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Por 20:54 Sem categoria

Aumento de juros não é remédio para déficit nas contas externas

Desequilíbrio provocado pelo aumento das importações e das remessas de lucros só pode ser resolvido com prioridade e estímulo às empresas nacionais

A nota do Banco Central (BC) sobre o último aumento da taxa dos juros básicos é perfeitamente ridícula: “… o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa Selic para 10,75% a.a., sem viés. Considerando o processo de redução de riscos para o cenário inflacionário (…) o Comitê entende que a decisão irá contribuir para intensificar esse processo”.

Dessa vez o aumento dos juros não foi porque exista uma real ou (como quase sempre) falsa ameaça inflacionária, mas porque a inflação está caindo…

O que se pode concluir de semelhante despautério é que o aumento de juros nada teve a ver com a inflação. Até pelos preconceitos dos mais alucinados tucanos e neoliberais que infestam a diretoria do BC, não havia motivo – pelo menos não motivo “inflacionário” – para aumentar os juros.

Então, por que os juros foram aumentados, quando nem os bancos (o que o BC chama de “mercado”) estão pedindo que eles sejam elevados?

Mais importante: por que os protestos no governo praticamente não existiram, apesar dessa medida – sem nem pretexto inflacionário – ser um golpe no crescimento?

A resposta é: as contas externas.

Nos últimos 12 meses, a conta de transações correntes – a conta de curto prazo de nossas relações financeiras com o exterior – acumulou um déficit de US$ 40,9 bilhões, o equivalente a 2,3% do PIB. A previsão do BC, reiterada no último dia 26, é que esse déficit atingirá, no final do ano, US$ 53 bilhões.

De janeiro a junho, o déficit foi de US$ 23,762 bilhões – o que é um aumento de 231% em relação ao mesmo período do ano passado, em que o déficit foi de US$ 7,177 bilhões (cf. Nota do BC, 26/07/2010, quadro XXV).

Notemos de passagem (porque isso nunca foi solução para o problema) que o ingresso de “investimentos diretos estrangeiros” (IDE) – que, segundo alguns, iria “financiar facilmente” (isto é, cobrir) o déficit em conta-corrente – só chegou, aproximadamente, à metade do déficit: US$ 12,058 bilhões em IDE contra US$ 23,762 bilhões (v. Nota do BC, quadros XIV e XXV).

O que significa que esse déficit foi coberto com dinheiro especulativo, o chamado “investimento estrangeiro em carteira” (IEC). Com efeito, de janeiro a junho entraram US$ 23,158 bilhões desse tipo de “investimento” – parasitário, estéril, rapinante e altamente volátil.

No mesmo período, as remessas líquidas (serviços+rendas) para o exterior, sobretudo de lucros – declarados ou disfarçados – atingiram US$ 33,248 bilhões, um aumento de 46,1% em relação a janeiro/junho do ano passado (v. Nota do BC, quadros V e VI).

E, apesar de termos exportado a enormidade de US$ 89,187 bilhões em seis meses – um espetacular aumento de 27,5% em relação ao mesmo período do ano passado -, o saldo comercial com o exterior foi de apenas US$ 7,878 bilhões. O problema, evidentemente, são as importações, que aumentaram 45,08% – de US$ 56 bilhões para US$ 81,3 bilhões, aumentando US$ 25,2 bilhões (cf. Nota do BC, quadro I).

O PROBLEMA

Este é o problema real. Tratá-lo com aumentos escalafobéticos de juros, isto é, com cacetadas sobre a economia para frear o crescimento, diminuindo assim as importações e as remessas, é tornar a situação, dentro de pouco tempo, insustentável.

Qual é o problema nas contas externas?

O problema é que, com a desnacionalização da economia, a partir do governo Fernando Henrique, basta crescermos um pouco que as importações – e as remessas de lucros – estouram as contas externas.

