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Em duas ações, 58 pessoas são libertadas de trabalho escravo aqui no Paraná

Grupo móvel da Região Sul encontrou trabalhadores submetidos a situações extremamente precárias (até em curral, sem acesso à água potável) em três fazendas nos municípios de Cerro Azul (PR), Bituruna (PR) e Palmas (PR)

Trabalhadores dormindo em curral, sem acesso a instalações sanitárias, desprovidos de água potável e de equipamentos de proteção individual (EPIs). Sem qualquer direito trabalhista. Foram essas as condições que os fiscais do grupo móvel de fiscalização e combate ao trabalho escravo da Região Sul encontraram em duas operações diferentes, entre os dias 29 de outubro e 5 de novembro. O grupo é composto por procuradores do trabalho, auditores fiscais do trabalho e agentes da Polícia Federal (PF).

A primeira fiscalização aconteceu no município de Cerro Azul (PR), a cerca de 80 km da capital Curitiba (PR). Na ocasião, foram libertados 40 trabalhadores que prestavam serviços na Fazenda Pinhal Grande. O grupo estava no local há cerca de seis meses, atuando no corte de madeira (pinus). As vítimas foram contratadas por subempreiteiros em municípios próximos à fazenda. Ficou caracterizada a terceirização ilegal, comum na região.

Os proprietários das terras com pinus costumam vender a madeira sem executar o trabalho de extração, ou seja, os compradores acabam se responsabilizando acerca do contrato dos trabalhadores para retirar o produto. “O setor patronal defende a venda da floresta em pé. Eu sou contra por causa das condições trabalhistas a que são submetidos os empregados. Sempre aparecem contratos para isentar o proprietário do vínculo trabalhista”, argumenta Gláucio Araújo de Oliveira, da Procuradoria Regional do Trabalho da 9ª Região (PRT-9), que acompanhou a operação do grupo móvel.

As árvores de pinus da Fazenda Pinhal Grande foram vendidas por U$S 18 milhões em 2003 para a Brasil Timber Ltda, conforme a fiscalização. Pelo contrato, a empresa retiraria o produto por um período de 15 anos. “A Timber não tem empregados. Só tem um pequeno escritório em Curitiba e conta com acionistas americanos”, acrescenta Gláucio.

A empresa Brasil Timber revendeu a floresta em pé para trabalhadores rurais que se tornaram subempreiteiros e também para um ex-prefeito de Itaperuçu (PR). Os compradores, por sua vez, aliciaram trabalhadores. Porém, foi apurado que os contratos de compra eram forjados. Os supostos compradores não têm idoneidade econômica para arcar com o pagamento para extrair a madeira e nem para arcar com as despesas trabalhistas. Segundo o procurador, “ficou claro que eles não eram os reais empregadores”.

As verbas trabalhistas foram pagas pela empresa Brasil Timber no dia 29 de outubro. A mesma, porém, não arcou com as verbas referentes ao dano moral individual e coletivo e por isso o procurador deve ajuizar uma ação cívil pública para conseguir os pagamentos na Justiça. “Os subempreiteiros assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), se comprometendo a não aliciar os trabalhadores. Já a Timber não quis assinar”, relata Gláucio.

Os trabalhadores estavam alojados em barracos de lona, com chão de terra batida. No local, não havia instalações sanitárias, nem fornecimento de água potável. Também não havia água nas frentes de trabalho. Os empregados recebiam por produção e tinham que pagar pela alimentação. Em dias de chuva, ficavam sem trabalhar, mas tinham que arcar com os custos das refeições, que eram descontados dos salários. Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) não foram fornecidos pelos empregadores e ninguém tinha registro na Carteira de Trabalho e da Previdência Social (CTPS). “Havia trabalhadores operando a motosserra sem curso”, complementa o procurador.

Bituruna e Palmas

Na Fazenda Santo Antônio do Itarim, localizada em Bituruna (PR), três trabalhadores alojados num curral e outros seis que viviam em barraca de lona (com chão de terra batida) foram libertados de trabalho análogo à escravidão. Eles trabalhavam na colheita de erva-mate.

“Era uma situação clássica de trabalho escravo, com trabalhadores sem acesso a direito algum”, resume Gláucio Araújo de Oliveira, procurador da PRT- 9 que também acompanhou esta ação. Os alojamentos improvisados não dispunham de instalações sanitárias e não havia água potável à disposição.

