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Outro consenso é possível

Editorial da Revista do Brasil, edição número 30, dezembro de 2008.

Em perfil de Barack Obama publicado por esta revista em sua edição no 25, em junho, o articulista Flávio Aguiar observou que seria enganoso acreditar que uma eleição americana iria “mudar tudo”, mas que igualmente enganoso seria considerar tudo “farinha do mesmo saco”. Obama já teria feito a diferença independentemente de vencer a eleição, resumia Flávio. Há algumas semanas, logo após o resultado das urnas nos EUA, não foram poucas as manifestações de preocupação do tipo “espero que ele não decepcione”. E não será de estranhar que Obama venha a causar alguma decepção mais adiante. É o preço de uma vitória consagrada por tamanha expectativa de mudança. Entretanto, ainda que os governantes da vez sejam potencialmente pequenos diante das expectativas, o importante a registrar, mais que a troca do governo de turno, é a mudança das expectativas. A ascensão de figuras como Obama constituem um marco não apenas pelo mandatário escolhido, mas pelo fato de as escolhas resultarem de novos desejos do eleitorado.

No Brasil, por exemplo, tornou-se impensável imaginar um partido qualquer vencer uma eleição se desprezar programas sociais. Eles já fazem parte de uma nova conduta política e cultural que emergiu da democracia e começa a moldar uma nova sociedade. O preconceito racial não acabou, mas já se fala em punir com o banimento de um campeonato um time cuja torcida hostiliza um jogador pela cor de sua pele. Ainda há desigualdade nas relações de gênero, mas a Lei Maria da Penha já coíbe a violência em todas as classes.

A atual crise global, por sua vez, mexe com as expectativas das sociedades em relação à forma como elas funcionam economicamente. Na reunião dos países do chamado G-20, pela primeira vez desde a criação de organismos como o FMI e o Banco Mundial, há mais de meio século, houve consenso de que essas instituições precisam ser reformadas, assim como todo o sistema regulatório do mercado financeiro. Há não muito tempo, seria choradeira de país pobre. “A gente percebe que as pessoas tomaram chá de humildade”, avaliou Lula. Ele próprio está diante da oportunidade de liderar um grande diálogo nacional, no qual convirjam esforços em direção à continuidade do crescimento e do combate às desigualdades. Mas precisa o Estado deixar bem claro a quem ajuda, sejam indústrias, agricultores ou bancos, que o tempo de faturar com as benesses do poder público sem restituir ganhos para toda a sociedade já se foi. É esse o gesto – histórico, diga-se – que se espera do atual governo.

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As cartas estão na mesa

Os neoliberais, a despeito da desmoralização de suas idéias que levaram à crise, propõem contenção de gasto público, mas sem exageros, claro. Agora, socializem-se as perdas. Depois, abram alas para os lucros privados

A evolução da crise financeira internacional recolocou na ordem do dia os debates que tiveram forte influência sobre a política econômica no século 20. A crise de 1929, e seus reflexos sobre o desemprego na Europa e nos Estados Unidos, desencadeou um conjunto de medidas econômicas apoiadas em forte intervenção do Estado. Esse debate sobre a importância do papel do Estado na economia teve a decisiva contribuição do inglês John Maynard Keynes (1883-1946), que com sua Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda transformou-se no principal economista do século 20.

A incapacidade que a teoria econômica dominante tinha para explicar a Grande Depressão e o alto desemprego estimulou o debate. Keynes compreendeu o funcionamento do capitalismo e, ao contrário do que afirmava o pensamento dominante, afirmou que a economia não caminhava naturalmente para o pleno uso dos recursos, incluído aí o emprego dos trabalhadores. Os economistas clássicos e neoclássicos afirmavam que o mercado estava sempre em equilíbrio e produzia o máximo bem-estar social para toda a população de um país. A Grande Depressão dos anos 1930 desmentiu cabalmente essa teoria.

Em 1936 foi publicada a Teoria Geral, de Keynes. Foram muitas as contribuições para a política econômica a partir dessa obra. A que teve a maior influência no combate à Depressão, e se estende até os dias atuais, diz respeito ao papel do Estado. Keynes afirmava que o funcionamento da economia capitalista era instável, em razão do comportamento do investimento privado. Em momentos como aquele, somente o Estado, por intermédio do gasto público, poderia suprir a ausência de investimento privado e estimular a geração de renda e emprego.

O que parece óbvio, hoje, teve profundas implicações para a teoria e a política econômica nas décadas seguintes. Na crise de 1929, os Estados Unidos e a Europa levaram alguns anos para adotar medidas keynesianas no enfrentamento da crise, que se aprofundou. A recuperação econômica só ocorreu a partir da segunda metade dos anos 1930. A contribuição do pensamento do inglês foi muito além da formulação sobre o papel do Estado. Como funcionário do Tesouro britânico, Keynes foi um dos principais arquitetos do sistema financeiro internacional que emergiu após a Segunda Guerra. A criação do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial tem, em grande medida, sua assinatura.

Keynes foi um grande defensor da economia de mercado. Alguns chegam a confundir suas idéias com idéias socialistas. Nada mais equivocado. Seu pensamento ajudou a desvendar o funcionamento do capitalismo e trouxe o Estado para o palco público. A reação neoliberal dos anos 1970 teve o objetivo de minimizar esse papel, apostando em menos Estado e mais mercado.

O que isso tem a ver com os trabalhadores hoje? Quase tudo.