O recente relatório anual da UNCTAD aponta que no Brasil, até dezembro de 2009, o estoque de IDE (isto é, a propriedade estrangeira de empresas) ascendeu a US$ 400 bilhões e 808 milhões (World Investment Report 2010, UNCTAD, julho/2010, pág. 174, “FDI stock, by region and economy”).

Em suma, não há outra solução para esse problema, exceto nacionalizar a cadeia produtiva, isto é, ter uma política industrial de estímulo às empresas nacionais, que permita a elas aumentar seu espaço na economia, substituir importações por produção nacional, substituir remessas por investimento interno.

As contas externas não se equilibram pelo corte à produção via aumento de juros. Pelo contrário, seu equilíbrio exige que o país desenvolva sua produção própria – e não uma montagem de componentes importados, feita por filiais de empresas externas com a função de enviar lucros para a matriz.

Não é um acaso que nenhum país do mundo tenha se desenvolvido com base em empresas de outro país – sobretudo hoje, quando as multinacionais instalam filiais e compram empresas em outros países para que elas sejam importadoras de componentes da matriz.

Esse caráter importador, intrínseco hoje às filiais das multinacionais, aliás, é a essência de slogans ideológicos tais como “produção globalizada”, “comércio intracompanhia”, “produtos universais” (com partes fabricadas em vários países), “terceirização internacionalizada da produção”, etc., etc. & etc.

Quais foram as importações que dispararam, desde o último mês de 2009? Exatamente as de matérias-primas e bens intermediários – ou seja, insumos e componentes para a indústria. As filiais de multinacionais são montadoras, empresas que importam os componentes dos produtos, fazendo aqui a montagem, seja de carros, de celulares ou de dentifrícios – quando não importam o produto acabado.

Portanto, ter as multinacionais como principal setor da economia significa instalar o “stop-and-go”, o voo de galinha no crescimento do país, porque as importações e remessas irão limitar e, inclusive, demandar a redução do crescimento.

Obviamente, parece algo esquizofrênico estimular o crescimento e, em seguida, freá-lo com aumentos de juros porque as contas externas estão em perigo. O presidente Lula, em boa hora, lançou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Mas, com as multinacionais como setor principal, as contas externas sempre se tornam um problema agudo assim que o estímulo ao crescimento começa a acelerá-lo. Conter o crescimento através do aumento de juros é, precisamente, um programa de desaceleração do crescimento – o próprio anti-PAC.

Não há crescimento consistente – exceto por momentos muito limitados – sem uma política que dê prioridade, nos financiamentos e nas encomendas do Estado, às empresas nacionais, aquelas que investem aqui os seus lucros e não têm matrizes no exterior que as usam para descarregar aqui os seus componentes.

Deixaremos para outro artigo a análise da desindustrialização que o estreitamento da base econômica nacional está provocando no país. Basta dizer que setores industriais inteiros, como o de componentes eletrônicos, sofreram aquilo que o economista Julio Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, chamou de “desindustrialização absoluta”, além da “desindustrialização relativa”, que se expressa na queda de participação da indústria no valor agregado do conjunto da economia.

Diz esse economista: “O que custou ao Brasil essa relativa desindustrialização em comparação com a industrialização potencializada que outros países emergentes promoveram em suas economias? Custou crescimento econômico e, associado a isso, empregos. (…) A indústria brasileira tem capacidade de liderar e promover um maior crescimento econômico brasileiro? Se for evitado o empobrecimento de nosso processo de industrialização, a resposta é sim” (Julio Gomes de Almeida, “Crescimento depende de política clara para indústria”, Terra Magazine, 20/07/2010).

A decorrência é que, ou nós empreendemos a substituição das importações pela produção nacional, ou, além do freio ao crescimento, teremos a atrofia progressiva da própria indústria no país.

Por CARLOS LOPES.

NOTÍCIA COLHIDA NO SÍTIO www.horadopovo.com.br.

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