábio não pode ignorar fatos como esses. Na fase de expansão, o Sr. Mercado, eufórico, sempre vai ignorar o acúmulo de riscos.
Cedo ou tarde, porém, ele se dará conta dos riscos e imediatamente começará a entrar em pânico. É isso o que ele está fazendo agora. Afinal, ele é humano.
ARTIGO COLHIDO NO SÍTIO www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi2405200609.htm.

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