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Por 11:49 Notícias

DE MULHERES E DE GÊNERO

De Mulheres e de Gênero
Recriando a invisibilidade
Por Neide Aparecida Fonseca*
“Não se nasce mulher, mas se torna mulher”.
Também não se nasce homem, mas se torna homem.
INTRODUÇÃO
Antes de falar a respeito de como dar continuidade à forma de organizar a luta das mulheres na CUT, farei uma brevíssima introdução, sobre o Conceito de Relações de Gênero, de modo a dar sustentação ao que pretendo defender.
Uma das conquistas da luta feminista no mundo é o Conceito de Relações de Gênero, e que sem dúvida, trouxe grande contribuição para a explicação teórica sobre a opressão vivenciada pelas mulheres.
Esse conceito possibilita-nos afirmar o que dizia Simone de Beauvoir em 1949: “Não se nasce mulher, mas se torna mulher”, e ainda permite-nos acrescentar: não se nasce homem, mas se torna homem.
O conceito de Relações de Gênero explica a construção histórica e social, com bases ideológicas e materiais de papéis que homens e mulheres exercem, e que se expressam tanto na vida pública quanto na vida privada.
A construção desse conceito surge da necessidade dos movimentos sociais e da própria academia, visibilizar mais e com melhor qualidade o papel da mulher. Assim, não havia mais como continuar falando da identidade feminina, sem relacioná-la com o cotidiano, portanto, com a identidade masculina.
O termo “Gênero” é então utilizado para introduzir uma noção relacional no nosso vocabulário analítico. Neste sentido, as mulheres e os homens são definidos em termos recíprocos e não se pode compreender/ estudar um sem relacionar com o outro.
O conceito de Relações de Gênero tem uma história longa. A partir da década de 1970/80, este conceito passa a ser usado para designar a construção social da feminilidade e da masculinidade.
Entretanto, ao meu ver, é Joan Scott quem melhor desenvolve e conceitua. Scott, afirma que: “uma tal metodologia implica não somente uma nova história de mulheres, mas também uma nova história”.
Ou seja, ao entender o que é gênero e como se dão essas relações, não somente as mulheres começariam uma nova etapa, mas também os homens. Logo, entender esse conceito, permite-nos elaborar propostas de um mundo melhor.
Eis o conceito expresso por Scott: “gênero é um elemento constitutivo das relações sociais, baseados nas diferenças percebidas entre os sexos… o gênero é uma forma primária de dar significado às relações de poder ·”.
Era e ainda é uma luta contra o gueto, a busca por aliados e aliadas. Deste modo, compreender esse conceito, significou inaugurar um novo diálogo com a sociedade e a própria ciência.
ORGANIZAÇÃO DAS MULHERES NOS SINDICATOS E NA CUT
Não pretendo aqui fazer um relato histórico da atuação das mulheres nos sindicatos e na CUT, mesmo porque está é uma história do domínio de todas nos.
Entretanto, para sustentar minha defesa, se faz necessário também relembrar a luta de pelo menos três grandes categorias, que demonstram que apesar de toda mobilização e organização ainda muito há por fazer, e ainda as mulheres são discriminadas por serem mulheres.
1. Em 1924 foi eleita uma mulher para a diretoria do Clube Bancário, com o objetivo de organizar reuniões, festas familiares, bailes, excursões, etc. Dez anos depois, em 1934, vamos ver a Folha Bancária onde as mulheres pedem equiparação salarial e direito à maternidade. Entretanto, em 1935 há um refluxo da atuação feminina mais politizada no SEEB/SP, e elas voltam a participar de atividades como rainha da primavera, cursos de culinária, etc.
Em 1957 criou-se o Departamento Feminino, com a eleição de duas mulheres numa nova diretoria. Essas companheiras souberam relacionar as chamadas atividades femininas com a atuação mais política, ampliando a sindicalização .
Em 1963 aconteceu a I Conferência Nacional da Mulher Trabalhadora, as reivindicações eram então: jornada de seis horas, aposentadoria especial para mulher não inferior ao salário mínimo, salário família, creche e oportunidade para a mulher participar do Concurso do Banco do Brasil. Infelizmente em 1970 o Departamento Feminino foi desativado .
