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DIEESE quer agenda para melhorar salários e condições de trabalho

“Simultaneamente temos um País com uma legislação trabalhista relativamente extensa”

Foguinho

Clemente [em pé] responde perguntas da plateia durante palestra na sede do Sindicato dos Metalúrgicos, em Sorocaba, no último dia 14

Na flexibilização das leis trabalhistas é uma discussão atual que precisa ser acompanhada do fortalecimento da organização dos trabalhadores e dos sindicatos.

A criação de uma agenda para debater o trabalho “decente” que foi criado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) foi destaque nas comemorações dos 20 anos da Federação Estadual dos Metalúrgicos da Central Única dos Metalúrgicos (FEM/CUT). Realizado na sede do Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região (Smetal), o evento comemorativo à data trouxe a Sorocaba o diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Clemente Gans Lúcio.

Em entrevista exclusiva ao Cruzeiro do Sul, Lúcio explicou que a agenda é uma tentativa de criar uma referência de qualidade nas condições de trabalho, fato que envolve a dignidade no trabalho como elemento constitutivo de uma perspectiva de desenvolvimento.

Defensor de aulas de Direito Sindical e de Direito do Trabalhador para os alunos do Sistema S de Ensino – que engloba o Sesi e o Senai – Lúcio afirma que a participação ampla da classe trabalhadora na vida política é uma garantia de que as riquezas geradas pelo crescimento do Brasil nos próximos 20 anos não se acumule apenas nas mãos dos empresários. Confira a seguir os principais trechos da entrevista:

Cruzeiro do Sul – O que vem a ser uma agenda de trabalho decente?

Clemente Gans Lúcio – Agenda do trabalho decente é uma tentativa de dar uma referência de qualidade, no salário, de condições no trabalho, de dignidade no trabalho como elementos que constituem uma perspectiva de desenvolvimento. É uma agenda para o mundo dada pela OIT. O Brasil é o primeiro país no mundo que faz um debate nacional sobre essa agenda que procura criar uma referência básica para o trabalhador sobre o que é dignidade no trabalho em termos de condições de trabalho e salário. Nos próximos 20 anos temos a oportunidade ou não de fazer essa agenda avançar aqui no Brasil e isso é o papel que os metalúrgicos têm, em especial no Brasil que eles são uma das classes mais organizadas, mais avançadas nesse sentido.

CS – No Brasil temos trabalho escravo, infantil, conflitando com boas empresas empregadoras e nem sempre precisamos ir tão longe para encontrar esses conflitos. Como trabalhar isso no Brasil, um País tão grande com tantos cenários diferentes?

CGL – O primeiro desafio é trabalhar com essa diversidade. Nesse sentido é fundamental que, do ponto de vista sindical se tenha a clareza de que há essa adversidade, portanto não é um País único. Esse é um problema principalmente para nós que estamos aqui em São Paulo, pensar o Brasil a partir de São Paulo é não conhecer o Brasil. Por isso é importante que tenhamos uma perspectiva de atuação nacional pensando tanto a organização sindical nacional como a atuação sindical nacional e as medidas que tenham efeitos no conjunto do País. Por exemplo, a política do salário mínimo é nacional e muito importante, principalmente para aqueles que ganham menos. Ao mesmo tempo também é importante ter noção de que a estratégia sindical tem que olhar por territórios. Ou seja, temos que pensar o Brasil como um todo e, ao mesmo tempo, o território, o município, a região, o Estado… Portanto, há um leque de ações a ser desenvolvidas em todos os níveis para que possamos, em cada situação concreta, desenvolver um trabalho. Não significa que a pobreza, a desigualdade estão no Norte e Nordeste do País. Na região metropolitana de São Paulo temos trabalho semi-escravo que são os bolivianos que trabalham na produção de peças de roupas. Isso acontece na cidade de São Paulo. Então, não é um problema que está só lá longe, no interior do Nordeste. Está aqui também, do nosso lado. Portanto, essas ações contra a precarização do trabalho, das desigualdades têm que ser pensadas em todo o território nacional. Existem diferenças nas políticas mas é uma ação que precisa ser coordenada e articulada em todo o território nacional, mas todas têm em seu território desafios a serem vencidos.

Cruzeiro do Sul – Qual o papel do Dieese nessa discussão e nessa agenda?

Clemente – O Dieese é uma organização do movimento sindical. O movimento sindical se associa, organiza, mantém e financia o Dieese que é, portanto, um departamento de assessoria, de pesquisa e de formação do movimento metalúrgico sindical. O nosso papel é, ao mesmo tempo produzir conhecimento, produzir pesquisa, ajudar os dirigentes sindicais assessorando-os no trabalho, naquilo que eles precisam e fazer um trabalho de formação. Formação sindical, nos temas do movimento sindical atual. Então nós trabalhamos na assessoria, na pesquisa e na formação, visando dar ao movimento sindical instrumentos, conhecimento e capacidade para uma possível intervenção.

