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Por 21:22 Notícias

Afinal, quem são nossos verdadeiros heróis ?

Cabe a Lula aproveitar sua popularidade para sedimentar valores democráticos, republicanos e de uma sociedade sem desigualdades. E verdade seja dita: as duas categorias mencionadas pelo presidente, ministros e usineiros, não são, definitivamente, compostas de heróis nacionais !
É claro que sempre haverá alguém a argumentar que o problema é a severa perseguição exercida pelas elites de nosso país, que ainda não engoliram a eleição de um ex-operário, por dois mandatos consecutivos, para a Presidência da República. E que, para tanto, se utilizam dos meios de comunicação para uma estratégia de desgaste permanente da imagem de Lula, como homem público e como dirigente político. Sem dúvida, a “marcação cerrada” exercida pelos órgãos de informação e divulgação sobre ele é evidente e não deveria haver espaço para vacilação ou deslize por parte de quem se sabe alvo permanente.
Essa postura dos órgãos da grande imprensa, porém, não representa muita novidade. Desde antes da vitória ainda em 2002 todos sabíamos qual seria o cenário a enfrentar, caso a vitória nas urnas se concretizasse. Pelo contrário, o que aconteceu foi uma espécie de ingenuidade de setores ligados ao governo, que imaginavam poder adquirir um pouco mais de complacência desse setor, por meio de benesses e homenagens aos proprietários das grandes redes de informação. Felizmente, ao que tudo indica, Lula percebeu a necessidade que o País apresenta do fortalecimento de uma alternativa de comunicação pública e estatal, árdua tarefa que tudo indica, a partir de agora, será delegada a Franklin Martins.
Mas o ponto desse artigo é a revelação, efetuada por Lula, do conceito surpreendente a respeito de quem são, a seu ver, os heróis nacionais. Pois é, em um intervalo de menos de uma semana, o Presidente fez as seguintes declarações:
“Quando eu fico vendo os ministros que ganhavam muito bem virem ganhar R$ 7.000, R$ 8.000, eu falo: esses são heróis. Alguns pagam para ser ministros” (16/3)
“Os usineiros de cana, que há dez anos eram tidos como se fossem os bandidos do agronegócio neste país, estão virando heróis nacionais e mundiais, porque todo mundo está de olho no álcool. E por quê? Porque têm políticas sérias. E têm políticas sérias porque quando a gente quer ganhar o mercado externo, nós temos que ser mais sérios, porque nós temos que garantir para eles o atendimento ao suprimento” (20/3)
No primeiro caso, quando fazia menção aos “ministros heróis”, Lula se referia àqueles que poderiam, no seu entender, ganhar até 70 mil reais na iniciativa privada, mas não! Abdicam de tudo isso, compreendem o apelo do ex-torneiro mecânico e partem para o sacrifício. Resignam-se a aceitar a nomeação para o cargo de Ministro e terminam pagando para trabalhar, com salários tão mais baixos. Lula certamente se referia a pessoas como o Presidente do BC Henrique Meirelles (alguém aí consegue imaginar quantos zeros existem na remuneração do cargo de presidente internacional do Bank of Boston?), o ex-Ministro Furlan (Presidente do Conselho de Administração de um dos maiores grupos empresarias do País, a Sadia, desde 1993), o ex-Ministro Roberto Rodrigues (excelso representante dos interesses do grande agro-negócio à frente da pasta da Agricultura), o Senador e Ministro Hélio Costa (cujas relações com a Rede Globo são bastante conhecidas de todos) ou o novo Ministro Miguel Jorge (com currículo exibindo ampla experiência e vivência na fina flor do nosso mundo industrial, financeiro e comunicativo). É tão grande o desprendimento em relação ao ganho material e tamanha a devoção à causa pública desses senhores, que chega a me provocar emoção. Tais pessoas devem realmente passar anos em Brasília, perdendo tempo e dinheiro, tudo em nome das causas de um governo cuja hegemonia política seria exercida pelo Partido dos Trabalhadores. Verdadeira síntese de altruísmo e heroísmo.
No segundo caso, Lula se referia a um termo que ainda chega a causar um certo desconforto, dependendo do contexto e do local em que é mencionado. Os usineiros. A se levar a sério as palavras do Presidente da República, a versão contemporânea dos senhores de engenho do século XXI não mais merece críticas por seu comportamento em termos econômicos, sociais ou trabalhistas. Eles agora foram guindados à categoria de “heróis mundiais”. Considero desnecessário descer muito em detalhes, aqui, a respeito das condições em que se dá a organização, a produção e a comercialização da cana de açúcar e de seus derivados em boa parte do território nacional.
Segundo o dicionário Houaiss, herói pode ser definido como:
a) indivíduo notabilizado por seus feitos guerreiros, sua coragem, tenacidade, abnegação, magnanimidade etc;
b) indivíduo capaz de suportar exemplarmente uma sorte incomum (p.ex., infortúnios, sofrimentos) ou que arrisca a vida pelo dever ou em benefício de outrem;
c) indivíduo notabilizado por suas realizações.
Como Presidente da República, Lula pode e deve reconhecer publicamente os feitos e as qualidades de seus colegas de ministério ou de setores da sociedade que podem ser importantes para uma recuperação econômica estratégica do Brasil, inclusive em termos de ampliação de sua presença no mercado internacional. É o caso do etanol.
No entanto, exatamente em função da sua elevada popularidade e carisma, acredita-se ele deva contribuir permanentemente para elevar o nível de consciência e conhecimento da maioria da população a respeito de nossa história e de nossos problemas atuais. O exemplo e a influência das falas de Lula no imaginário popular não devem ser menosprezados. Caberia a ele se aproveitar dessa condição para ir sedimentando valores democráticos, republicanos e de uma sociedade sem desigualdades. E verdade seja dita: as duas categorias acima mencionadas não são, definitivamente, compostas de heróis nacionais!
Os verdadeiros heróis nacionais são a grande maioria de brasileiros e brasileiras que vivem em patamares de extrema pobreza, justamente aquelas famílias cuja ajuda mensal fornecida pelos programas de transferência do governo federal pesa, e muito, no final do mês. Os verdadeiros heróis nacionais são os trabalhadores urbanos e rurais que produzem a riqueza de nosso País, recebendo em troca salários bastante reduzidos e péssimas condições de trabalho (haja vista a elevada taxa de mortalidade e de acidentes de trabalho, por exemplo, dos trabalhadores na cana de açúcar). Os verdadeiros heróis nacionais são os idosos e aposentados do INSS, que em sua grande maioria recebem apenas um salário mínimo mensal. Os verdadeiros heróis nacionais são os desempregados e trabalhadores do setor informal, que superam mês após mês em condições precaríssimas de sobrevivência.
Lula conhece bem tais fenômenos. Ele viveu essa realidade. Caberia agora apontar alguma esperança para que não se eternize entre nós a triste resignação de que “não tem mesmo jeito”, pois estaríamos todos fadados ao destino traçado por Mário de Andrade, com a incorporação de Macunaíma, “o herói sem nenhum caráter”, como símbolo da brasilidade. Um primeiro passo seria romper com esse recorrente encantamento e idolatria frente ao desempenho das nossas elites. Sair da postura da criança fascinada pelo super-herói, para o reconhecimento objetivo de quem contribui de fato para a construção da riqueza de nosso País.
Por Paulo Kliass, que é doutor em Economia e membro da carreira federal “Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental”. Atualmente cumpre programa de pós-doutorado na Université de Paris 13, França.
ARTIGO COLHIDO NO SÍTIO www.agenciacartamaior.com.br.