Em 1977, as bancárias do SEEB/SP pleitearam a inclusão de mulheres na lista de candidatos para a nova direção . E em 1981 já com mulheres na direção, organizam o I Encontro Estadual da Mulher Bancária: Creche no local de trabalho, discriminação da mulher nos bancos, salário e carreira, mulher casada e gestante, assédio masculino nos locais de trabalho, controle da natalidade x planejamento familiar e direitos da mulher, foram os temas debatidos.
Hoje a categoria possui uma Comissão organizada em nível nacional que faz a reflexão em torno dos temas: gênero, raça e orientação sexual, demandando políticas para a Secretaria de Políticas Sociais. Sendo que a maior conquista foi a Mesa Temática paritária (sindicalistas e patronal), visando debater e implementar campanhas de igualdade de oportunidades.
2. Em 1978 ocorreu o I Congresso da Mulher Metalúrgica, com a participação de 300 mulheres. Curioso lembrar que a mesa dos trabalhos era toda ela masculina. Duas mulheres foram demitidas por participarem deste evento. As bandeiras de luta eram: Salário igual para trabalho igual, acesso a cursos profissionalizantes e a cargos de chefia sem discriminação de sexo, iguais oportunidades de trabalho, contra o abuso de autoridade pela chefia, contra o controle do tempo para ir ao banheiro, pela criação de equipamentos públicos que permitissem a redução da jornada de trabalho, por creches e berçários nas fábricas, pelo direito a amamentação durante o período de trabalho, pela estabilidade e segurança para a mulher casada e gestante, por maior participação política e sindical, etc., etc..
3. Em 1978 também as químicas realizaram seu I Congresso. Condições de trabalho, salário igual, etc., ou seja, havia uma pauta semelhante à das metalúrgicas.
Por fim em 1986, no segundo CONCUT, nasce a CNQMT (Comissão Nacional da Questão da Mulher Trabalhadora, que mais tarde passou a ser CNMT (Comissão Nacional da Mulher Trabalhadora), que vem atuando regularmente propondo campanhas e atividades, e a cada dia amplia sua inserção internacional).
Tantos anos depois destes acontecimentos, com conquistas e derrotas, e com uma pauta de reivindicações que na sua maior parte resiste no tempo, aqui estamos nos a discutir como organizar as mulheres, como se disso dependesse esgotar todas as nossas reivindicações históricas. Será?
Então vamos lá: Comissão ou Secretária? O que ajudará mais a organizar? Conquistar direitos? E se for Secretária será de Relações de Gênero ou da Mulher?
Antes é preciso rapidamente falar sobre transversalidade, completando assim a argumentação.
TRANSVERSALIDADE
Transversalizar significa integrar aspectos (temas) que são isolados culturalmente, politicamente, socialmente, etc. com outros que estão em primeiro plano, de modo a dar visibilidade ampla a esses aspectos (temas).
Os temas transversais são aqueles que estão no cotidiano da sociedade (como gênero, raça, orientação sexual, etc.). São questões urgentes sobre a realidade que estão sendo construídas ou destruídas, demandando transformações macrossociais além de mudanças nas atitudes individuais.
O encontro entre reflexão sobre relações de gênero e a política necessária para enfrentar as dificuldades levantadas, tem de ter soluções interligadas. Transversalizar interna e externamente na construção de políticas públicas e/ou sindicais. Portanto, gênero como tema transversal deve permear toda nossa prática sindical.
DEFESA DA COMISSÂO
Entendo Gênero como categoria de análise explicativa para os diferentes lugares de poder que ocupam homens e mulheres, e que no nosso caso, enquanto sindicalistas, nos ajuda também a compreender e refletir como se dá a divisão sexual do trabalho, e ainda citando Eleonora Menicucci :
“O gênero é o sexo socialmente construído… Trata-se então do reconhecimento de uma dimensão da desigualdade social…”. Que afeta profundamente as mulheres, e que já há algum tempo, como pudemos constatar nos exemplos acima, vimos trabalhando em nossos sindicatos e em nossa Central. Também entendo a importância de transversalizar o tema das relações de gênero em todas as instâncias da CUT. Porque só assim, integrada no cotidiano das diversas secretárias, as políticas poderão ser implementadas interna e externamente.
