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Por 17:38 Sem categoria

Em Gaza a lei é outra

Pena de morte para os autores de crime contra a humanidade. Isto é estabelecido na lei penal em vigor no estado de Israel.

Israel não tem constituição escrita. O seu sistema judiciário está baseado na Common Law e no antigo direito otomano. Quanto à pena de morte, o país não aceitou a moratória proposta para as Nações Unidas. Assim, continua a vigorar a pena capital, aplicável aos autores “de crimes contra a humanidade” e, também, “contra o povo hebreu”.

Ao matar civis inocentes na faixa de Gaza, Israel comete, seguramente, crimes contra a humanidade. De se frisar, no particular, a morte de quase uma centena de crianças. E de se lamentar a justificativa apresentada pela ministra de relações exteriores, Tzipi Livni, uma ex-agente do Mossad (serviço de espionagem de Israel) que aspira o cargo de premier pelo partido Kadima. Para Livni, essa tragédia é algo circunstancial numa guerra.

Caso tivesse firmado o tratado de Roma, do qual nasceu o Tribunal Penal Internacional, os governantes israelenses e os comandantes do Tsahal (exército) seriam seguramente processados e condenados.

Com efeito. Nos últimos sete anos, membros e simpatizantes do Hamas, uma organização nascida em 1987 depois da primeira intifada cunhada por estudantes da palestina Universidade de Bir Zeit, despejaram em território de Israel mais de 7 mil foguetes “qassan”, que além de danos materiais e insegurança, mataram cerca de 20 israelenses.

Os “qassan” são preparados artesanalmente. Levam o nome de um líder palestino dos anos 30 e, com carga explosiva de 5 a 10 kg, alcançam distância a variar entre 3 a 10 km. Os disparos dos “qassan” voltaram com mais intensidade após 19 de dezembro último, quando expirado o prazo da trégua de seis meses intermediada pelo Egito.

Para responder às provocações do Hamas, -que não reconhece o estado de Israel e já explodiu camicases para matar hebreus e turistas-, o governo do primeiro-ministro Ehud Olmert optou, a partir de 27 de dezembro passado, por uma desproporcional reação militar, a descaracterizar a legítima defesa.

Por ironia, o estado de Israel adota a pena de morte contra autores de crimes contra a humanidade e contra o povo hebreu. No caso da atual operação militar na faixa de Gaza, denominada “Chumbo Certo ” (tradução livre), foi esquecido até o estabelecido na própria legislação de Israel.

A matança promovida por Israel, por evidente, não resolverá a questão palestina. Ajudará, no entanto, a expandir o anti-semitismo, a enfraquecer governos árabes moderados e estimulará as organizações adeptas do fundamentalismo de matriz terrorista.

Pelo que se começa a saber, a operação em Gaza foi preparada bem antes do fim da trégua, com 007 e aviões-espias, sem pilotos, a recolherem elementos para o adestramento dos soldados. E a operação tem nítidos objetivos eleitorais, no sentido de reverter a tendência favorável ao direitista Likud: a eleição está marcada para 10 de fevereiro próximo e já se fala em adiamento.

Depois do fracasso bélico de 2006 contra o Hezbollah no sul do Líbano, da corrupção do primeiro-ministro Olmert, da consolidação e do fortalecimento do Hamas na faixa de Gaza, a coalizão formada pelos partidos Kadima, Trabalhista, Shas e Gil, ficou débilitada. E nem pode aceitar, em outubro de 2008, a renúncia de Olmert, pelo risco de antecipação das eleições.

Diante da tragédia ocorrida com os hebreus na Segunda Guerra, a incluir campos de concentração, holocausto (shoá), guetos, silêncio do papa Pio XII, etc, a Organização das Nações Unidas (ONU), com base numa sua resolução de novembro de 1947, entendeu em dividir a Palestina em dois estados, ou seja, um árabe e outro hebraico.

Assim, nasceu o estado de Israel, proclamado em 14 de maio de 1948, apesar da reprovação dos árabes que, nesse mesmo ano, deram início à primeira guerra contra o novo estado. Seguiram-se três outras guerras, em 1956, 1967 e 1973, e duas intifadas (revolta das pedras), em 1987 e 2000.

Talvez essa retrospectiva tenha levado o consagrado escritor Amoz Oz, professor de literatura na Universidade Bem Gurion, a concluir que os conflitos entre israelenses e palestinos não podem ser vistos como uma guerra de religião ou um choque de culturas. Para Oz, trata-se de uma conflito pela posse de terras, a ser resolvido por entendimentos e não pela via militar.

Outra questão que o governo israelense não considerou é a demográfica. E ela obriga a entendimentos, compromissos, concessões, busca de paz duradoura e cessões territoriais. Essa questão não passou despercebida, em 2005, por Ariel Sharon, influenciado pelos dados demográficos apresentados professor Sérgio Della Pergola, catedrático na Universidade de Jerusalém e autor de levantamentos anuais sobre a população hebraica no mundo.

Em 2005, Israel contava com 10,5 milhões de habitantes, sendo 50% de hebreus. Os árabes nascidos em Israel atingiam 1,3 milhões e os palestinos nesse mesmo território somavam 3,3 milhões. E mantida a tendência demográfica, Della Pergola, conforme lembrado na última quarta-feira pelo intelectual e escritor italiano Sérgio Romano, revelava que, até 2050, a número de hebreus cairia para 35% do total da população.

No ano de 2006, Sharon teve um ictus cerebral e, em estado de coma, deixou o comando do governo, sucedido pelo seu vice Ehud Olmert, ex-prefeito de Jerusalém. Este, por duas vezes, opta pela linha militarização, que até o duro Sharon resolvera deixar para trás.

Embora a guerra na faixa de Gaza possa garantir vitória eleitoral contra o fundamentalista partido Likud, Israel, internacionalmente, só perde ao desprezar fundamentais valores humanos.

Por Wálter Fanganiello Maierovitch, que é jurista e professor.

Artigo publicano no blog Sem Fronteiras do Terra Magazine.

ARTIGO COLHIDO NO SÍTIO www.construindoumnovobrasil.com.br.

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