As medidas que estão sendo tomadas pelos Estados nacionais no enfrentamento da atual crise têm forte inspiração keynesiana. Pressupõe-se que o gasto e o déficit público são instrumentos decisivos para evitar uma nova depressão e mais desemprego. Contudo, sem as contribuições do pensamento de Keynes talvez não estivessem sendo tomadas neste momento.

No plano internacional, espera-se que avance a discussão de uma nova arquitetura financeira internacional. E, para o Brasil, qual o impacto do pensamento keynesiano no enfrentamento da crise? As cartas estão na mesa! Os liberais ortodoxos, a despeito da desmoralização de suas idéias de auto-regulação dos mercados, entoam cantigas repetitivas que nos levaram a essa enorme crise. Propõem, agora, a contenção dos gastos públicos. Sem exageros, é claro, já que ninguém é de ferro! Primeiro, socializem-se as perdas, e nada melhor que o Estado para isso. Quando a crise passar, deixem espaço para os lucros privados.

Para os trabalhadores, esse debate é decisivo para preservar os empregos e a renda e para a adoção de contrapartidas sociais. As opções não são neutras e podem comprometer o atual estágio de crescimento nos próximos anos, com efeitos sobre o desemprego e a piora das condições de vida da população.

Por Sérgio Mendonça.

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Bom para eles, ótimo para nós

Se o programa de Obama de controlar com novas leis o capital financeiro em seu país e fechar os paraísos fiscais for para valer, enfim algo que seria bom para os Estados Unidos o seria também para o Brasil

A recente crise global do capitalismo tem servido para novo balanço do poder das nações. O critério para definir a força das sociedades nacionais era o econômico: quanto maior o PIB – produção interna bruta anual – mais importante o país. A esses números era comum somar-se o poder de suas Forças Armadas e a produção de tecnologia. Há outros critérios, que começam a ser pesados: a dimensão territorial, os recursos naturais, a população. O Brasil se situa entre os cinco maiores países do mundo, ao lado de China, Estados Unidos (com população maior que a nossa), Rússia e Canadá. Fora do grupo está a Índia, de grande população, mas com a metade do território brasileiro. O Brasil é o que dispõe de mais biodiversidade e maior extensão de terras cultiváveis durante todas as estações do ano.

Do ponto de vista econômico dispomos de potencial mercado interno, que só agora, com as medidas distributivas do governo Lula, começa a ser explorado. Produzir para os próprios brasileiros, em primeiro lugar, deve ser o programa no momento de crise no comércio mundial. Foi o que fizeram os Estados Unidos, durante a Depressão, mediante o New Deal.

Mas não nos bastam grande população e extenso território se não formos capazes de construir um eficiente sistema de defesa do território, em que se combinem ações diplomáticas com esforços militares. No campo diplomático convém-nos estabelecer alianças na defesa de interesse comum, como estamos fazendo, no caso da Unasul, a união dos países da América do Sul. A soma do poder de defesa do continente sul-americano é respeitável. Podemos, facilmente, criar um Exército comum de mais de 2 milhões de homens e equipá-los com armas modernas em poucos anos. Na defesa do próprio território, um soldado vale por cinco invasores, como demonstrou a resistência heróica dos vietnamitas.

Não estamos tão atrasados na corrida tecnológica. Na produção de alimentos, o Brasil se encontra na vanguarda da tecnologia, graças aos pesquisadores da Embrapa. Perdemos a posição de vanguarda que então tínhamos com os centros de pesquisa da Telebrás, mas, felizmente, a grande empresa de estudos agropecuários conseguiu escapar da fúria privatizante de Fernando Henrique e seus auxiliares. Conseguimos, com a Embrapa, conservar e ampliar os conhecimentos sobre a natureza e preservação do solo, o aperfeiçoamento genético das sementes e dos animais de corte, as técnicas naturais de combate às pragas, os métodos de plantio. Estamos também adiantados nos estudos de medicina, na engenharia da genética humana, na pesquisa com células-tronco. Nossos cientistas têm produzido trabalhos de grande valor, sem falar nos pesquisadores brasileiros que, tendo sido compelidos a deixar o Brasil nos últimos decênios, vêm surpreendendo os centros internacionais com sua competência.

O que tem sido a nossa tragédia são parcelas de nossas elites, que insistem em agachar-se diante dos estrangeiros. Isso sem falar nos ladrões habituais, que se associam aos banqueiros internacionais para saquear o povo brasileiro. Nos que se associam aos especuladores internacionais para atacar nossas reservas, nos peculatários e sonegadores que assaltam o Tesouro e remetem o dinheiro para o Exterior e o repatriam para mais uma vez especular, no ciclo interminável de exploração dos brasileiros. Nesse episódio da crise, estamos vendo que o governo agiu com rapidez para proteger o sistema, liberando os bancos do depósito compulsório. Mas os bancos, em lugar de empregar o dinheiro para financiar a produção e evitar a recessão, como era o projeto, usam-no para comprar títulos do Tesouro e especular no mercado cambial, enfraquecendo o real.

O senhor Juracy Magalhães ficou famoso ao dizer que o que era bom para os Estados Unidos era também bom para o Brasil. Estava enganado, naquele momento. Mas, se o programa de Obama de controlar com novas leis o capital financeiro em seu país e fechar os paraísos fiscais – a fim de obrigar as empresas a pagar impostos justos – for para valer, o bom para os Estados Unidos será ótimo para o Brasil.

Por Mauro Santayana.

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