Não ser um ingrediente isolado do bolo, mas sim, ser um ingrediente totalmente diluído na massa. Assim é que deve ser tratado esse tema das Relações de Gênero dentro da Central e dos Sindicatos. Possibilitando a geração de políticas públicas e/ou sindicais que dêem conta das demandas das mulheres. Isso não é guetizar, isso é ampliar!
MAS SE É PARA CONSTRUIR…
É visível que a cada dia cresce o desejo de se tentar novos caminhos. Nos últimos anos depois do debate sobre a implementação das Quotas dentro da CUT, o debate que mais vem “mexendo” com todas e todos tem sido o de como estruturar o trabalho das mulheres.
Embora não crendo que seja a estrutura por si só que faça avançar a luta, entendo que se for para unificar as(os) sindicalistas e beneficiar as milhares de trabalhadoras em seu local de trabalho, que seja então criada a Secretária.
Mas que seja Secretária da Mulher!
POR QUE SECRETÁRIA DA MULHER?
Para essa resposta tomarei emprestados trechos de um texto de Joan W. Scott , que passo a reproduzir abaixo:
“… Neste âmbito estão os estudos recentes do uso do Gênero, que acabaram virando sinônimo de Mulher: onde se lia antes Mulheres, agora se leia Gênero. Essa utilização acaba por dar uma conotação mais objetiva e neutra (não nos esqueçamos do significado de neutro no dicionário) do que as Mulheres. A tentativa acaba descartando a participação e experiência do movimento feminista, dissociando Ciência e Política. Não implica também uma tomada de posição sobre a assimetria de poder, nem designa a parte lesada. Inclui as Mulheres sem as nomear! Lembremo-nos do que colocamos anteriormente em relação ao que diz Lacan de que a mulher não existe, estando no campo do inominável, ou seja, fora da linguagem.
…’Gênero’ é sinônimo de ‘mulheres’. Durante os últimos anos, livros e artigos que tinham como tema a história das mulheres, substituíram em seus títulos o termo “mulheres” pelo termo “gênero”. Em alguns casos, este uso, ainda que se referindo vagamente a certos conceitos analíticos, trata realmente da aceitabilidade política desse campo de pesquisa. Nessas circunstâncias, o uso do termo ‘gênero’ visa indicar a erudição e a seriedade de um trabalho, pois ‘gênero’ tem uma conotação mais objetiva e neutra do que ‘mulheres’. O gênero parece integrar-se à terminologia científica das ciências sociais e, por conseqüência, dissociar-se da política (pretensamente escandalosa) do feminismo. Neste uso, o termo gênero não implica necessariamente na tomada de posição sobre a desigualdade ou o poder, nem mesmo designa a parte lesada (e até agora invisível). Enquanto o termo ‘história das mulheres’ revela sua posição política ao afirmar (contrariamente às práticas habituais) que as mulheres são sujeitos históricos válidos, o ‘gênero’ inclui as mulheres sem as nomear, e parece assim não se constituir em uma ameaça crítica.
…..Outras teorias explicam o Gênero para sugerir que as informações a respeito das mulheres são necessariamente informações sobre os homens, que um implica o estudo do outro. Esse uso insiste na idéia de que o mundo de mulheres faz parte do mundo dos homens, que ele é criado dentro e por esse mundo. Rejeitam-se assim as esferas separadas, as justificativas biológicas. O Gênero seria uma forma de indicar construções sociais. Assim, gênero seria, segundo esta definição, uma categoria social imposta sobre um corpo sexuado.
Usar Gênero assim pressupõe todo um sistema de relações que pode incluir o sexo, mas que não é diretamente determinado pelo sexo nem determina diretamente a sexualidade. Coloca-se aqui então o desafio de reconciliar a teoria com a história, que trata das experiências e estudos específicos. Como articular teoria, concebida em termos gerais e universais, com especificidade de condição feminina?