CS – Existe uma corrente muito forte de flexibilização das leis trabalhistas. Como ficam os trabalhadores e a organização desses trabalhadores nesse novo contexto?

Clemente – Simultaneamente temos um País com uma legislação trabalhista relativamente extensa e que protege muito o trabalhador individualmente, mas é muito frágil na representação coletiva. Nós temos um tipo de organização sindical que ainda carece de instrumentos que fortaleçam sua ação e representatividade. Isso em especial no local de trabalho pois nós não temos esse direito. Talvez esteja no momento de nós avançarmos por um processo onde nós aumentemos a capacidade da negociação coletiva e da regulação coletiva, dando ao sindicato a capacidade de estabelecer regras específicas em cada local, ampliando a capacidade de negociação e representação coletiva. Isso permitiria que, em alguns aspectos em que a legislação ainda não esteja adequada às mudanças que estão acontecendo no mundo, pudessem ser adequadas não mais uma vez por uma legislação, necessariamente uma lei, mas um aspecto que permitisse ao trabalhador, por meio do sindicato, negociar a situação concreta em que ele vive. As novas tecnologias, por exemplo, hoje, fazem com que o trabalhador exerça sua atividade inclusive fora do local de trabalho. Não existe regulação sobre isso, é uma situação totalmente nova. Há uma dinâmica hoje com a introdução das novas tecnologias que altera os postos de trabalho com uma dinâmica muito grande e a legislação não consegue acompanhar isso. Quando nós damos ao sindicato o poder de negociar e regular essa relação de trabalho, o risco é que a legislação também fique desatualizada para o trabalhador. Portanto, nós precisamos ter um instrumento que possa fazer essa lei através da convenção coletiva se adequar na situação concreta às mudanças que estão acontecendo. Os empresários reclamam por outros aspectos, dizendo que há um alto custo trabalhista, que a legislação trabalhista enrijece muito as relações de trabalho, o que não é necessariamente verdade. O Brasil, por exemplo, é um dos poucos países onde os empresários têm total liberdade para demitir o trabalhador. Temos uma legislação muito detalhista sobre alguns aspectos e que pouco privilegia a ação sindical e o direito de negociação. Talvez em algumas coisas, ajudasse tanto os trabalhadores como a empresa se eles pudessem negociar diretamente, permitindo com que a regulação fosse mais adequada até ao tipo de atividade econômica. É sempre bom lembrar que pouco mais da força de trabalho no Brasil, vive na informalidade, não tem carteira de trabalho assinada, não tem direitos trabalhistas e, portanto, já vive uma flexibilização total trabalhista que é a ausência total de direito. Nós precisamos estender o direito a esses trabalhadores que a carteira de trabalho não consegue proteger porque eles têm uma relação de trabalho muito curta, muito breve e nós precisamos imaginar, formular outros mecanismos para dar proteção a esse trabalhador.

CS – A flexibilização trabalhista sem a organização sindical ou dos trabalhadores, pode trazer aumento da precarização das relações de trabalho?

Sem dúvida. Se não houver, de fato, um avanço no direito de organização sindical e de negociação coletiva, seria uma irresponsabilidade nós pensarmos em flexibilizar a legislação. Flexibilizar em que sentido? Dar o direito de uma determinada regra poder ser revista. Por exemplo, a legislação hoje permite que um almoço tenha o intervalo de uma hora. Algumas categorias já negociaram o intervalo, diminuindo 10 minutos, 15 minutos por dia para não trabalhar aos sábados. Muitos trabalhadores preferem isso, trabalhar 10, 15 minutos a mais, ter um tempo menor de almoço mas não trabalhar aos sábados. A legislação não permite isso, mas se a empresa quer, o trabalhador quer e poderia ser algo que, como hipótese a relação poderia se adequar mas a legislação não permite. Se você tem um sindicato forte que negocia isso em uma condição adequada, por que o trabalhador não pode fazer um novo tipo de regra que lhe é favorável e também pode ser favorável para a empresa? Mas para isso, precisa ter sindicato forte e precisa também de ter regras, não pode flexibilizar tudo.

CS – O que, por exemplo, não poderia ser flexibilizado?

Não dá para flexibilizar salários, não dá para flexibilizar férias… tem coisa que não vamos aceitar flexibilizar. Mas tem coisas também, cuja a regra talvez fosse mais adequado tanto para empresas como para trabalhadores, flexibilizar.

Fonte: Cruzeiro do Sul

NOTÍCIA COLHIDA NO SÍITO http://www.cnmcut.org.br/verCont.asp?id=30586

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