Os trabalhadores são moradores de municípios próximos da fazenda e foram aliciados por um intermediário há cerca de dois meses. O empregador não assinou a carteira de trabalho das vítimas. O pagamento era feito por produção e o valor total tinha descontos referentes aos adiantamentos, que eram utilizados pelas vítimas para a compra de alimentos.

Já na Fazenda Tiberê, localizada no município de Palmas (PR), a fiscalização do trabalho flagrou outras 9 vítimas em regime de escravidão contemporânea. “Neste caso, não houve intermediário. O próprio fazendeiro contratou os trabalhadores”, retala o procurador. A carteira de trablho dos empregados, que prestavam serviços há dois anos no local, era assinada.

Segundo o procurador Gláucio, esse último grupo de empregados foi libertado por causa das condições extremamente precárias do alojamento e do meio ambiente de trabalho. O alojamento era uma casa de madeira em péssimas condições de higiene e conservação, sem instalações sanitárias. Os trabalhadores também não tinham acesso à água potável.

Por Bianca Pyl.

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Reparo em dado do IBGE não esconde concentração de terras

Brasil possui uma das estruturas mais desiguais do mundo. Enquanto pequenos lotes com menos de 10 hectares ocupam 2,7% da soma de propriedades rurais, grandes fazendas com mais de 1 mil hectares concentram 43% do total

O grau de concentração de terras no país está praticamente inalterado desde 1985, ano que marca o início da redemocratização brasileira. Segundo o 10º Censo Agropecuário 2006, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o índice de Gini – indicador da desigualdade no campo – registra 0,854 pontos, patamar próximo aos dados verificados nas duas pesquisas anteriores: 0,856 (1995-1996) e 0,857 (1985). Quanto mais perto essa medida está do número 1, maior é a concentração na estrutura fundiária.

O mais recente indicador foi oficializado em 5 de novembro, após um “recálculo” do IBGE. Em nota publicada no site da instituição, a diretoria de pesquisas corrigiu o dado inicial do censo, divulgado no final de setembro. O instituto informara na ocasião que o índice de Gini atingia 0,872 pontos, o que representava um crescimento de 1,9% na média nacional.

“O valor correto da área total dos estabelecimentos agropecuários é 0,854”, sustenta a nota. Mesmo após a mudança, o novo índice confirma a estrutura agrária nacional como uma das mais desiguais do mundo. Enquanto os estabelecimentos rurais de menos de 10 hectares ocupam 2,7% da soma de propriedades rurais, as grandes fazendas com mais de 1 mil hectares concentram 43% da área total. Ao todo, cerca de 5,2 milhões de propriedades agropecuárias ocupam 36% do território nacional.

Antes da retificação no processamento dos dados, o gerente do Censo Agropecuário do IBGE, Antonio Carlos Florido, havia declarado ao jornal Folha de S. Paulo que a maior concentração não era “necessariamente algo ruim”, já que a terra era explorada por quem tinha capital para investir, o que seria um dos motivos do ganho de produtividade do campo.

No entanto, o próprio Censo Agropecuário identifica problemas relacionados à concentração de terras. “Tanto no Nordeste, como, mais recentemente, no Centro-Oeste, a desigualdade vem acompanhando o processo de modernização produtiva e inserção ao competitivo mercado mundial de commodities agrícolas”, afirma o relatório. Essa desigualdade é mais elevada em Alagoas, onde o índice de Gini atinge 0,871 pontos, seguido por Mato Grosso (0,865) e Maranhão (0,864). Os maiores aumentos, contudo, ocorreram em Tocantins (9,1%), São Paulo (6,1%) e Mato Grosso do Sul (4,1%).

Como “potencializadores” desse processo, sobretudo no Centro-Oeste, o IBGE cita a produção em grande escala de grãos, como a soja e o milho, além da expansão mecanizada do algodão e da incorporação de áreas em direção à fronteira agropecuária ao Norte de Mato Grosso. “A monocultura da soja ou do binômio soja-milho, além do algodão, fez por reforçar a desigualdade que marcava a propriedade da terra em uma região historicamente ocupada por uma pecuária ultraextensiva”, diz o documento.

O Centro-Oeste concentra o menor número de propriedades rurais (317,5 mil) e a maior área (103,8 milhões de hectares), implicando numa área média de 327 hectares. Já o Nordeste detém o maior número de estabelecimentos (2,4 milhões) e a menor área média (31 hectares). Em relação ao total de propriedades, cerca de 47% têm menos de 10 hectares, enquanto aquelas com mais de 1 mil hectares representam cerca de 1% do total.