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Afinal, quem são nossos verdadeiros heróis ?

Cabe a Lula aproveitar sua popularidade para sedimentar valores democráticos, republicanos e de uma sociedade sem desigualdades. E verdade seja dita: as duas categorias mencionadas pelo presidente, ministros e usineiros, não são, definitivamente, compostas de heróis nacionais !

É claro que sempre haverá alguém a argumentar que o problema é a severa perseguição exercida pelas elites de nosso país, que ainda não engoliram a eleição de um ex-operário, por dois mandatos consecutivos, para a Presidência da República. E que, para tanto, se utilizam dos meios de comunicação para uma estratégia de desgaste permanente da imagem de Lula, como homem público e como dirigente político. Sem dúvida, a “marcação cerrada” exercida pelos órgãos de informação e divulgação sobre ele é evidente e não deveria haver espaço para vacilação ou deslize por parte de quem se sabe alvo permanente.

Essa postura dos órgãos da grande imprensa, porém, não representa muita novidade. Desde antes da vitória ainda em 2002 todos sabíamos qual seria o cenário a enfrentar, caso a vitória nas urnas se concretizasse. Pelo contrário, o que aconteceu foi uma espécie de ingenuidade de setores ligados ao governo, que imaginavam poder adquirir um pouco mais de complacência desse setor, por meio de benesses e homenagens aos proprietários das grandes redes de informação. Felizmente, ao que tudo indica, Lula percebeu a necessidade que o País apresenta do fortalecimento de uma alternativa de comunicação pública e estatal, árdua tarefa que tudo indica, a partir de agora, será delegada a Franklin Martins.

Mas o ponto desse artigo é a revelação, efetuada por Lula, do conceito surpreendente a respeito de quem são, a seu ver, os heróis nacionais. Pois é, em um intervalo de menos de uma semana, o Presidente fez as seguintes declarações:

“Quando eu fico vendo os ministros que ganhavam muito bem virem ganhar R$ 7.000, R$ 8.000, eu falo: esses são heróis. Alguns pagam para ser ministros” (16/3)

“Os usineiros de cana, que há dez anos eram tidos como se fossem os bandidos do agronegócio neste país, estão virando heróis nacionais e mundiais, porque todo mundo está de olho no álcool. E por quê? Porque têm políticas sérias. E têm políticas sérias porque quando a gente quer ganhar o mercado externo, nós temos que ser mais sérios, porque nós temos que garantir para eles o atendimento ao suprimento” (20/3)