Aplicadas ao campo, as análises de gênero têm mostrado a subordinação e a subvalorização do trabalho das mulheres nas atividades produtivas e reprodutivas….. ”.
Concordo plenamente com Scott, pois vejo no meu dia a dia, mulheres e homens querendo falar sobre as Mulheres utilizando-se da palavra Gênero, sem refletir nas conseqüências profundas que isso acarreta, ou utilizando o argumento que é para agregar, mas pudemos perceber nestas poucas linhas “emprestadas” de Scott, que isso amplia a invisibilidade dos problemas causados pelas relações de gênero às mulheres.
É neste sentido que defendo o nome de Secretária da Mulher, pois é das Mulheres que estamos tratando, é para ela que estamos direcionando nossos esforços, nossa política. É para o papel que lhes impõe que queremos dar visibilidade e desconstruir.
Não somos gênero enquanto um conceito neutro como consta de alguns dicionários. Portanto, não devemos temer desagregar quando nos tornamos visíveis.
Não podemos confundir papel de comissão com papel de Secretária. Enquanto Comissão é um núcleo para reflexão e proposição, portanto, pode e deve utilizar-se do instrumento de análise das relações de gênero para propor políticas, atividades, etc., transversalizando-as em toda a estrutura da CUT e/ou sindicatos. Entretanto, Secretária será um espaço de fazer, de concretizar essa política debatida pela Comissão. Logo, não mais Secretária de Gênero, mas sim da Mulher.
“Existem razões independentes de nossa vontade que contribuem para atrasar a marcha da mulher à plena igualdade com o homem e no respeito às diferenças sexuais ”, entretanto, o que depender de nos, devemos fazer, mobilizando todas as nossas energias para não recriar a invisibilidade.
*Neide Aparecida Fonseca – Secretária de Políticas Sociais da CNB/CUT e Presidenta do INSPIR.
Fevereiro-2003

Por 11:49 Sem categoria

DE MULHERES E DE GÊNERO

De Mulheres e de Gênero
Recriando a invisibilidade
Por Neide Aparecida Fonseca*

“Não se nasce mulher, mas se torna mulher”.
Também não se nasce homem, mas se torna homem.

INTRODUÇÃO
Antes de falar a respeito de como dar continuidade à forma de organizar a luta das mulheres na CUT, farei uma brevíssima introdução, sobre o Conceito de Relações de Gênero, de modo a dar sustentação ao que pretendo defender.
Uma das conquistas da luta feminista no mundo é o Conceito de Relações de Gênero, e que sem dúvida, trouxe grande contribuição para a explicação teórica sobre a opressão vivenciada pelas mulheres.
Esse conceito possibilita-nos afirmar o que dizia Simone de Beauvoir em 1949: “Não se nasce mulher, mas se torna mulher”, e ainda permite-nos acrescentar: não se nasce homem, mas se torna homem.
O conceito de Relações de Gênero explica a construção histórica e social, com bases ideológicas e materiais de papéis que homens e mulheres exercem, e que se expressam tanto na vida pública quanto na vida privada.
A construção desse conceito surge da necessidade dos movimentos sociais e da própria academia, visibilizar mais e com melhor qualidade o papel da mulher. Assim, não havia mais como continuar falando da identidade feminina, sem relacioná-la com o cotidiano, portanto, com a identidade masculina.
O termo “Gênero” é então utilizado para introduzir uma noção relacional no nosso vocabulário analítico. Neste sentido, as mulheres e os homens são definidos em termos recíprocos e não se pode compreender/ estudar um sem relacionar com o outro.
O conceito de Relações de Gênero tem uma história longa. A partir da década de 1970/80, este conceito passa a ser usado para designar a construção social da feminilidade e da masculinidade.
Entretanto, ao meu ver, é Joan Scott quem melhor desenvolve e conceitua. Scott, afirma que: “uma tal metodologia implica não somente uma nova história de mulheres, mas também uma nova história”.