Fronteira agrícola

O período abrangido pelo censo – intervalo entre 1995/1996 e 2006 – foi marcado pela incorporação de tecnologias na estrutura produtiva e pela forte expansão do agronegócio, beneficiado pelo ciclo expansivo do comércio agrícola internacional. A nova conjuntura econômica, porém, não democratizou o histórico “fosso” no perfil fundiário do país.

“Chama a atenção a confirmação de um movimento que já era esperado: o avanço do agronegócio para a fronteira da Amazônia. Esse é um dado muito claro. Tanto que a Região Norte atualmente já participa com 17% da atividade agropecuária. Em 1970, era só 8%”, explica o agrônomo Gerson Teixeira, que foi presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra) entre os anos de 2000 a 2002. O especialista elaborou uma análise dos dados agregados do setor apresentados no Censo Agropecuário 2006.

A Região Norte foi a maior responsável pela expansão do rebanho bovino, com aumento do plantel de 14 milhões de cabeças (81%). De 1996 para 2006, a participação desse rebanho no total nacional saltou de 11% para 18%. Em 1980, era de apenas 3%. As pastagens se estendem como uma frente pecuarista para o interior do Pará, com o município de São Félix do Xingu (PA) contabilizando um dos maiores rebanhos do país. A criação de bovinos é a atividade mais comum no campo. Segundo o IBGE, o rebanho nacional chegou a 171,6 milhões de cabeças em dezembro de 2006.

As pastagens plantadas expandem-se para o Norte, e a lavoura aumenta mais no Centro-Oeste. A área cresceu 5,8 milhões de hectares (39,7%) na Região Norte, sobretudo em Rondônia (1,9 milhão de hectares) e no Pará (3,2 milhões de hectares). As áreas de lavouras permanentes também se expandiram em maiores escalas no Centro-Oeste (188%) e no Norte (155%).

As duas regiões foram as que apresentaram, também, as maiores taxas de expansão de áreas com lavouras temporárias, ficando o Norte em primeiro (89%) e o Centro-Oeste em segundo lugar (82%). Houve ainda uma redução de 12,1 milhões de hectares (-11%) nas áreas com matas e florestas contidas em estabelecimentos agropecuários em relação a 1996. Foram menos 6,8 milhões de hectares no Norte, concentrados em Rondônia e Pará, e 3,2 milhões de hectares no Centro-Oeste, sobretudo no Mato Grosso.

Capital estrangeiro

Para Gerson, a concentração verificada pelo IBGE reflete três processos ligados diretamente à entrada do capital estrangeiro. Ele cita a expansão dos agrocombustíveis, em especial do etanol, a corrida de capitais na compra de terras em países em desenvolvimento com potencial agrícola – movimento detectado pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO) -, e a formação do mercado de carbono, que também teria direcionado investimentos com expectativa de especulação.

“A legislação que está em vigor não é eficaz para fazer a regulação das formas de penetração do capital estrangeiro na compra de terras no Brasil”, argumenta o agrônomo. O Programa Terra Legal, criado neste ano pelo governo, determina que os proprietários beneficiados podem vender os seus títulos de posse apenas para brasileiros na Amazônia Legal. Além disso, o presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart, também já defendeu publicamente o estabelecimento de um limite para o tamanho da propriedade rural no país.

Nesse cenário de valorização da terra, o IBGE detectou a continuidade do êxodo rural. Em 1996, a população rural era de 33,9 milhões de pessoas (22% do total). Em 2006, esse índice caiu para 28,7 milhões (equivalente a 15% da população). “É muito acentuado”, surpreende-se Gerson. O agrônomo sustenta que o êxodo foi alimentado, basicamente, pelo abandono de atividade agrícola. “Não foi por falta de recurso, mas pela inadequação das políticas ofertadas, que acabam acelerando a saída da turma do campo”.

O pessoal ocupado nos estabelecimentos agropecuários, em 2006, foi de 16,5 milhões de pessoas; um contingente 1,3 milhão inferior ao registrado em 1996. Embora a soma de suas áreas represente apenas 30% do total, os lotes inferiores a 200 hectares responderam por 84% das pessoas ocupadas nas propriedades rurais. Quase 12 milhões tiveram empregos temporários em 2006 (até 180 dias no ano). Mais de 1 milhão de crianças com menos de 14 anos de idade trabalhavam no campo.