No primeiro caso, quando fazia menção aos “ministros heróis”, Lula se referia àqueles que poderiam, no seu entender, ganhar até 70 mil reais na iniciativa privada, mas não! Abdicam de tudo isso, compreendem o apelo do ex-torneiro mecânico e partem para o sacrifício. Resignam-se a aceitar a nomeação para o cargo de Ministro e terminam pagando para trabalhar, com salários tão mais baixos. Lula certamente se referia a pessoas como o Presidente do BC Henrique Meirelles (alguém aí consegue imaginar quantos zeros existem na remuneração do cargo de presidente internacional do Bank of Boston?), o ex-Ministro Furlan (Presidente do Conselho de Administração de um dos maiores grupos empresarias do País, a Sadia, desde 1993), o ex-Ministro Roberto Rodrigues (excelso representante dos interesses do grande agro-negócio à frente da pasta da Agricultura), o Senador e Ministro Hélio Costa (cujas relações com a Rede Globo são bastante conhecidas de todos) ou o novo Ministro Miguel Jorge (com currículo exibindo ampla experiência e vivência na fina flor do nosso mundo industrial, financeiro e comunicativo). É tão grande o desprendimento em relação ao ganho material e tamanha a devoção à causa pública desses senhores, que chega a me provocar emoção. Tais pessoas devem realmente passar anos em Brasília, perdendo tempo e dinheiro, tudo em nome das causas de um governo cuja hegemonia política seria exercida pelo Partido dos Trabalhadores. Verdadeira síntese de altruísmo e heroísmo.

No segundo caso, Lula se referia a um termo que ainda chega a causar um certo desconforto, dependendo do contexto e do local em que é mencionado. Os usineiros. A se levar a sério as palavras do Presidente da República, a versão contemporânea dos senhores de engenho do século XXI não mais merece críticas por seu comportamento em termos econômicos, sociais ou trabalhistas. Eles agora foram guindados à categoria de “heróis mundiais”. Considero desnecessário descer muito em detalhes, aqui, a respeito das condições em que se dá a organização, a produção e a comercialização da cana de açúcar e de seus derivados em boa parte do território nacional.

Segundo o dicionário Houaiss, herói pode ser definido como:

a) indivíduo notabilizado por seus feitos guerreiros, sua coragem, tenacidade, abnegação, magnanimidade etc;
b) indivíduo capaz de suportar exemplarmente uma sorte incomum (p.ex., infortúnios, sofrimentos) ou que arrisca a vida pelo dever ou em benefício de outrem;
c) indivíduo notabilizado por suas realizações.

Como Presidente da República, Lula pode e deve reconhecer publicamente os feitos e as qualidades de seus colegas de ministério ou de setores da sociedade que podem ser importantes para uma recuperação econômica estratégica do Brasil, inclusive em termos de ampliação de sua presença no mercado internacional. É o caso do etanol.

No entanto, exatamente em função da sua elevada popularidade e carisma, acredita-se ele deva contribuir permanentemente para elevar o nível de consciência e conhecimento da maioria da população a respeito de nossa história e de nossos problemas atuais. O exemplo e a influência das falas de Lula no imaginário popular não devem ser menosprezados. Caberia a ele se aproveitar dessa condição para ir sedimentando valores democráticos, republicanos e de uma sociedade sem desigualdades. E verdade seja dita: as duas categorias acima mencionadas não são, definitivamente, compostas de heróis nacionais!

Os verdadeiros heróis nacionais são a grande maioria de brasileiros e brasileiras que vivem em patamares de extrema pobreza, justamente aquelas famílias cuja ajuda mensal fornecida pelos programas de transferência do governo federal pesa, e muito, no final do mês. Os verdadeiros heróis nacionais são os trabalhadores urbanos e rurais que produzem a riqueza de nosso País, recebendo em troca salários bastante reduzidos e péssimas condições de trabalho (haja vista a elevada taxa de mortalidade e de acidentes de trabalho, por exemplo, dos trabalhadores na cana de açúcar). Os verdadeiros heróis nacionais são os idosos e aposentados do INSS, que em sua grande maioria recebem apenas um salário mínimo mensal. Os verdadeiros heróis nacionais são os desempregados e trabalhadores do setor informal, que superam mês após mês em condições precaríssimas de sobrevivência.

Lula conhece bem tais fenômenos. Ele viveu essa realidade. Caberia agora apontar alguma esperança para que não se eternize entre nós a triste resignação de que “não tem mesmo jeito”, pois estaríamos todos fadados ao destino traçado por Mário de Andrade, com a incorporação de Macunaíma, “o herói sem nenhum caráter”, como símbolo da brasilidade. Um primeiro passo seria romper com esse recorrente encantamento e idolatria frente ao desempenho das nossas elites. Sair da postura da criança fascinada pelo super-herói, para o reconhecimento objetivo de quem contribui de fato para a construção da riqueza de nosso País.

Por Paulo Kliass, que é doutor em Economia e membro da carreira federal “Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental”. Atualmente cumpre programa de pós-doutorado na Université de Paris 13, França.

ARTIGO COLHIDO NO SÍTIO www.agenciacartamaior.com.br.

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