Ou seja, ao entender o que é gênero e como se dão essas relações, não somente as mulheres começariam uma nova etapa, mas também os homens. Logo, entender esse conceito, permite-nos elaborar propostas de um mundo melhor.
Eis o conceito expresso por Scott: “gênero é um elemento constitutivo das relações sociais, baseados nas diferenças percebidas entre os sexos… o gênero é uma forma primária de dar significado às relações de poder ·”.
Era e ainda é uma luta contra o gueto, a busca por aliados e aliadas. Deste modo, compreender esse conceito, significou inaugurar um novo diálogo com a sociedade e a própria ciência.
ORGANIZAÇÃO DAS MULHERES NOS SINDICATOS E NA CUT
Não pretendo aqui fazer um relato histórico da atuação das mulheres nos sindicatos e na CUT, mesmo porque está é uma história do domínio de todas nos.
Entretanto, para sustentar minha defesa, se faz necessário também relembrar a luta de pelo menos três grandes categorias, que demonstram que apesar de toda mobilização e organização ainda muito há por fazer, e ainda as mulheres são discriminadas por serem mulheres.
1. Em 1924 foi eleita uma mulher para a diretoria do Clube Bancário, com o objetivo de organizar reuniões, festas familiares, bailes, excursões, etc. Dez anos depois, em 1934, vamos ver a Folha Bancária onde as mulheres pedem equiparação salarial e direito à maternidade. Entretanto, em 1935 há um refluxo da atuação feminina mais politizada no SEEB/SP, e elas voltam a participar de atividades como rainha da primavera, cursos de culinária, etc.
Em 1957 criou-se o Departamento Feminino, com a eleição de duas mulheres numa nova diretoria. Essas companheiras souberam relacionar as chamadas atividades femininas com a atuação mais política, ampliando a sindicalização .
Em 1963 aconteceu a I Conferência Nacional da Mulher Trabalhadora, as reivindicações eram então: jornada de seis horas, aposentadoria especial para mulher não inferior ao salário mínimo, salário família, creche e oportunidade para a mulher participar do Concurso do Banco do Brasil. Infelizmente em 1970 o Departamento Feminino foi desativado .
Em 1977, as bancárias do SEEB/SP pleitearam a inclusão de mulheres na lista de candidatos para a nova direção . E em 1981 já com mulheres na direção, organizam o I Encontro Estadual da Mulher Bancária: Creche no local de trabalho, discriminação da mulher nos bancos, salário e carreira, mulher casada e gestante, assédio masculino nos locais de trabalho, controle da natalidade x planejamento familiar e direitos da mulher, foram os temas debatidos.
Hoje a categoria possui uma Comissão organizada em nível nacional que faz a reflexão em torno dos temas: gênero, raça e orientação sexual, demandando políticas para a Secretaria de Políticas Sociais. Sendo que a maior conquista foi a Mesa Temática paritária (sindicalistas e patronal), visando debater e implementar campanhas de igualdade de oportunidades.
2. Em 1978 ocorreu o I Congresso da Mulher Metalúrgica, com a participação de 300 mulheres. Curioso lembrar que a mesa dos trabalhos era toda ela masculina. Duas mulheres foram demitidas por participarem deste evento. As bandeiras de luta eram: Salário igual para trabalho igual, acesso a cursos profissionalizantes e a cargos de chefia sem discriminação de sexo, iguais oportunidades de trabalho, contra o abuso de autoridade pela chefia, contra o controle do tempo para ir ao banheiro, pela criação de equipamentos públicos que permitissem a redução da jornada de trabalho, por creches e berçários nas fábricas, pelo direito a amamentação durante o período de trabalho, pela estabilidade e segurança para a mulher casada e gestante, por maior participação política e sindical, etc., etc..
3. Em 1978 também as químicas realizaram seu I Congresso. Condições de trabalho, salário igual, etc., ou seja, havia uma pauta semelhante à das metalúrgicas.
