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O tema da política econômica no processo eleitoral de 2010

Adital – O ano de 2010 é um ano eleitoral. É evidente, pelas análises dos principais jornais, que a campanha, na prática, começou desde o ano passado. Existe uma grande perspectiva de que se compare, no processo eleitoral, os oito anos do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso e os oito anos do governo do presidente Lula.

Do ponto de vista da política econômica, uma ampla maioria de analistas da imprensa nacional aponta aspectos de continuidade da política econômica do governo Lula em relação ao governo FHC. Esse tipo de análise, que insiste na continuidade entre os dois governos, desconsidera pontos fundamentais que mostrariam variações da política macroeconômica do período.

Nesse sentido, o próprio período de governo de FHC não foi uniforme: o segundo governo teve pouco a ver com o primeiro. Entre as principais diferenças estão a mudança na política cambial (com um câmbio quase fixo, passando ao sistema de câmbio flutuante no segundo mandato, após a crise cambial do final do ano 1998) e a mudança da política fiscal, com a prevalência dos superávits primários expressivos, que não eram verificados antes, sendo observados a partir dos acertos com o FMI na crise de 1998.

No que diz respeito ao governo Lula, as diferenças começaram antes da passagem do primeiro para o segundo mandato, quando, após o fim do acordo com o FMI (feito ainda no governo FHC e mantido pelo governo Lula), o governo alterou suas prioridades. A ênfase em contornar a vulnerabilidade externa, com o crescimento explosivo das exportações, e a lógica do ajuste, contida na política acertada com o FMI, vão dando lugar, progressivamente, a um discurso que prioriza o crescimento econômico, materializado tanto no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e seus projetos como, especialmente a partir da crise de 2008-2009, na flexibilização progressiva das metas fiscais, ampliando o espaço para os investimentos e os gastos públicos.

Assim, tratar a política econômica como uma absoluta continuidade, como se houvesse um único conjunto de políticas e medidas associado ao inicial Plano Real do governo Itamar, parece tão inverossímil quanto falar apenas das mudanças substanciais apresentadas de um período a outro, sem apontar os elementos de continuidade.

Infelizmente, para efeito da campanha eleitoral, parece que tanto o bloco hegemonizado pelo PT e o atual governo, quanto o que se aglutina em torno do PSDB/DEM, como o PSOL e o PSTU parecem ir pelo mesmo caminho. Consideram, em seus discursos, apenas a continuidade ou a mudança da política econômica. Até o momento, apenas o PV não parece ter avançado nessa direção, em parte por não ter ainda formulação sobre a política macroeconômica, mas também por seu discurso, até agora, priorizar as contradições entre a aceleração do crescimento econômico e seus impactos ambientais e sociais, o que é uma discussão mais sobre estratégia de desenvolvimento e a qualidade do desenvolvimento.

O que candidatos(as) dizem

Feitas essas considerações, e tomando as declarações dos principais atores envolvidos no processo de disputa, tem-se um quadro razoável de dúvidas em relação aos discursos apresentados pelos(as) candidatos(as), e não necessariamente as suas práticas.

No que diz respeito à inflação, até pelo histórico recente de como esse tema pode pesar no processo eleitoral (vide 1994), nenhum dos atores se arrisca a sair do script, talvez com a honrosa exceção do PSOL que, já na eleição anterior, questionava o regime de metas de inflação. A candidatura Serra tende a colocar ênfase em reafirmar a paternidade do PSDB em relação ao plano de estabilização de 1994, o chamado “Plano Real”, embora esse tenha sido concebido e implementado, inicialmente, no governo Itamar. A candidatura Dilma tende a colocar ênfase na comparação entre as inflações registradas nos períodos FHC e Lula, que apontam para uma clara “vantagem” (inflação mais baixa) no período Lula. A candidatura Marina, pelo PV, não tem colocado ênfase no tema, mas tangenciado a ideia de continuidade da prioridade.

Em coro com as demandas da sociedade, todos falam na necessidade de redução das taxas de juros (flexibilização da política monetária), embora sem dizer como fazer isso, objetivamente (o presidente do PSDB se viu em “saia justa” recentemente ao ser colocado contra a parede por setores ligados ao mercado financeiro sobre sua posição a respeito de como compatibilizar uma política econômica que busque reduzir a taxa de juros e a questão da manutenção da autonomia do Banco Central e da política de metas de inflação). Nesse quesito, Dilma também fica em uma situação difícil, pois, representando o atual governo, não adianta apenas falar em baixar os juros. Como candidata de “situação” vai ter que explicar também porque isso não está sendo feito no atual governo.

Quando comparamos os discursos sobre a política fiscal, apresentam semelhanças e diferenças. Os candidatos Dilma e Serra falam em manter a política de superávits orçamentários (embora, no caso de Dilma, com a sua redução, como já vem operando o governo Lula em função do PAC) e, dessa forma, seguir pagando a dívida pública e reduzindo a proporção dívida/PIB – embora a candidatura Serra coloque mais ênfase na redução dos gastos correntes do governo. A candidatura de Marina não destoa. O PSOL, por outro lado, é tradicionalmente contrário à contração dos gastos correntes e investimentos públicos, e aposta na queda dos juros, o principal elemento a impactar as contas públicas, para abrir espaço maior para a ampliação dos gastos.

Em relação ao câmbio, o centro da discussão entre as candidaturas do PSDB, PT e PV é sobre a necessidade de evitar a apreciação continuada do real, e faze-lo retornar a um nível que volte a tornar competitivas as exportações brasileiras, e evite as tentações de ampliar as importações pelo barateamento dos produtos.

O candidato Serra, expressando as dificuldades da indústria paulista, tem sido enfático nisso, embora, de novo, não consiga explicar como evitar a valorização do real com o câmbio flutuante e a autonomia do Banco Central para elevar as taxas de juros e atrair recursos de fora do país, forçando a sua sobrevalorização.

Talvez os candidatos estejam tentando evitar a única medida que pode desvincular a taxa de câmbio e a taxa de juros: alguma forma de controle cambial e dos fluxos financeiros do exterior para o Brasil e vice-versa. Sem esse controle, as oscilações da taxa de câmbio são absolutamente perversas, tanto para cima quanto para baixo.

Essa questão se relaciona com a vulnerabilidade externa da economia brasileira. Esse tema é caro a muitos, mas especialmente ao PSOL, que tem sido um consistente crítico das fragilidades da economia brasileira no que diz respeito à liberalização financeira e aos fluxos (inclusive os relativos à dívidas), e que se encontra na raiz dessas fragilidades.

O jogo está em curso e, seguramente, as posições deverão se “refinar” ao longo do ano. Vale acompanhar e, especialmente, checar como as medidas que os candidatos estão propondo se desdobram em um projeto de futuro para o país.

[Publicado em 26/01/10 no portal do Ibase].

Por Adhemar S. Mineiro, que é economista, técnico do Dieese e do convênio Dieese/CUT/Rebrip.

ARTIGO COLHIDO NO SÍTIO www.adital.org.br.

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