Agricultura familiar

O fluxo em direção às cidades, analisa o agrônomo, está articulado com o “sumiço” de propriedades menores de 10 hectares (mini agricultura familiar), sobretudo nas Regiões Norte e Nordeste. No Norte, essas pequenas propriedades, que ainda representam 27% do número total de estabelecimentos da região, perderam 25% do seu território (124 mil hectares) de 1996 a 2006. No Nordeste, a perda de área nessa faixa foi de 325 mil hectares (-8%). Segundo ele, os dados desse estrato evidenciam a continuidade do processo de concentração que vem desde a década de 1980.

“É um processo de definhamento muito grave”, afirma Gerson. “Do ponto de vista político, significa que toda política de estímulo à agricultura familiar não está gerando o efeito esperado”. A agricultura familiar, complementa, está perdendo participação na geração de renda: a atividade patronal gera 66% da renda, e a familiar, 34 %. “O valor bruto da produção teve média de R$ 3 mil no ano só em estabelecimentos pequenos. É um retrato da situação de risco para esse segmento da base”, adiciona.

Segundo o pesquisador, os dados do IBGE mostram que a política agrária não conseguiu atingir o seu principal objetivo no país. “O programa de reforma agrária passou a ter um caráter peculiar no Brasil, que é o de ser reativo aos conflitos. Como a concentração de terras se manteve, é possível afirmar que o programa não assumiu dimensão redistributiva. É sinal de que o programa de reforma agrária não teve eficácia no seu principal propósito”.

Ocupações

Como reação à concentração, cresce o número de ocupações de terra, principalmente em São Paulo. A expansão da cana-de-açúcar em terras paulistas está traduzida em números: o estado atingiu a marca de 60% da produção nacional em 2006. Levantamento do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária (Nera), ligado à Universidade Estadual Paulista (Unesp), indica que foram registradas, no primeiro semestre de 2008, 36 ocupações com a participação de 2.414 famílias no estado. No mesmo período de 2009, houve 68 ocupações, que mobilizaram 4.096 famílias.

O estudo do Nera, elaborado pelos pesquisadores Tomás Sombini Druzian e Nallígia Tavares de Oliveira, observa um aumento da luta contra o agronegócio. “Esta é a contradição estrutural da questão agrária no capitalismo hoje: os movimentos socioterritoriais lutam pela terra tanto na fronteira agrícola na Amazônia, onde o agronegócio desterritorializa camponeses e indígenas, como no estado de São Paulo, onde o agronegócio está consolidado e enfrenta as ações dos movimentos camponeses”, diz a análise. Já o Censo de 2006 coloca que a especialização em lavouras “modernizadas” de cana-de-açúcar no estado “repele” o produtor com menor grau de capitalização.

Expansão

Nesse contexto de fortalecimento do agronegócio, a soja foi a cultura que mais cresceu nos últimos dez anos, registrando um aumento de 88% na produção e 69% na área colhida. Isso representa uma expansão de 6,4 milhões de hectares, em grande parte no Centro-Oeste. Os dados do IBGE mostram que esse crescimento acelerado se deu à base de produtos geneticamente modificados. Cerca de 46% dessas propriedades utilizaram sementes transgênicas, com uso disseminado de agrotóxicos nas lavouras.

As dívidas também se multiplicam. Cerca de 91% dos produtores apontaram os bancos como uma das fontes de recursos e 85% receberam dinheiro de programas governamentais. As propriedades com 1 mil ou mais hectares captaram 43% dos recursos, mesmo representando apenas 0,9% do total de estabelecimentos que obtiveram financiamentos. As unidades que possuem menos de 100 hectares representam 36% da dívida contabilizada.

Metade dos proprietários que obtiveram financiamento declararam ter como finalidade o “custeio”. O “investimento” aparece em segundo lugar, com 40%. Já o item “manutenção” foi declarado por 8% dos estabelecimentos. As propriedades que têm como atividade principal a cana-de-açúcar ficaram com a maior participação no valor da produção agropecuária (14%), seguidos por aqueles que se dedicam prioritariamente ao cultivo de soja (14%), à criação de bovinos (10%) e ao cultivo de cereais (9%).

Por Maurício Reimberg.

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