Por fim em 1986, no segundo CONCUT, nasce a CNQMT (Comissão Nacional da Questão da Mulher Trabalhadora, que mais tarde passou a ser CNMT (Comissão Nacional da Mulher Trabalhadora), que vem atuando regularmente propondo campanhas e atividades, e a cada dia amplia sua inserção internacional).
Tantos anos depois destes acontecimentos, com conquistas e derrotas, e com uma pauta de reivindicações que na sua maior parte resiste no tempo, aqui estamos nos a discutir como organizar as mulheres, como se disso dependesse esgotar todas as nossas reivindicações históricas. Será?
Então vamos lá: Comissão ou Secretária? O que ajudará mais a organizar? Conquistar direitos? E se for Secretária será de Relações de Gênero ou da Mulher?
Antes é preciso rapidamente falar sobre transversalidade, completando assim a argumentação.

TRANSVERSALIDADE
Transversalizar significa integrar aspectos (temas) que são isolados culturalmente, politicamente, socialmente, etc. com outros que estão em primeiro plano, de modo a dar visibilidade ampla a esses aspectos (temas).
Os temas transversais são aqueles que estão no cotidiano da sociedade (como gênero, raça, orientação sexual, etc.). São questões urgentes sobre a realidade que estão sendo construídas ou destruídas, demandando transformações macrossociais além de mudanças nas atitudes individuais.
O encontro entre reflexão sobre relações de gênero e a política necessária para enfrentar as dificuldades levantadas, tem de ter soluções interligadas. Transversalizar interna e externamente na construção de políticas públicas e/ou sindicais. Portanto, gênero como tema transversal deve permear toda nossa prática sindical.
DEFESA DA COMISSÂO
Entendo Gênero como categoria de análise explicativa para os diferentes lugares de poder que ocupam homens e mulheres, e que no nosso caso, enquanto sindicalistas, nos ajuda também a compreender e refletir como se dá a divisão sexual do trabalho, e ainda citando Eleonora Menicucci :
“O gênero é o sexo socialmente construído… Trata-se então do reconhecimento de uma dimensão da desigualdade social…”. Que afeta profundamente as mulheres, e que já há algum tempo, como pudemos constatar nos exemplos acima, vimos trabalhando em nossos sindicatos e em nossa Central. Também entendo a importância de transversalizar o tema das relações de gênero em todas as instâncias da CUT. Porque só assim, integrada no cotidiano das diversas secretárias, as políticas poderão ser implementadas interna e externamente.
Não ser um ingrediente isolado do bolo, mas sim, ser um ingrediente totalmente diluído na massa. Assim é que deve ser tratado esse tema das Relações de Gênero dentro da Central e dos Sindicatos. Possibilitando a geração de políticas públicas e/ou sindicais que dêem conta das demandas das mulheres. Isso não é guetizar, isso é ampliar!
MAS SE É PARA CONSTRUIR…
É visível que a cada dia cresce o desejo de se tentar novos caminhos. Nos últimos anos depois do debate sobre a implementação das Quotas dentro da CUT, o debate que mais vem “mexendo” com todas e todos tem sido o de como estruturar o trabalho das mulheres.
Embora não crendo que seja a estrutura por si só que faça avançar a luta, entendo que se for para unificar as(os) sindicalistas e beneficiar as milhares de trabalhadoras em seu local de trabalho, que seja então criada a Secretária.
Mas que seja Secretária da Mulher!
POR QUE SECRETÁRIA DA MULHER?
Para essa resposta tomarei emprestados trechos de um texto de Joan W. Scott , que passo a reproduzir abaixo:
“… Neste âmbito estão os estudos recentes do uso do Gênero, que acabaram virando sinônimo de Mulher: onde se lia antes Mulheres, agora se leia Gênero. Essa utilização acaba por dar uma conotação mais objetiva e neutra (não nos esqueçamos do significado de neutro no dicionário) do que as Mulheres. A tentativa acaba descartando a participação e experiência do movimento feminista, dissociando Ciência e Política. Não implica também uma tomada de posição sobre a assimetria de poder, nem designa a parte lesada. Inclui as Mulheres sem as nomear! Lembremo-nos do que colocamos anteriormente em relação ao que diz Lacan de que a mulher não existe, estando no campo do inominável, ou seja, fora da linguagem.
