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BNDES: cláusula social e agenda do desenvolvimento

A decisão do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social de modificar os seus contratos a fim de que explicitem o respeito a direitos sociais como condição para contratar, assim como a inclusão da cláusula de vencimento de contrato para as empresas onde for verificada a prática de atos discriminatórios, é uma vitória dos trabalhadores e de toda a sociedade brasileira. É uma medida que estampa com maior nitidez o significado do Estado retomar o seu papel protagônico em favor da coletividade e, com mais ênfase, dos mais vulneráveis à ação predatória do capital.

Com a medida, o Banco coloca em prática os dispositivos da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) 2007: “Art. 101. § 7o, segundo o qual as agências financeiras oficiais de fomento deverão: II – observar a diretriz de redução das desigualdades de gênero, raça, etnia, geracional, regional e de pessoas com deficiência, na definição da política de aplicação de seus recursos; e III – publicar relatório anual do impacto de suas operações de crédito no combate as desigualdades mencionadas no inciso anterior”. Além disso, o artigo 101 §1º explicita que “É vedada a concessão ou renovação de quaisquer empréstimos ou financiamentos pelas agências financeiras oficiais de fomento a: (…) IV –instituições cujos dirigentes sejam condenados por assédio moral, racismo ou trabalho escravo.

A inclusão de condições impeditivas à contratação de empresas em que já tenha sido verificada a prática de atos de discriminação de raça ou de gênero, de trabalho infantil e de trabalho escravo, mediante a existência de ato administrativo comunicado por entidade oficial de controle ou de sentença condenatória transitória em julgado, é uma cláusula social inovadora que coloca o Estado como agente ativo da mudança, indutor de políticas públicas promotoras de justiça. Com a mesma concepção, foi incluída a cláusula de vencimento de contrato onde sejam verificadas tais práticas. Por mais lógica e natural que a medida pareça, com ares de unanimidade pelas premissas apontadas, é bom salientar que ela só foi materializada após frutífero debate, no qual a representação dos trabalhadores no Conselho de Administração do BNDES jogou papel determinante.

Mais do que crescimento econômico, é preciso que o desenvolvimento passe a ser visto cada vez mais como algo integral, e diga respeito não apenas aos cifrões econômicos, mas também à melhoria das condições de vida e trabalho, à geração de emprego e distribuição de renda, considerando as especificidades das comunidades impactadas. Assim, diferentemente dos anos tucanos em que o maior banco de fomento do mundo foi desvirtuado e deformado pelos neoliberais e privatistas para financiar a entrega do patrimônio público nacional aos cartéis estrangeiros, hoje o BNDES é um dos sólidos alicerces do PAC (Programa de Aceleração da Economia), determinando, para além dos novos investimentos em infra-estrutura, indispensáveis para a construção de um Brasil próspero e desenvolvido, contrapartidas socioambientais para a aplicação destes vultosos recursos. Dinheiro público que passa a ser aplicado não mais no desmantelamento do Estado, de seu fatiamento e entrega à voracidade das transnacionais, mas investido na capacidade criativa do seu legítimo dono, o povo brasileiro, e também na integração latino-americana, que deixa o campo da retórica para se consolidar no plano energético, fortalecendo a nossa soberania e a nossa autonomia frente aos países centrais.

Infelizmente, inconformados com os avanços obtidos, setores da mídia continuam silenciando sobre os progressos alcançados. O BNDES encerrou o ano de 2006 com níveis recordes de desembolsos e de aprovações de financiamentos. Conforme já divulgado, mas ainda convenientemente bastante desconhecido do grande público, as liberações de recursos no ano passado somaram R$ 52,3 bilhões, com aumento de 11,3% sobre os R$ 47 bilhões desembolsados em 2005. O crescimento real dos desembolsos, descontada a inflação, que ficou em torno de 4% no exercício, atingiu 7%. Ainda nos números: a taxa de investimento saiu há dois anos do patamar de 18% do PIB e está hoje em 20,5%, sendo que para os financiamentos a projetos de menor porte, as liberações de recursos são mais rápidas, como é o caso da aquisição de máquinas e equipamentos.

Com vistas a garantir as condições para a manutenção e ampliação do ritmo de crescimento, o BNDES desembolsou R$ 4,825 bilhões para o setor elétrico no período de 12 meses, até outubro passado, montante 7% superior ao registrado em igual período anterior. No total, os desembolsos do BNDES chegaram a R$ 66,6 bilhões em 12 meses, o que representa alta de 12%. As aprovações somaram R$ 88,9 bilhões, um crescimento de 39% na comparação com o mesmo período anterior. Os desembolsos nos 10 primeiros meses do ano somaram R$ 49,8 bilhões, valor 40% superior ao do mesmo período de 2006. As liberações para infra-estrutura atingiram R$ 20,6 bilhões, alta de 75,5% de janeiro a outubro.

Transgredindo o receituário neoliberal e rompendo com sua camisa-de-força, a contundência das ações e a solidez dos números atestam que o BNDES está no caminho correto, dando uma contribuição exemplar para os demais entes públicos se somarem conosco nesta empreitada por desenvolvimento com justiça social. No entanto, reconhecer o avanço não significa desconhecer suas limitações. Como os projetos financiados pelo BNDES impactam de forma diferenciada a vida de homens e mulheres, negros e indígenas, a CUT e dezenas de entidades dos movimentos sociais sugerem a adoção de medidas que estabeleçam mecanismos de democratização e controle social, que sejam efetivadas com diálogo, transparência e segundo diretrizes estratégicas debatidas no Conselho de Administração do Banco. Identificado este desafio, propomos:

a) Apresentar para a sociedade civil que medidas o Banco já tomou (e vai tomar) no sentido de aplicar a diretriz de redução das desigualdades para os projetos já aprovados no ano de 2007 e para as novas solicitações de empréstimos, conforme determina a LDO 2007;

b) Construir mecanismos de monitoramento, participação e controle social em relação à aplicação das diretrizes da redução das referidas desigualdades;

c) Criar um mecanismo que vincule a liberação dos empréstimos à avaliação de impactos planejados e não planejados quanto às referidas desigualdades.

d) Criar nos seus programas de financiamento, um mecanismo que vincule futuros empréstimos a empresas já financiadas anteriormente à apresentação de resultados concretos de mudanças em termos da redução das desigualdades a partir do investimento realizado.

e) Estabelecer critérios de gênero e raça na contratação, promoção e política salarial dos seus funcionários inclusive através de ações afirmativas;

f) Financiar projetos que favoreçam a igualdade de raça, gênero e etnia.

g) Financiar projetos que fortaleçam os povos e comunidades indígenas e tradicionais do ponto de visto econômico e cultural, em áreas estratégicas como educação e saúde e do uso, manejo e conservação dos territórios e recursos naturais e outros. Nesse caso é necessários criar critérios claros e compatíveis de acesso e implementação dos recursos para garantir que os investimentos não exijam ou resultem em uma transformação cultural desses povos.

Defendidas pela representação dos trabalhadores, as propostas acima merecem ser abraçadas como um compromisso efetivo de todos em favor da classe trabalhadora, do sistema produtivo e do desenvolvimento nacional. Afinal, 56,7% dos recursos do BNDES são provenientes do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), imensas reservas acumuladas de trabalho e esforço dos que produzem.

Por João Felício, que é secretário de Relações Internacionais da CUT e representante da Central no Conselho de Administração do BNDES.

ARTIGO COLHIDO NO SÍTIO www.cut.org.br.

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