…’Gênero’ é sinônimo de ‘mulheres’. Durante os últimos anos, livros e artigos que tinham como tema a história das mulheres, substituíram em seus títulos o termo “mulheres” pelo termo “gênero”. Em alguns casos, este uso, ainda que se referindo vagamente a certos conceitos analíticos, trata realmente da aceitabilidade política desse campo de pesquisa. Nessas circunstâncias, o uso do termo ‘gênero’ visa indicar a erudição e a seriedade de um trabalho, pois ‘gênero’ tem uma conotação mais objetiva e neutra do que ‘mulheres’. O gênero parece integrar-se à terminologia científica das ciências sociais e, por conseqüência, dissociar-se da política (pretensamente escandalosa) do feminismo. Neste uso, o termo gênero não implica necessariamente na tomada de posição sobre a desigualdade ou o poder, nem mesmo designa a parte lesada (e até agora invisível). Enquanto o termo ‘história das mulheres’ revela sua posição política ao afirmar (contrariamente às práticas habituais) que as mulheres são sujeitos históricos válidos, o ‘gênero’ inclui as mulheres sem as nomear, e parece assim não se constituir em uma ameaça crítica.
…..Outras teorias explicam o Gênero para sugerir que as informações a respeito das mulheres são necessariamente informações sobre os homens, que um implica o estudo do outro. Esse uso insiste na idéia de que o mundo de mulheres faz parte do mundo dos homens, que ele é criado dentro e por esse mundo. Rejeitam-se assim as esferas separadas, as justificativas biológicas. O Gênero seria uma forma de indicar construções sociais. Assim, gênero seria, segundo esta definição, uma categoria social imposta sobre um corpo sexuado.
Usar Gênero assim pressupõe todo um sistema de relações que pode incluir o sexo, mas que não é diretamente determinado pelo sexo nem determina diretamente a sexualidade. Coloca-se aqui então o desafio de reconciliar a teoria com a história, que trata das experiências e estudos específicos. Como articular teoria, concebida em termos gerais e universais, com especificidade de condição feminina?
Aplicadas ao campo, as análises de gênero têm mostrado a subordinação e a subvalorização do trabalho das mulheres nas atividades produtivas e reprodutivas….. ”.
Concordo plenamente com Scott, pois vejo no meu dia a dia, mulheres e homens querendo falar sobre as Mulheres utilizando-se da palavra Gênero, sem refletir nas conseqüências profundas que isso acarreta, ou utilizando o argumento que é para agregar, mas pudemos perceber nestas poucas linhas “emprestadas” de Scott, que isso amplia a invisibilidade dos problemas causados pelas relações de gênero às mulheres.
É neste sentido que defendo o nome de Secretária da Mulher, pois é das Mulheres que estamos tratando, é para ela que estamos direcionando nossos esforços, nossa política. É para o papel que lhes impõe que queremos dar visibilidade e desconstruir.
Não somos gênero enquanto um conceito neutro como consta de alguns dicionários. Portanto, não devemos temer desagregar quando nos tornamos visíveis.
Não podemos confundir papel de comissão com papel de Secretária. Enquanto Comissão é um núcleo para reflexão e proposição, portanto, pode e deve utilizar-se do instrumento de análise das relações de gênero para propor políticas, atividades, etc., transversalizando-as em toda a estrutura da CUT e/ou sindicatos. Entretanto, Secretária será um espaço de fazer, de concretizar essa política debatida pela Comissão. Logo, não mais Secretária de Gênero, mas sim da Mulher.
“Existem razões independentes de nossa vontade que contribuem para atrasar a marcha da mulher à plena igualdade com o homem e no respeito às diferenças sexuais ”, entretanto, o que depender de nos, devemos fazer, mobilizando todas as nossas energias para não recriar a invisibilidade.
*Neide Aparecida Fonseca – Secretária de Políticas Sociais da CNB/CUT e Presidenta do INSPIR.
Fevereiro-2003

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